Crónica de um sequestro anunciado

Paulo Portas tem obrigação de saber que um partido político não pode servir para plebiscitar visões do “querido líder”.

A coligação governativa com o PSD já estava anunciada formalmente nos jornais e nas televisões e os órgãos próprios ainda não haviam sido convocados.

Pela enésima vez, em vez de ouvir previamente o partido, Paulo Portas decidiu sozinho. Viu nas estrelas um caminho que agora vai plebiscitar ao Caldas.

É a interpretação portista do funcionamento de um partido (à direita): uma pura correia de transmissão ao serviço da visão carismática do dirigente de serviço. Uma filosofia e uma prática políticas agudamente divergentes da norma democrática representativa. Um caudilhismo que historicamente tem aderentes tão nomeados como Justo José de Urquiza na Argentina, Fulgencio Batista em Cuba, Anastasio Somoza Garcia na Nicarágua ou um Getúlio Vargas no “nosso” Brasil.

Mas Paulo Portas tem obrigação de saber que um partido político não pode servir para plebiscitar visões do “querido líder”, mas para integrar vontades livres e mobilizar ideias e debates com um único objectivo: servir o país. Porque, até agora, a coligação governativa anunciada só serve o partido, com as suas dificuldades.

Ainda não foram discutidos, nem aprofundados as estratégias, os programas e os compromissos políticos que podem justificar a coligação para a próxima legislatura e que estão por inteiro em branco (a pouco mais de seis meses das eleições).

Esta liderança política autocrática em 2015 é uma inversão de papéis e, a funcionar assim, Portas presta um mau serviço à democracia, ao CDS e ao país.

Como reclamava com razão há 40 anos, em Novembro de 1975, o almirante Pinheiro de Azevedo: “Fui sequestrado, já duas vezes, já chega. Não gosto de ser sequestrado, é uma coisa que me chateia.”

Advogado, conselheiro nacional do CDS

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