Comida italiana e passeios de barco reservados para depois da morte

Os cemitérios de luxo na Indonésia têm de tudo. Dá até para casar.

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Lago onde quem visita os familiares enterrados pode andar de barco DR
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Na Indonésia, não é só o luxo da vida corrente que importa. No país de maioria muçulmana, cada vez mais cedo começa a preparação de um estilo de vida que deve ser mantido após o sopro final.

Em Karawang jaz um paraíso. O “Lago dos Anjos”, de oito hectares, está contornado por um verde que se perde no horizonte e o ar que se respira roça o divino, sobretudo para quem deixou a poluição de Jacarta 70 quilómetros atrás.


Ao longe, o aglomerado de pessoas, a maioria sentadas sob um toldo, as cestas de flores e o aparato de fotógrafos fazem lembrar um casamento. Mas a voz trémula do filho da falecida, enquanto lê versículos do Alcorão na derradeira despedida, levam-nos a descer à terra e a perceber que o ambiente não é de celebração. Pelo menos para este grupo.

Já na lápide disposta no centro do Parque Memorial San Diego Hills lê-se que a morte é a entrada “numa vida mais feliz” e que “os cemitérios de hoje estão errados porque retratam um fim e não um começo” e promovem “costumes deprimentes”, sendo, por isso, “lugares que não fazem nada para salvar a humanidade”.

Mochtar Riady decidiu criar este espaço devido ao desconforto que sentia ao visitar a campa dos pais num cemitério de Java Oriental, que “não era devidamente mantido” e onde havia vários pedintes, conta a directora do San Diego Hills.

Inspirado no cemitério californiano Forest Lawn, que, acrescenta Suziany Japardy,  também “não é assustador”, nasceu, em 2007, aquele que é considerado o primeiro cemitério com áreas de lazer do mundo e para onde Mochtar trasladou os restos mortais dos pais.

Num espaço que equivale a 500 campos de futebol, há três jardins –  um muçulmano, um universal (maioritariamente para cristãos) e outro chinês (sobretudo budista e confucionista) –, uma capela e uma pequena réplica da Mesquita Azul de Istambul.

Para o funeral, este cemitério de luxo tem à disposição serviços como um helicóptero, catering, lançamento de balões e de pombas. Na área recreativa, há um restaurante italiano, que também serve especialidades asiáticas,  uma piscina, barcos a remo para usufruir do lago, pistas para ciclismo e atletismo e ainda carros de golfe que facilitam as deslocações.

No futuro, o Grupo Lippo, proprietário deste espaço, quer ainda construir um hotel, um hospital e mais espaços comerciais na zona, segundo Suziany Japardy.

Diversão e casamentos no cemitério

No Parque Memorial San Diego Hills, o Dia dos Finados, assinado pelos católicos a 2 de Novembro, tornou-se um dia de lazer. Também noutras religiões, há o costume de visitar os mortos pelo menos uma vez por ano e em família e é também para eles que este cemitério foi pensado.

A directora do Parque Memorial San Diego Hills diz que em cemitérios sem instalações de lazer, as famílias têm de visitar as campas dos falecidos a correr, “porque a situação não é boa, o ambiente não é bom” e às vezes nem sequer existem casas-de-banho.

Num cemitério convencional, “por vezes eles não trazem os filhos ou os netos, porque, especialmente quando  são muito novos, isso não é muito conveniente” , reforça, sublinhando: “Tens de te despachar e voltar e isso não é bom para a cultura nem para a geração lembrar ou conhecer os seus antepassados”.

Ratih Octavia, que se encontra neste cemitério de luxo para visitar a campa do pai no mesmo dia da visita do PÚBLICO, considera o local estratégico e “muito confortável”, o que ajuda a encarar a morte de um modo menos negativo.

A jovem cristã protestante, cuja família pretende comprar mais espaços neste cemitério, destaca que o espaço é agradável também porque reúne todas as religiões.

E se este parque memorial pode servir apenas como espaço turístico ou de lazer, também há quem o eleja para uma das datas mais felizes. Foi o que fez uma cliente que escolheu o parque memorial para casar, um mês depois de o pai ali ter sido enterrado. “Ela estava feliz, porque o seu sonho tornou-se realidade. Casou-se e depois passou junto ao [jazigo do] pai”, lembra a directora.

Investir na última morada é uma questão de life&style

“Estás a gozar comigo?”, disse Suziany Japardy quando lhe foi proposto lançar este negócio. “Eles de facto não pensam nisto, não é muito importante. É tabu pensar nestas coisas, incluindo a família”, justificava na altura junto do fundador.

Daí que promover este luxo não foi tarefa fácil, sobretudo nos dois a três primeiros anos, refere. “Uma vez um dos promotores de marketing foi para uma exposição num dos centros comerciais e alguém jogou na cara dele o panfleto que ele tinha oferecido”, recorda.

Suziany Japardy assume que criou um “estilo de vida”. “Tens de seguir o estilo de vida, caso contrário, vão pensar que não és uma pessoa com a mente aberta”, vinca, acrescentando que muitas celebridades vão para a televisão dizer que já compraram um jazigo.

Actualmente, 60 por cento do marketing da empresa, que vende em média 6000 jazigos por ano, está direccionado para pessoas com menos de 60 anos. Entretanto, também se têm multiplicado os parques memoriais na Indonésia.

Mas se conseguir um lugar no céu não parece fácil, de acordo com várias confissões religiosas, um lugar na terra num cemitério de luxo também não. No San Diego Hills, os preços começam nos 1753 euros (ou 714 euros num pacote de 14 jazigos). Nada que a crescente classe média indonésia, ávida de consumo e de posição social, não faça para alcançar.
 
 
 
 
 
 
 

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