Uma aventura polémica no Restelo

A polémica está instalada no Restelo. Moradores e escolas vizinhas arrolam argumentos e desmultiplicam-se em iniciativas contra o projectado Parque Aventura. Os promotores, por seu turno, saíram do silêncio: dão hoje uma conferência de imprensa em defesa do seu projecto e já anunciaram o próximo dia 12 de Março como data de abertura do novo espaço de diversão.

A prevista criação, no espaço do antigo Aquaparque do Restelo, de um parque temático e de diversões está a provocar uma viva contestação na freguesia de São Francisco Xavier. No argumentário dos opositores do projecto avulta a certeza de que o empreendimento trará ruído, insegurança e um trânsito ainda mais caótico. Ao contrário, os investidores garantem que o Parque Aventura será mais silencioso que o Aquaparque e contribuirá para resolver os problemas de segurança, circulação e estacionamento."As consequências [da criação do parque] a nível de poluição sonora e ambiental, de congestionamento e de degradação do desejável modelo de desenvolvimento urbanístico, são consideradas como altamente indesejáveis", afirmam os adversários do projecto, num abaixo-assinado posto a circular ainda no mês passado. Apelando ao presidente da Câmara de Lisboa para que "impeça a aprovação" do projecto ainda em análise nos serviços camarários, os signatários do documento recordam que ele "deverá localizar-se no centro de uma área que conta com quatro escolas (secundária do Restelo, Colégio de São José, Escola Primária de Caselas e Centro Helen Keller), junto a um hospital com funções de nível elevado na Área Metropolitana de Lisboa e no meio da freguesia de São Francisco Xavier, entre os bairros do Restelo e de Caselas".Para lá deste abaixo-assinado, os elementos da Pró-Associação de Moradores e Amigos da Freguesia de S. Francisco Xavier lançaram na semana passada um boletim informativo intitulado "Aqui Não". O folheto sintetiza as críticas dos moradores e divulga as posições das Irmãs Dominicanas, responsáveis pelo Colégio de São José, do Centro Helen Keller e da Fundação Nossa Senhora do Bom Sucesso - todas elas contrárias à instalação do parque.No rol das razões invocadas é destacado o facto de o futuro parque estar previsto para uma zona do Parque Florestal de Monsanto "que não tem qualquer vocação para parque de diversões" e não está preparada para enchentes, designadamente ao nível do estacionamento e dos acessos. "Alguém duvida do inevitável acréscimo de ruído e de poluição, da indesejável presença de arrumadores e pequena criminalidade, do acréscimo de atropelamentos de crianças e jovens na Avenida das Descobertas?", perguntam os responsáveis da Pró-Associação, insurgindo-se também contra o facto de um terreno público, "passível de múltiplas utilizações com interesse geral", ser "entregue à gestão, lucrativa de uma sociedade comercial, pagando esta à câmara uma prestação mensal escandalosamente baixa - inferior a 400 contos".Com efeito, a escritura pública de constituição do direito de superfície, celebrada a 16 de Junho do ano passado, entre a Câmara de Lisboa e a sociedade Aventura em Lisboa - Parque Temático de Diversões, Ldª, estabelece o pagamento mensal de 374 contos, como contrapartida única da cedência, durante 50 anos, dos 8,2 hectares do antigo Aquaparque. O eventual alargamento da área cedida para um máximo de 18 hectares, nos termos da mesma escritura e da deliberação camarária de 1997 que aprovou, por unanimidade, todo o negócio, ficará condicionado à apresentação de projectos específicos e à sua prévia aprovação pela câmara.Postos perante a evidência de que vão pagar por 8,2 hectares um valor mensal inferior ao da renda de uma qualquer loja de vão-de-escada, os responsáveis da Aventura em Lisboa, Ldª, contrapõem aquilo que dizem ser a prática corrente, em qualquer parte da Europa, das relações entre os municípios e os promotores deste género de actividades. "Esta é a primeira câmara que eu conheço que exige que lhe paguem seja o que for para ter um parque temático", afirma Alexandre Oliveira, administrador da empresa e do grupo Dislaparque, herdeiro da Sociedade Lusitana de Diversões, uma empresa familiar que trabalha há 50 anos no mundo das feiras e diversões.De acordo com o empresário, a câmara de Barcelona, por exemplo, "além de ceder o espaço e financiar a realização do Port Aventura, custeou todas as infra-estruturas necessárias". Nesta perspectiva, "um parque deste tipo, que neste caso criará 200 postos de trabalho, 200 dias por ano, é uma mais-valia para qualquer cidade". E tanto assim é, acrescenta Alexandre Oliveira, que o seu projecto foi classificado pela Direcção-Geral de Turismo como de "excepcional interesse turístico".Quanto ao mais, reconhece que a estratégia de comunicação da sociedade não foi a mais acertada e diz que surgiu uma quantidade de mal-entendidos e de ideias erradas sobre o projecto. A começar por aquilo a que chama "confusão" entre parque temático e feira popular e a acabar na questão do ruído, há uma grande diferença, afirma, entre o que dizem os moradores e aquilo que são as intenções da empresa. "A Feira Popular vive de atracções e de restaurantes, o parque temático vive fundamentalmente da cenografia." E num parque como o Aventura em Lisboa, "60 por cento da cenografia é composta por árvores". Daí que o administrador jure a pés juntos que "não será cortada uma única árvore" e que o ruído provocado "será sempre inferior ao do antigo Aquaparque". Isto porque "o recinto não terá som ambiente e não haverá altifalantes a chamar as pessoas para as atracções - até porque os 2000 a 2500 escudos que os visitantes vão pagar dão direito a entrar em todo o lado".Alexandre Oliveira nega igualmente que o parque venha a ter carrosséis, montanhas-russas ou quaisquer divertimentos exteriores desse tipo. Haverá alguns veículos, mas isso sucederá em "pavilhões pré-fabricados e insonorizados" que terão exposições, espectáculos e divertimentos e que representarão, depois de cenografados, as diferentes áreas temáticas que evocam os descobrimentos portugueses: Grande Império da China, Amazónia, Arábia, Reino do Faz de Conta, Mundo Lusíada, Bosque Encantado e Mundo do Futuro. "O nosso objectivo é que o ruído provocado aqui dentro não incomode o Colégio de São José. Quanto ao Bairro de Caselas, não me preocupo muito, porque estamos separados por um morro e uma cortina vegetal. Além disso, a única coisa que terá som no exterior é um monocarril com gôndolas/passarolas, que disporão de som ambiente restrito ao espaço do próprio veículo", sustenta Alexandre Oliveira. Garantindo que não quer criar "má vizinhança nem atemorizar ninguém", o empresário diz que pediu um estudo ao professor Bento Coelho, "que é quem sabe mais de impactos sonoros em Portugal", e que é ele quem vai determinar até que níveis é que se pode ir sem incomodar ninguém.Reagindo às críticas dos moradores em matéria de estacionamento e de acessos, a Aventura em Lisboa adianta que já encomendou um estudo à empresa Bragaparques sobre a necessidade e viabilidade de construir uma parque de estacionamento para lá dos 500 lugares já existentes. Com base neste estudo, que poderá conduzir à criação de um parque subterrâneo ou de superfície, nas imediações e com ligações asseguradas por autocarro em sistema de "navette", a empresa estudará com a câmara a maneira de minimizar o problema dos acessos. "Estamos em contacto com o vereador Machado Rodrigues para encontrar soluções que não agudizem as dificuldades já existentes na zona." Nas previsões citadas pela empresa, que conta investir nesta fase um total de 2,5 milhões de contos, a frequência média do parque será de 1600 pessoas por dia, com um limite máximo ainda não definido, mas que será rígido por razões de segurança. Ao todo, o espaço estará aberto 200 dias por ano, com um horário quotidiano das 10h00 às 22h00. O licenciamento final das obras de instalação dos módulos e de adaptação das construções existentes deverá ser concedido nas próximas semanas, segundo o vereador Rui Godinho, responsável pelos espaços verdes na Câmara de Lisboa. Relativamente ao eventual alargamento do parque para os 18 hectares referidos na escritura, Alexandre Oliveira admite que há uma vaga ideia de ali criar um espaço denominado Planeta Azul, que "seria uma coisa de índole educativa e ambiental, a meio caminho entre a quinta pedagógica e o jardim zoológico". A concretização desta ideia, caso a empresa a propusesse e a câmara a aprovasse, ficaria sempre, afirma o administrador, reservada para uma fase posterior e dependente do sucesso da primeira. Para já, a abertura das portas está programada para 12 de Março de 2000.

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