Um código de ética ou um código de silêncio

Há situações de falhas em que a “imagem” deveria ser a menor das preocupações do ministério.

O mal-estar com os médicos já tinha começado na semana passada, quando o Ministério da Saúde propôs que os funcionários do Serviço Nacional de Saúde (SNS) entregassem todas as ofertas que recebessem à secretaria-geral do ministério, sendo que essas ofertas seriam depois doadas a instituições de solidariedade. Apesar de contestada pelos médicos, esta é a parte menos polémica do projecto para a criação de um “código de ética” para os funcionários do SNS. A parte polémica é que o tal projecto de código impõe uma espécie de “lei da rolha” aos profissionais de saúde.

O pomo da discórdia estipula que os funcionários do SNS “devem abster-se de emitir declarações públicas, por sua iniciativa ou mediante solicitação de terceiros, nomeadamente quando possam pôr em causa a imagem [do serviço ou organismo], em especial fazendo uso dos meios de comunicação social”. Como escrevia ontem José Vítor Malheiros, o “nomeadamente” está lá para vincar que isso é proibido, mas o resto também.

É um projecto de despacho que não deveria passar disso mesmo, de um projecto. Faz pouco ou nenhum sentido que um profissional seja impedido de denunciar uma situação que lhe pareça irregular ou menos correcta só para não pôr em causa a “imagem” do serviço em causa. Aliás, há situações de falhas nos serviços em que a “imagem” deveria ser a menor das preocupações do Ministério da Saúde.

A Ordem dos Médicos responde à letra. Diz que vai convocar conferências de imprensa diárias para denunciar “tudo o que corre mal no SNS” e que lhe seja comunicado pelos funcionários do SNS. É uma resposta à altura. Já insinuar que se vai para a greve, romper com a tutela ou protestar pedindo aos médicos que voltem a passar receitas à mão é algo descabido.
 

  



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