Socialistas espanhóis escolhem novo líder para recuperar eleitorado perdido
Pedro Sánchez, Eduardo Madina e Pérez Tapias correm para a sucessão de Rubalcaba. Escolha do candidato à chefia do governo será feita em primárias abertas, previstas para Novembro.
Os socialistas espanhóis elegem este domingo um novo líder. Ao escolherem entre os três nomes que estão na corrida, os militantes do PSOE (Partido Socialista Operário, Espanhol) procuram reagir a uma tendência de perda, acentuada pela derrota nas eleições europeias de Maio, e renovar as aspirações de poder, num contexto europeu de dificuldades para os partidos tradicionais.
A tarefa que espera o vencedor da disputa que opõe Pedro Sánchez, Eduardo Madina e José Antonio Pérez Tapias é “enorme”, como disse o líder cessante, Alfredo Pérez Rubalcaba, ao anunciar a demissão, na sequência da derrota eleitoral de 25 de Maio. As últimas eleições deixaram clara a incapacidade socialista para capitalizar o descontentamento provocado pelos danos sociais da crise e evidenciaram o divórcio de uma parte significativa do seu eleitorado tradicional. "O partido atravessa uma crise porque os cidadãos retiraram-nos a confiança", disse à AFP uma eleita local, Begona Crisellys.
O pior resultado da história do partido, 23%, mais não fez do que confirmar que muitos eleitores deixaram de se rever no PSOE e acentuar uma tendência que os números confirmam de forma crua – 11 milhões de votos nas últimas eleições legislativas que venceu, em 2008, três milhões e meio em Maio.
O rumo da nova liderança é determinante quer para o espaço político da esquerda – o mau resultado nas europeias foi acompanhado da irrupção do movimento Podemos, com perto de 10% – quer para o sistema político espanhol. As duas grandes forças partidárias tradicionais, o PP, de direita, actualmente no poder, e o PSOE somavam habitualmente cerca de 80% do eleitorado. Em Maio não chegaram aos 50%.
A substituição de Rubalcaba, 62 anos, ministro e porta-voz nos governos de Felipe Gonzalez, nos anos 1980 e 1990, e de José Luis Rodriguez Zapatero, na última década, marca um “fim de época”. O primeiro desafio que os candidatos à sucessão tiveram foi o de mobilizarem os militantes. O processo começou com um razoável alheamento dos socialistas sobre a vida interna do partido – 61,3% dos 197.468 inscritos não subscreveram a candidatura de qualquer dos concorrentes.
Sánchez e Madina favoritos
Pedro Sánchez, 42 anos, madrileno, professor de economia e deputado, até aqui pouco conhecido publicamente, foi o que maior número de assinaturas de apoio recolheu na fase da apresentação de candidaturas: 41.338. Ainda que isso pouco signifique – estatutariamente bastavam 9874 (5% do universo de militantes) –, esse triunfo preliminar, associado à boa imagem televisiva, fez com que passasse a ser encarado como forte candidato. Apresenta-se como “militante de base”, que até há “ano e meio não estava na política” – uma afirmação que faz tábua rasa do seu anterior envolvimento na política local madrilena.
O percurso de Eduardo Madina, a quem os estudos de opinião têm igualmente atribuído possibilidades de vitória, é bem diferente. Aos 38 anos, é o mais jovem dos concorrentes, mas tem história no PSOE. Militante desde os 17 anos, secretário do partido no Congresso dos Deputados, rejeita a ideia de ser “o candidato do aparelho”. Basco, sofreu em 2002 um atentado que o obrigou à amputação da parte inferior de uma perna. A sua candidatura foi subscrita por 25.238 militantes.
As sondagens feitas durante a campanha interna indicavam que a preferência dos votantes do PSOE vai para Sánchez e Madina, mas deixam a questão em aberto. Há uma semana, um estudo do El País indicava que 30,8% preferiam o deputado madrileno, contra 27% que escolheriam o rival; outro, do El Mundo, invertia a ordem, com 40% para o candidato basco e 37% para o adversário.
Se os estudos de opinião dos eleitores traduzirem o sentimento dos militantes, José Antonio Pérez Tapias, sevilhano, professor da Faculdade de Filosofia e Letras de Granada, 59 anos, 21 de militância, dificilmente chegará à liderança. Representante da corrente Izquierda Socialista, viu a sua candidatura apoiada por 9912 militantes. Tem um trajecto que o distingue claramente dos adversários. As posições que foi tomando colocam-no mais à esquerda: como deputado, ausentou-se da votação que, em 2011, aprovou o pacto que o então Governo socialista fez com o PP para incluir na Constituição o príncipio do equilíbrio orçamental das contas públicas. Com ele tem militantes que estiveram próximos do movimento contestatário 15-M, que há três anos encheu praças de muitas cidades reclamando mudanças políticas.
Catalunha e monarquia
A escolha da nova liderança acontece numa altura em que, para além dos desafios económico-sociais, a democracia espanhola enfrenta um dos seus maiores desafios – o ímpeto soberanista catalão.
Sánchez e Madina subscrevem a tese oficial do PSOE de defender uma reforma constitucional para encontrar uma solução de autonomia que acomode a Catalunha no contexto nacional, o que levaria a um referendo em toda a Espanha. Pérez Tapias subscreve a posição oficial, mas é favorável a uma Espanha como Estado Federal plurinacional e pensa que devia ser feita uma consulta não vinculativa sobre a Catalunha para que, pelo menos, se fique a saber o que pensam os catalães.
Ainda que todos se declarem republicanos, Sánchez e Madina assumiram no único debate de campanha o respeito pelo pacto que consagrou a monarquia constitucional. Também aqui Pérez Tapias destoa: entende que a discussão entre monarquia e república chegou para ficar e admitiu um referendo. Comum a todos está a vontade de revogar medidas aprovadas pelo PP em áreas como as relações laborais.
Quando, provavelmente na noite deste domingo, for conhecido o nome do novo líder, fica a sobrar a questão do candidato à presidência do Governo, em 2015. Todos os concorrentes se comprometeram a convocar primárias abertas a simpatizantes para escolher o nome, tal como o PSOE tinha decidido em Novembro do ano passado.
O processo segue o exemplo do Partido Democrata italiano na eleição da sua liderança e do Partido Socialista francês, na escolha do candidato a Presidente da República. O nome está totalmente em aberto. Pérez Tapias foi o único que se colocou claramente fora da corrida. Com ele na liderança, haveria uma solução bicéfala, como a que o PSOE experimentou em 1998-1999, quando adoptou uma fórmula que não chegou às legislativas por divergência internas: Joaquin Almunia como secretário-geral e Josep Borrel como candidato a presidente do Governo. Eduardo Madina explicou que só concorrerá se ganhar a liderança do partido. Pedro Sánchez disse que a prioridade era resolver a questão partidária e ainda não clarificou a sua posição.
Como escreveram há dias no El País Ignacio Urquizu e David Lizoain, professores da Universidade Complutense, grande parte do debate interno centrou-se “no modo como deve ser eleito o futuro líder e quem deve ele ser, como se se tratasse de um casting”.
As diferenças programáticas ficaram, em seu entender, para segundo plano, “o que é grave, porque a função dos partidos é representar uma ideia de país que possa ganhar a confiança de uma maioria”. Para os dois universitários, os desafios do PSOE vão muito para lá dos nomes. O partido tem “pouca margem” de manobra e, “se não resolver correctamente esta encruzilhada, pode perder não só a sua liderança dentro do progressismo, mas também a sua relevância na sociedade”.
Os passos da sucessão de Rubalcaba
26 de Maio Alfredo Pérez Rubalcaba demite-se do cargo de secretário-geral do PSOE, após a derrota nas eleições europeias
13-27 de Junho Os concorrentes recolhem assinaturas para apresentarem as suas candidaturas à liderança partidária.
28 de Junho O PSOE anuncia que os três candidatos entregaram o número de assinaturas necessárias para poderem concorrer ao cargo de secretário-geral
3-12 de Julho Campanha interna para a eleição do secretário-geral
13 de Julho O secretário-geral é eleito pelo voto secreto de um universo eleitoral de quase 200 mil militantes. São também eleitos os delegados ao congresso
26-27 de Julho Cerca de mil delegados ao congresso extraordinário do partido ratificam o nome do líder. Nada nos estatutos obriga os congressistas a validar a votação de 13 Julho, mas esta deverá ser confirmada
Novembro Em data a definir, estão previstas primárias abertas a simpatizantes do partido, mediante registo prévio, para a escolha do cabeça-de-lista às legislativas de 2015