Bispos católicos em "total desacordo" com legalização de barrigas de aluguer

"Só o desespero de mulheres gravemente carenciadas as leva a aceitar tão traumatizante prática", diz a hierarquia da igreja

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A técnica de FIV que passa agora a ser oferecida no Reino Unido envolve material genético de uma terceira pessoa Paulo Pimenta

Os bispos católicos portugueses manifestam "total desacordo" em relação à legalização da maternidade de substituição, conhecida como "barriga de aluguer".

"Estando em apreciação na Assembleia da República uma proposta de alteração legislativa no sentido da legalização, em determinadas condições, da maternidade de substituição, os bispos não podem deixar de manifestar o seu total desacordo a essa proposta", refere um comunicado da assembleia plenária da Conferência Episcopal Portuguesa, que terminou esta quinta-feira em Fátima.

Lido pelo porta-voz da Conferência Episcopal, o padre Manuel Morujão, que cessa funções em Junho, o comunicado refere que "a natural aspiração à maternidade e paternidade não pode traduzir-se num pretenso direito ao filho, como se este pudesse ser reduzido a instrumento".

"A criança nascida de uma mãe contratualmente obrigada a abandoná-la não pode deixar de sofrer com o trauma desse abandono, conhecidos que são, cada vez mais, os laços que se criam entre mãe e filho durante a gestação", refere o comunicado.  Para os bispos, "a mãe gestante não pode, também ela, ser instrumentalizada e reduzida a uma incubadora, como se a gravidez não envolvesse profundamente todas as dimensões da sua pessoa e a obrigação de abandono do seu filho não contrariasse o mais forte, natural e espontâneo dos deveres de cuidado".

"A experiência revela que só o desespero de mulheres gravemente carenciadas as leva a aceitar tão traumatizante prática, sendo ilusório pensar que o fazem de bom grado ou gratuitamente", acrescenta o documento.

Anunciada para esta semana, a votação da proposta para legalizar as chamadas barrigas de aluguer foi adiada. O presidente do grupo de trabalho criado para discutir a matéria, o deputado do PSD Miguel Santos, disse que os partidos decidiram esclarecer mais algumas dúvidas e pedir um estudo de direito comparado entre vários países.

Os projectos-lei do PS e PSD foram aprovados no início de 2012 e aguardam, desde então, um texto final resultante da discussão na especialidade. O documento final, que resulta dos dois projectos, deveria ter sido votado na comissão parlamentar de Saúde na terça-feira.

O presidente da Conferência Episcopal, Manuel Clemente tem esperança “de que as pessoas ponderem bem o que está em causa" e não decidam "levianamente".

"Não se trata de qualquer coisa acessória, que uma mulher possa fazer ou não no sentido de dar uma ajuda a um casal infértil, mas de qualquer coisa que a envolve intimamente", declarou o patriarca de Lisboa, sublinhando que "a relação uterina entre aquela que gera e aquele que está a ser gerado é muito forte, não é coisa de tirar e pôr".

A Conferência Episcopal deixou ainda aos fiéis algumas indicações de voto para as eleições europeias do próximo dia 24. Recordando-lhes o direito e o dever moral de votarem, os bispos dizem que a ocasião deve servir para construir "uma Europa mais aberta e inclusiva, que privilegie os mais pobres e marginalizados, que promova o diálogo intercultural e defenda a liberdade religiosa". A hierarquia católica portuguesa defende uma União Europeia "em que a economia e as finanças não se arvorem em governo autocrático, mas sirvam a pessoa humana e o bem comum".

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