Os mergulhadores voluntários que procuram corpos de crianças no ferry naufragado

Os três primeiros corpos encontrados no interior do ferry foram resgatados por voluntários, no domingo de manhã.

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Já não é uma operação de socorro mas de recolha de corpos AFP

Lee Jun-Ho, que é professor de artes marciais, começou a fazer mergulho submarino por prazer. Nos últimos dias, porém, tem sido um dos muitos civis que mergulham à procura de corpos de crianças mortas nos labirintos do ferry naugrafgado ao largo da Coreia do Sul.

Na quarta-feira 16 de Abril, Lee, de 41 anos, preparava-se para passar mais um dia na sua escola de Taekwondo perto de Busan, no Sul do país, quando ouviu que um ferry com centenas de pessoas a bordo tinha naufragado. 

À medida que o drama aumentava, o professor, que também é instrutor de mergulho, agarrou no seu material e percorreu os 250 quilómetros entre a sua casa e Jindo, a ilha próxima do local do acidente. Dezenas de mergulhadores tiveram a mesma ideia e encontraram-se todos na ilha, onde chegaram dispostos a dar a sua contribuição para salvar os sobreviventes ou os que tivessem ficado encurralados dentro do barco.

“Eu tenho dois filhos”, diz este homem que, no porto de Jindo, já está preparado para mais um mergulho. "A imagem daqueles estudantes todos encurralados era-me insustentável. Pensei que tinha o dever de ajudar a tentar salvá-los".

Mais de 500 mergulhadores oriundos de toda a Coreia do Sul participam na operação. A maior parte deles são voluntários, mas também há militares de elite. “No início houve alguma confusão”, lembra Lee. A coordenação entre as equipas de mergulhadores voluntários, militares e das unidades da guarda costeira é confusa. E a presença destes voluntários não agrada a todos.

“Isto não é um mergulho de lazer. É difícil, é perigoso, não é para amadores”, diz Kim Do-Hyun, presidente da unidade de resgate de navios que junta antigos militares de elite. “Se alguma coisa acontece a um voluntário, de quem é a responsabilidade? As autoridades deviam ter agido no início e deviam tê-los impedido de ir para a água”, diz numa entrevista telefónica.

Mas a dimensão da catástofre e das operçaões de socorro levaram as autoridades a aceitar toda a ajuda que apareceu.

Esta segunda-feira, o balanço do desastre já ia em 64 mortos e 238 desaparecidos, a maior parte deles alunos de liceu de uma escola a Sul de Seul que iam em visita de estudo. A esperança de encontrar alguém nas bolsas de ar no interior do barco é quase nula e as operações já não são de socorro mas de recuperação de corpos. Os três primeiros corpos encontrados no interior do ferry foram resgatados por três mergulhadores voluntários, no domingo de manhã. 

“O ambiente mudou subitamente”, conta Lee Jun-Ho. Alguns voluntários decidiram regressar a casa.

“Foi uma grande decepção não encontrar ninguém com vida (...) foi tremendo, mas este trabalho tem que ser feito”, diz este mergulhador para explicar porque decidiu continuar a participar nas operações.

Do que Lee não fala, porque se recusa, é do que lhe vai no pensamento quando nada entre o ferro submerso à procura de crianças mortas. “Não quero, de todo, falar nisso”.

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