Htin Kyaw toma posse e torna-se o primeiro Presidente civil eleito na Birmânia

Fiel conselheiro de Aung San Suu Kyi é o primeiro Presidente democratimante eleito no país desde a ditadura militar. Parlamento não conteve as lágrimas num "dia histórico".

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O presidente com a líder do partido e Nobel da Paz REUTERS
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O novo e o anterior presidente Thein Sein durante a cerimónia REUTERS
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Aung San Suu Kyi e os vice-presidentes Henry Van Thio e Myint Swe REUTERS
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A líder do partido vencedor não pode ser presidente por ter filhos estrangeiros REUTERS
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O discurso do novo Presidente foi considerado histórico AFP

Htin Kyaw tomou posse esta quarta-feira como novo Presidente da Birmânia, tornando-se assim no primeiro chefe de Estado civil a ser democraticamente eleito no país desde 1962, data do golpe de Estado que conduziu a mais de cinco décadas de ditadura militar.

Na cerimónia que decorreu no Parlamento birmanês, Aung San Suu Kyi foi empossada ministra dos Negócios Estrangeiros, da Educação e da Energia, sendo que também terá a seu cargo a pasta do gabinete do Presidente, o que vai ao encontro da ideia da carismática líder da Liga Nacional para a Democracia (LND) de estar “acima do Presidente”.

O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, felicitou Htin Kyaw, considerando a sua nomeação uma “mudança histórica”. “Este é um momento extraordinário na história da Birmânia, uma homenagem ao seu povo, às suas instituições e aos líderes que têm trabalhado em conjunto para uma transferência de poder pacífica, e enfatiza a profundidade das reformas empreendidas pelo país desde 2011”, afirmou, num comunicado divulgado pela Casa Branca. Em 2012, Obama fez uma visita histórica ao país, naquela que foi a primeira vez que um Presidente americano visitou a Birmânia desde o golpe militar de 1962. 

Htin Kyaw sucede assim a Thein Sein, um antigo general, que estava à frente do poder desde 2011, altura em que os militares abriram um processo de transição no país e de abertura ao exterior. Apesar disso, mantinham o domínio no Parlamento através da maioria do partido político que criaram, o Partido da Solidariedade e do Desenvolvimento.

Nas eleições de Novembro passado, a LND de Suu Kyi venceu com 80% dos votos. Contudo, devido a uma lei na Constituição criada em 2008 que proíbe a nomeação de chefes de Estado com filhos estrangeiros, que é o caso da Nobel da Paz, esta não pôde concretizar o seu objectivo de se tornar Presidente da Birmânia.

Nesse sentido, e tendo em conta a maioria do seu partido no Parlamento, a líder da LND escolheu Htin Kyaw, um fiel conselheiro e amigo de infância para assumir o cargo. O novo Presidente birmanês é um homem fiel à família de Suu Kyi, tendo dirigido a fundação que a sua mãe fundou, e, apesar de ser membro da LND há pouco tempo, tem ligações históricas ao partido, uma vez que o seu pai foi um dos fundadores da Liga e a sua mulher é deputada pelo mesmo.

A nomeação de Htin Kyaw para Presidente é um passo importante no processo de democratização da Birmânia, apesar das dificuldades impostas pelos militares, que, devido à Constituição, garantem um quarto dos assentos parlamentares e nomeiam os ministros da Defesa, do Interior e das Fronteiras. A ambição de Suu Kyi de desmilitarizar o país esbarra nestas limitações, que a impedem de alterar a Constituição e de chegar ao cargo de Presidente, uma vez que os militares detêm ainda um grande poder político e económico no país.

Parlamento em lágrimas

Os membros da LND no Parlamento não esconderam a sua emoção na altura da tomada de posse do novo Presidente, um acto com bastante valor simbólico, uma vez que Htin Kyaw é o primeiro chefe de Estado democraticamente eleito no país, depois de uma ditadura repressiva que levou a muitas detenções, incluindo a da própria Suu Kyi.

“Não consegui dormir a noite passada. O discurso do nosso Presidente Htin Kyaw é algo que nunca tínhamos ouvido no país”, afirmou Thiri Yadana, deputada da LND, citada pela Reuters.

Num curto discurso perante o Parlamento, o novo Presidente reiterou a importância de Suu Kyi nesta fase de transição da Birmânia, apelando a uma reconciliação nacional. “O nosso Governo vai dar seguimento a uma reconciliação nacional, à paz no país e à emergência de uma Constituição que levará a uma união democrática e melhorará o nível de vida das pessoas”, afirmou Htin Kyaw, momentos depois de fazer o juramento. “Temos o dever de trabalhar para a emergência de uma Constituição apropriada para o nosso país e que esteja de acordo com os padrões democráticos”, reiterou.

Na cerimónia, onde estiveram presentes centenas de diplomatas, jornalistas e representantes de organizações não-governamentais, também tomaram posse os dois vice-presidente eleitos: Myint Swe, candidato apoiado pelos militares, e Henry Van Thio, membro da LND, que foi eleito para representar as minorias. 

Alexander Graf Lambsdorff, vice-presidente do Parlamento Europeu, que trabalhou enquanto observador nas eleições de Novembro, afirmou que este foi um "dia histórico" para a Birmânia. “É a conclusão do processo eleitoral com uma mudança de poder, algo que há alguns anos teria sido impensável”, afirmou ao Channel NewsAsia.

O caminho para a democratização e desmilitarização do país não será fácil, e Suu Kyi terá agora que continuar a negociar com os militares para levar a cabo as reformas que tem em mente para o país, mantendo a ambição de conseguir alterar a Constituição e de, no futuro, conseguir mesmo chegar a Presidente da Birmânia. 

Texto editado por Bárbara Wong

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