O que falta? “A esquerda ser de esquerda…”

Numa arruada no centro de Lagos, Jerónimo de Sousa foi interpelado sobre a disponibilidade para se aliar ao PS. E recusou lugares no poder em troca de pôr o compromisso com o povo “à borda do prato”.

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Nuno Ferreira Santos

A questão vai-se colocando no caminho de Jerónimo a cada arruada. A esquerda está dividida – por que não se entendem CDU e PS? O líder responde que falta “a esquerda ser de esquerda” e sem isso não está disposto a pôr o povo “à borda do prato”.

A meio da arruada no centro de Lagos, um homem à porta de uma loja provoca a comitiva. “A esquerda vai ter mais votos mas não vai governar. É sempre a mesma coisa… que raio de país é este?”, desabafa num sotaque algarvio cerrado. E queria uma aliança dos comunistas com o PS? “Não sei, eu queira era que houvesse um governo de esquerda e que a esquerda se entendesse. Era só o que havia necessidade. Mas a esquerda está toda dividida, não se entende.”

Os microfones voltam-se para Jerónimo, que ouve o homem, rodeado pelo candidato (e actual deputado) Paulo Sá e por Heloísa Apolónia, dos Verdes. O que falta então? “É a esquerda ser de esquerda, diz o líder comunista, assertivo. “Para um governo de esquerda tem que haver forças de esquerda com políticas de esquerda e este é que é o problema, o desentendimento.”

Ainda assim, Jerónimo de Sousa admite que existem sempre “contactos informais e formais” entre comunistas e socialistas – e já por duas vezes disse em comícios nesta campanha que há “amigos socialistas que telefonam”. “Nós não temos relações cortadas, não é...”, diz, esquivo, sem querer especificar quem do PS lhe tem telefonado. Mas reforça: “Não há nenhum processo de negociação esmiuçado. Há contactos de informalidade.”

Um pouco mais tarde haveria de admitir que recebe mais contactos de votantes PS do que de dirigentes, uns a dizer que apesar de socialistas vão desta vez votar CDU e outros a apelar à convergência depois das eleições.

E o que dizem os comunistas aos socialistas? “O mesmo que dizemos em público: nunca fugiremos a um diálogo sincero que procure soluções para o país, mas sempre nestes parâmetros. Ninguém entenderia que andássemos aqui na rua a defender uma política que consideramos necessária e depois, por razões exclusivas de poder, abdicávamos desse capital.” Jerónimo não quer “confundir as coisas” nem ter o “poder pelo poder”.

O líder comunista conta que tem dito “muitas vezes” ao PS que esta disponibilidade para o diálogo “é sã”. Porém, “a troco de lugares, ir para lá de coração ao alto e o compromisso com o povo é posto à borda do prato? Não pensem nisso.”

Mas há um outro problema e é por isso que a bola para esse jogo da união continua no meio-campo dos socialistas: o PS não é, na verdade, um partido de esquerda, considera Jerónimo. Ou pelo menos, a política que faz não o é. Recorda que foi o PS que “chamou a troika e assinou o memorando; atacou direitos fundamentas dos trabalhadores; encetou um processo de privatizações muito largo”. E por isso a CDU só está disposta a assumir as “responsabilidades que o povo entenda atribuir-lhe” mas para trabalhar numa “política patriótica e de esquerda”. E isso há muita gente que “não entende porque o que os anima na vida política é o poder pelo poder”.

Abstenção vai "tocar a todos"
Desvalorizando as sondagens, incluindo as que mostram uma subida da CDU – como a da SIC/Expresso, que dá uma votação de 10% e um intervalo de 20 a 22 deputados, o que representa uma grande subida dos actuais 16 - Jerónimo diz que a coligação “não quantificou” os objectivos, mas que eles passam por mais votos e deputados. E, no Algarve, garante, “vai subir”.

O secretário-geral comunista admite que a abstenção vai “tocar a todos”, sobretudo por causa da emigração, e afirma não ver “nenhuma dinâmica no PS ou na coligação” para chegarem à maioria absoluta. “Acho que já deixaram cair essa questão. Agora estão ali a tentar disputar o chamado empate técnico.”

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