O Presidente irlandês e um antigo comandante do IRA à mesa de jantar em Windsor

Michael D. Higgins retribui visita de Isabel II a Dublin, numa deslocação que visa sublinhar uma nova era nas relações entre os dois países.

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McGuinness cumprimentou a rainha, quando ela visitou Belfast, em 2012 Paul Faith/Reuters

Retribuindo a histórica visita da rainha Isabel II a Dublin, em 2011, Michael D. Higgins inicia na terça-feira a primeira visita de Estado de um Presidente da Irlanda ao Reino Unido. É a etapa final de um caminho de normalização das relações, próximas mas conflituosas, entre as duas nações e nenhum outro compromisso na agenda da visita será tão simbólico como a presença de Martin McGuinness, vice-primeiro-ministro da Irlanda do Norte e antigo comandante do IRA, no jantar oferecido pela rainha no castelo de Windsor.

A coroa britânica estendeu o mais vermelho dos seus tapetes para Higgins, que ficará hospedado durante a visita em Windsor, convite reservado a apenas um punhado de líderes mundiais, escreve a BBC, adiantando que Isabel II se tem envolvido pessoalmente nos preparativos da visita. Também pela primeira vez desde a independência, em 1921, o Presidente irlandês vai discursar no Parlamento britânico.

“Esta visita é, quer do ponto de vista simbólico quer prático, de uma importância enorme, e eleva a um nível sem precedentes a relação entre os dois países”, recordou no último fim-de-semana o primeiro-ministro irlandês, Enda Kenny, sublinhando que a deslocação “seria impensável ainda há 20 anos”. Na altura, os acordos de paz na Irlanda do Norte – província britânica que Dublin mantém como pretensão vir um dia a agregar – estavam ainda distantes e os contactos entre os dois governos eram marcados pelo conflito. A paz em 1998 mudou radicalmente o clima e, desde então, os dois países estreitaram os laços, históricos, sociais e económicos – o Reino Unido exporta actualmente mais para a Irlanda do que para Índia, China e Brasil juntos, recordou o Irish Times.

Sensível do ponto de vista político, a visita da rainha britânica à Irlanda, há quase três anos, acabou por revelar-se um sucesso de relações públicas, sobretudo depois de a monarca ter depositado flores no memorial que recorda os irlandeses que lutaram contra o domínio britânico ou quando, num jantar em Dublin, pronunciou algumas palavras em gaélico.

Gestos que impressionaram McGuinness e o convenceram a aceitar, desta vez, o convite para o jantar oferecido pela rainha ao Presidente irlandês. Em 2011, o partido republicano Sinn Féin recusou participar na recepção à monarca em Dublin, mas no ano seguinte o vice-primeiro-ministro da Irlanda do Norte cumprimentou-a publicamente quando ela visitou Belfast – um aperto de mão histórico entre a detentora da coroa e o homem que era comandante do Exército Republicano Irlandês (IRA) quando, em 1979, o grupo matou Louis Mountbatten, primo de Isabel II.

Além de simbólica, a presença de McGuinness no jantar sinaliza também uma nova atitude da liderança republicana da Irlanda do Norte face às instituições britânicas, refere a BBC, recordando que, durante anos, os deputados eleitos pelo Sinn Féin recusaram assumir funções em Westminster, porque isso os obrigava a jurar fidelidade à rainha. “Isto faz parte da construção das relações entre os dois países e os dois povos”, reagiu Kenny, sublinhando que “é preciso seguir em frente e ninguém deve ficar preso ao passado”.
 

   





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