Programa de retorno voluntário de imigrantes bloqueado por falta de verba

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O Programa de Apoio ao Retorno Voluntário prevê, para além do pagamento da passagem aérea, um subsídio de reintegração e apoio paraformação profissional Adriano Miranda/PÚBLICO

A Organização Internacional para as Migrações (OIM) deixou de apoiar os imigrantes que querem regressar aos seus países de origem. De acordo com várias entidades ouvidas pelo PÚBLICO, desde o início do ano que as candidaturas ao chamado Programa de Apoio ao Retorno Voluntário, co-financiado pelo Governo, estão a ser negadas pela OIM, gerando algumas "situações dramáticas" entre imigrantes desempregados ou doentes que pretendem retornar aos seus países de origem mas que não conseguem fazê-lo pelos seus próprios meios.

Este bloqueio surge numa altura em que se intensifica o movimento de saída do país de muitos cidadãos estrangeiros vindos da Europa de Leste afectados pela crise económica. Algumas organizações ligadas aos imigrantes - como o Serviço Jesuíta aos Refugiados e a Solidariedade Imigrante - já fizeram mesmo soar o alarme, alertando para o facto de, associado ao desemprego, se verificar um aumento do número de casos de alcoolismo, mendicidade e sem-abrigo.

O problema com o financiamento do Programa de Apoio ao Retorno Voluntário deriva do facto de o Ministério da Administração Interna ter deixado de financiar a OIM, no âmbito de um protocolo assinado entre ambas as partes. O secretário de Estado da Administração Interna, Nuno Magalhães, confirma isso mesmo, acrescentando que "o atraso" se deve a "problemas burocráticos", relacionados, por exemplo, com a "falta de apresentação de documentos" e de "justificação de despesas" por parte da OIM. "De qualquer forma, temo-nos mantido em contacto e essa situação será desbloqueada a curto prazo", desdramatiza o mesmo responsável.

O PÚBLICO tentou, desde terça-feira, ter um esclarecimento sobre o assunto junto do chefe da missão da OIM em Portugal, mas não recebeu qualquer resposta.

O Programa de Apoio ao Retorno Voluntário foi acordado, em 1997, entre o Governo português e a OIM, com o objectivo de auxiliar imigrantes - nomeadamente aqueles que se encontrarem ilegais - ou refugiados sem recursos a voltar, de forma "digna e humana", aos seus países ou a estados terceiros dispostos a acolhê-los. Entre os benefícios concedidos contam-se, para além do pagamento da passagem aérea, um subsídio de reintegração e um apoio para a formação profissional.

Nos últimos cinco anos, a OIM recebeu mais de 1800 candidaturas, com cerca de 1000 pessoas a ser efectivamente apoiadas pelo programa, segundo dados da própria organização. Nos últimos três anos, as principais comunidades a requerer ajuda foram sempre as mesmas: Ucrânia, Rússia e Brasil, três dos países que contam com mais imigrantes em condição irregular no país.

Crise económica atinge estrangeiros

É difícil saber quantos já decidiram deixar Portugal, mas parece clara a tendência para, depois da grande explosão nas entradas verificadas com o período extraordinário de legalização ocorrido em 2001, o balão começar a esvaziar.

Mihai Varzan, da Associação Cultural dos Romenos Mircea Eliade, diz que "a falta de trabalho, nomeadamente no sector da construção civil", é a causa do fenómeno. O mesmo refere Fernando Monteiro, cônsul da Moldávia em Lisboa, aduzindo que, embora o movimento se registe desde Novembro de 2002, nos últimos dois meses a migração intensificou-se.

Henrique Graça, presidente do Sindicato da Construção Civil da CGTP da região do Algarve - uma das regiões do país com mais imigrantes de Leste - explica ainda que, para além do desemprego, há quem tenha deixado de receber salário. "Centenas de trabalhadores contactaram-nos porque os patrões não lhes pagavam ou porque não se conseguiam legalizar. Dois meses depois, fomos à procura deles e já não encontrámos boa parte", afirmou. O sindicalista relata ainda que, tal como acontece em Lisboa, "começam a ver-se casos de pobreza e de mendicidade entre os cidadãos de Leste, também no Algarve".

José Diniz, coordenador da Federação de Sindicatos da Construção Civil, por sua vez, corrobora esta preocupação mas frisa que "muitos dos que estão a sair do país vão, mas voltam", uma vez que têm visto de trabalho e, por isso, podem ir visitar a família; ou então deslocam-se para outras paragens, dentro do espaço Schengen, onde a situação económica é neste momento mais favorável.

Timóteo Macedo, da Solidariedade Imigrante, repete a tese. "Muitos vão para trabalhos sazonais, nomeadamente para a agricultura, na Andaluzia, em Espanha, ou para França e para Itália". Outros, contudo, com menos meios e ousadia, deixam-se arrastar pela miséria. "Basta fazer uma pesquisa nos centros de abrigo de Lisboa. Estão cheios de imigrantes de Leste", salienta.

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