Sobreviventes da talidomida criticam pedido de desculpas da empresa

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Estátua lembrando sobreviventes e mortos da acção da talidomida Henning Kaiser/AFP

Mais de 50 anos depois das terríveis consequências da talidomida, com milhares de bebés mortos ou nascidos sem pernas ou braços, a farmacêutica fez o seu primeiro pedido de desculpas. Mas a acção não agradou aos grupos de sobreviventes.

É uma história de dramas: milhares de bebés mortos, a nascer sem braços ou pernas ou sem qualquer membro, porque as suas mães tinham tomado um medicamento contra os enjoos. Tudo se passou nos anos 1950, e só depois de um médico australiano ter relatado um número anormal de bebés a nascer sem braços ou pernas, notando que todas as mães tinham tomado este medicamento, é que a talidomida foi retirada do mercado, em 1961.

Na sexta-feira, a farmacêutica alemã fez o seu primeiro pedido de desculpas aos sobreviventes ao seu medicamento, numa cerimónia em que a Grünenthal mostrou uma estátua de bronze de uma criança sem membros na cidade-sede da companhia, Stolberg.

O director executivo da companhia, Harald Stock, dirigiu-se às vítimas, lamentando inclusivamente "não termos falado convosco durante quase 50 anos – pedimo-vos que vejam este silêncio como sinal do choque que o vosso destino nos causou".

Mas Stock também reafirmou que, à luz dos conhecimentos da altura, a empresa não tinha como saber que o remédio poderia provocar aqueles efeitos.

Há quem veja esta acção da Grünenthal à luz de vários processos recentes pedindo à empresa compensações para sobreviventes que acabaram por viver mais do que o esperado e que têm mais custos de saúde. Há processos na calha nos EUA, Canadá e Austrália.

Indemnização há pouco mais de um mês

Lynette Rowe, hoje com 50 anos, nasceu sem braços nem pernas. Ganhou há pouco mais de um mês um caso contra a farmacêutica e os seus distribuidores na Austrália. O montante não foi revelado, mas sabe-se que são vários milhões de dólares. Wendy Rowe, a mãe de Lynette, criticou o pedido de desculpas e o uso do "choque" para desculpar o silêncio da empresa. "A nossa família não pode entrar em choque. Tivemos de nos levantar e enfrentar cada dia o dano incrível que o medicamento da Grünenthal fez à Lynn e à nossa família."

"Se estão seriamente a pensar admitir que têm culpa e lamentam o que aconteceu, precisam de começar a ajudar os que ficaram afectados financeiramente", disse Freddie Astbury, o principal consultor da Thalidomide UK Agency, que nasceu em 1959 sem braços nem pernas depois de a sua mãe ter tomado o medicamento. "Ser deficiente é muito caro e as pessoas afectadas pela talidomida precisam de ajuda e cuidados, e adaptações nas suas casas e carros. Queremos apenas que as pessoas vivam uma vida confortável e isso quer dizer que a Grünenthal tem de pagar pelo seu erro financeiramente."

Mais esperança de vida

Os fabricantes no Reino Unido do medicamento foram os primeiros a chegar a um acordo de compensação com as vítimas no final dos anos 1960, pagando mais de 35 milhões de euros às vítimas na década seguinte.

A Grünenthal diz que deu quase 500 milhões de euros às vítimas até 2010. Na Alemanha, os sobreviventes recebem uma pensão mensal de até 1116 euros de um fundo para o qual a farmacêutica contribui.

Mas os casos continuaram e, à medida que as expectativas de sobrevivência das vítimas aumentaram, surgiram novos processos com pedidos de novos cálculos de indemnização.

A talidomida foi mais tarde usada para o tratamento de doenças como a sida e, mais recentemente, para alguns tipos de cancro.

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