Ontem, hoje e amanhã

Apesar do tempo, apesar do mundo, apesar da crise, os resultados da última sondagem continuam, no essencial, a ser os resultados das legislativas de 1976: 38 por cento para o PS e 27 por cento para o PSD. O que mudou, mudou à esquerda e à direita deste inamovível bloco. O CDS foi encolhendo à medida que a ditadura e o PREC se esqueceram. Como o PC. O resto não conta: é uma variação inconsequente, que vai do romantismo do Bloco a Marinho e Pinto e ao Partido Livre. Nenhum deles conta e o voto que putativamente receberão podia muito bem ir para outro sítio qualquer. Também Cavaco é visto pela opinião do “comentariado” como a reincarnação de Salazar, quando de facto se parece com Caetano. Quando se mete uma ideia na cabeça dos portugueses quase nunca sai.

Os portugueses acham que o PS está do lado dos “pequenos” e o PSD do lado dos “grandes” e, em quarenta anos, nada perturbou esta confortável convicção: nem o triste consulado de Cavaco, nem Guterres, nem Sócrates. Quando havia dinheiro, Cavaco ganhava, porque o bom povo gosta de sossego e de se dar bem com os “ricos”. Quando não havia ou havia pouco, era do PS que se esperava um emprego no Estado, um subsídio ou um negócio a precisar de “facilitação” (de uma parceria, por exemplo, ou de um decreto). Adelino Amaro da Costa costumava melancolicamente lamentar o “esquerdismo” do indigenato. Só não se lembrava que esse “esquerdismo” ia de Ricardo Salgado ao último escrevente das Finanças. Hoje, mesmo sabendo isso, o país não quer abandonar o seu conforto mental.

A “extrema” direita (coitado do ordeiro CDS) e a “extrema” esquerda são, para ele, uma aventura e uma promessa de desacato. O Syriza e o Podemos! não têm futuro em Portugal. Ronaldo e José Mourinho satisfazem o apetite de glória da nação. E o império é agora a TAP e a RTP, embora por toda a parte as companhias de bandeira e os canais “em aberto” estejam a morrer por obsolescência técnica e penúria económica. A salvação de que por aí se fala é para o cidadão ou a cidadã normal, como compete a uma sociedade pobre - a segurança e não uma incursão no desconhecido. Por aqui, a modernidade, para não ofender os destinatários, precisa de ser inócua e superficial: o telemóvel, a internet, coisas que não perturbem o deserto intelectual e, claro, emocional em que a Pátria se habituou a viver. 

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