Caos construído, vezes dois

A Rússia não precisa disto. É um grande país, com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Tem enormes riquezas, que lhe garantem uma preponderância nas relações com o resto da Europa e da Ásia. Com facilidade, a Rússia poderia ter obtido o envio de capacetes azuis para proteger as comunidades de russos ou falantes de russo na Ucrânia. Poderia ter admitido uma Ucrânia que fizesse parte da união aduaneira proposta pela Rússia e tivesse um acordo de associação com a União Europeia, em vez de ser obrigada a escolher. E exercendo a sua influência política, poderia ter conseguido mais autonomia para as regiões do Leste e do Sul da Ucrânia.

É Putin que precisa do caos construído na Ucrânia. Não pode correr o risco de uma mudança bem-sucedida de poder naquele país, não vão os russos ganhar ideias. Depois de assustar o mundo com os neonazis que supostamente mandavam em Kiev, deixou cair o tema quando o "Setor Direito" teve 1,7% nas eleições e o seu candidato à presidência menos de um por cento. Putin e os seus aliados dentro e fora do kremlin prosseguiram na sua estratégia de desestabilizar a Ucrânia para depois poder intervir. Infiltraram tropas, mobilizaram mercenários, entregaram armamento cada vez mais pesado aos separatistas. E esse caos construído acabou por resultar na obliteração de um avião civil com quase trezentos inocentes a bordo.

Mesmo assim, a União Europeia continua a não mostrar a firmeza necessária para com Putin. E não seria assim tão difícil: bastou a proposta polaca de que a UE passasse a negociar os preços do gás em conjunto para que disparassem os alarmes em Moscovo. O que faria se avançássemos para uma verdadeira União energética que ajudasse a UE a diminuir a sua dependência de combustíveis fósseis? Os bandos armados de mísseis na Ucrânia hão-de parar quando Putin lhes disser: "acabou o jogo". E ele parará quando nós, a uma só voz, lhe dissermos o mesmo.


Israel tem de parar imediatamente com o que está a fazer. O ataque a Gaza é desproporcionado, criminoso e prossegue objetivos estratégicos que superam em muito a segurança de Israel. É por demais evidente que a intenção é impossibilitar a criação de um estado palestiniano e retomar território, enquanto é tempo. Alguns apoiantes da maioria no governo em Tel Aviv dizem já que o melhor seria que os palestinianos de Gaza fossem para o deserto do Sinai, e que a faixa fosse de novo colonizada.

É Netanyahu quem precisa deste caos construído .E esta estratégia vai falhar. O único efeito que ela terá é o de prolongar o ódio e a instabilidade na região. Netanyahu sabe que o tempo está a acabar. O mundo árabe está por um fio. Mas tira a lição errada dessa realidade. Em vez de querer "acabar o serviço" da construção da Grande Israel, deveria quanto antes fazer a paz com os palestinianos e aceitar a solução dos dois estados. 

Também aqui a União Europeia poderia contribuir decisivamente, oferecendo a associação ou mesmo adesão aos dois estados em troca da paz duradoura, em segurança para ambos. E declarando um prazo para o reconhecimento do estado da Palestina pela União se não houver acordo. Se Netanyahu não entender que o tempo da guerra acabou, haverá em Israel que entenda.

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