Libéria coloca terceira província em quarentena devido ao vírus do ébola

Enquanto a Organização Mundial da Saúde discute a utilização de tratamentos experimentais para lutar contra a doença, os médicos no terreno sofrem de exaustão pelos meses de trabalho. Guiné-Conacri não encerrou, afinal, as suas fronteiras.

Foto
É urgente mobilizar milhares de profissionais de saúde para combater o ébola DR

Ninguém entra, ninguém sai. São estas as regras do estado de quarentena, o possível cenário regional extremo para os países afectados pelo vírus do ébola, e que foi avançado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na sexta-feira, considerando a crise uma “emergência de saúde de âmbito internacional”. A África Ocidental está a braços com o surto do ébola mais perigoso de sempre, que está longe de estar controlado. Nesta segunda-feira, a Libéria decretou quarentena para a província de Lofa.

“A província de Lofa, no Norte, foi posta em quarentena pelos militares. A decisão foi tomada pelo grupo de trabalho contra o ébola. A partir de agora, ninguém entrará em Lofa e ninguém sairá. Queremos proteger as populações que ainda não foram afectadas” pela epidemia, ouviu-se na mensagem difundida na rádio pela Presidente da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, citada nesta segunda-feira pela AFP. Esta é a terceira província da Libéria onde foi decretada quarentena.

No sábado, a Presidente da Libéria tinha pedido desculpas à comunidade médica pelo estado em que se encontravam os serviços médicos do país. “Peço desculpa, se não fizemos o suficiente até agora”, disse, citada pela Reuters, a centenas de trabalhadores da saúde que se reuniram na câmara municipal de Monróvia, a capital do país. Ellen Johnson Sirleaf prometeu 13,45 milhões de euros para lutar contra a doença, parte irá para os trabalhadores da saúde.

Naquele país, já morreram três médicos e 32 trabalhadores da saúde devido à febre hemorrágica. Não há nenhum tratamento ou vacina comerciais para o vírus do ébola. Tudo o que se pode fazer é hidratar os doentes, controlar a febre e tratar as infecções secundárias. A mortalidade é alta, no caso da estirpe Zaire, a que está a causar o actual surto, pode chegar a 90%.  

“O maior desafio é que os prestadores de cuidados de saúde estão a ficar exaustos. Têm trabalhado durante muito tempo e em condições difíceis”, explicou à agência Lusa Nyka Alexander, porta-voz do centro de coordenação da OMS para o combate contra o ébola da África Ocidental.

Já lá vão mais de quatro meses desde que a OMS foi notificada pela primeira vez pela Guiné-Conacri, devido ao ébola. Mas uma equipa de investigadores, que inclui cientistas do Instituto Pasteur, em França, determinou por técnicas epidemiológicas que a primeira pessoa suspeita de ter contraído a doença foi um rapaz de dois anos que morreu a 6 de Dezembro de 2013, na aldeia de Meliandou, no Sul da Guiné, junto da fronteira com a Libéria e a Serra Leoa.

Num artigo de Abril da revista The New England Journal of Medicine, a equipa traça a linha de contágio iniciada nessa criança e que se disseminou pelo país. O vírus já se alastrou para a Serra Leoa, a Libéria e a Nigéria, infectando 1779 pessoas e morto 991, de acordo com a OMS. A Nigéria confirmou nesta segunda-feira um acumular de dez casos em Lagos, na capital, com dois mortos.

Ao contrário do que tinha anunciado anteriormente, a Guiné-Conacri lançou um comunicado pela televisão a explicar que não fechou as fronteiras com a Serra Leoa e a Libéria. Há apenas “medidas sanitárias nas fronteiras”, avança o comunicado citado pela Reuters. Já a Costa do Marfim, que não foi afectada pelo vírus, baniu nesta segunda-feira os voos para os três países mais afectados.

Para já, o vírus ainda não foi identificado em pessoas noutros países. Os testes de despiste para o ébola feitos em pessoas com sintomas suspeitos deram negativo na Grécia, na Arábia Saudita, em Hong Kong, no Canadá ou em Benim, na África Ocidental. No domingo, um estudante alemão foi isolado num hospital em Kigali, capital do Ruanda, por ter sintomas que podem ser do ébola, já que tinha estado na Libéria antes de viajar para o Ruanda. Os resultados das análises demoram 48 horas.

Em Portugal, a Direcção-Geral da Saúde disse que ia pôr ontem, no aeroporto de Lisboa, cartazes e folhetos para os viajantes que estiveram em países com ébola a dizer o que se deve fazer caso estejam doentes.

Por outro lado, um painel da OMS reune-se para discutir se é ético aplicar tratamentos e profilaxias contra o ébola que ainda não foram testadas em seres humanos. A questão impôs-se depois de dois norte-americanos, que trabalhavam na Libéria com doentes de ébola, terem contraído a doença. Kent Brantley, médico de 33 anos, e Nancy Writebol, uma missionária de 59 anos, acabaram por receber o tratamento experimental ZMapp, desenvolvido por uma empresa norte-americana, ainda em África.

O tratamento, um soro que contém três anticorpos contra o vírus, nunca tinha sido aplicado em pessoas e terá dado resultado nos dois doentes que foram depois transportados para os Estados Unidos. “Sinto-me melhor a cada dia que passa”, disse o médico. Segundo a Reuters, Nancy Writebol mantém-se num estado frágil. O medicamento, contudo, já foi exportado para Espanha para ser aplicado a Miguel Pajares, o padre espanhol de 75 anos que contraiu ébola enquanto trabalhava num hospital na capital da Libéria.

O estado do doente espanhol, no Hospital Carlos III, em Madrid, é estável e já está a receber o soro, de acordo com o jornal espanhol El Mundo. Embora ainda não se tenha confirmado se o soro realmente combate o vírus, a agência espanhola dos medicamentos e dos produtos sanitários deu ainda assim autorização para o seu uso, avançou a AFP.

Na reunião da OMS, também iam ser discutidos os critérios para permitir o uso de um fármaco ou vacina em caso de infecção pelo ébola e quem teria prioridade para os receber.

Sugerir correcção
Comentar