Explosão de granadas e tiros de metralhadora na véspera das legislativas no Burundi

Na origem da violência política está o anúncio do Presidente Pierre Nkurunziza de que será candidato a um terceiro mandato. Oposição vai boicotar o acto eleitoral.

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Em clima de violência política o Burundi realiza eleições legislativas e locais Paulo Nunes dos Santos/Reuters

Três mortos, explosões de granadas, tiros de metralhadoras: foi mais uma noite e madrugada de violência na capital do Burundi, Bujumbura, entre sábado e domingo. Mas apesar dos apelos da comunidade internacional e do boicote da oposição, a Comissão Eleitoral do país anunciou que "está tudo a postos" para as eleições legislativas e locais de segunda-feira e para as presidenciais de 15 de Julho.

Os confrontos ocorreram nos bairros de Jabe, Musaga e Kanyosha, no epicentro do movimento de contestação popular que surgiu assim que o actual Presidente, Pierre Nkurunziza, anunciou que se iria recandidatar a um terceiro mandado.

Sete granadas explodiram, metralhadoras foram disparadas e dois civis morreram, um às mãos da polícia e um na sequência de uma explosão. O terceiro morto é um soldado, vítima de "fogo amigo": foi atingido pelos disparos de um colega numa intervenção numa casa onde explodira uma granada, segundo explicou o porta-voz das Forças Armadas, Gaspard Baratuza, citado pela agência AFP.

Diz esta agência noticiosa que nesta parte da capital se vive um ambiente de grande tensão. No resto da cidade, há calma e os militares patrulhavam as ruas na véspera das eleições.

"Desde esta manhã que o material eleitoral está a ser enviado para as mesas de voto", disse este domingo o presidente da Comissão Eleitoral, Pierre-Claver Ndayicariye. O registo eleitoral diz que 4,8 milhões de pessoas estão inscritas para votar. Porém, a abstenção deve ser elevada, uma vez que uma parte da população fugiu do país, quando a violência política começou, em Abril.

Além disso, as legislativas foram boicotadas por todos os partidos da oposição, que denunciaram as autoridades, acusando-as de estarem "ao serviço" do poder. Disseram que não foram autorizados a fazer campanha nas ruas e na comunicação social, dominada pelo regime desde Maio, quando fracassou um golpe militar contra Nkurunziza. Os partidos disseram ainda ter sido alvo de perseguição e de ameças permanentes durante toda a campanha eleitoral.

Após ter recebido a carta dos grupos de oposição a anunciarem o boicote eleitoral, a Comissão Eleitoral anunciou que estava tudo a postos para a votação e que esta se iria manter.

Na última semana, e à medida que a data das eleições se aproximava, a violência cresceu na capital do Burundi mas também em algumas províncias. De sábado para domingo, a polícia prendeu três membros da oposição em Mutaro, na província de Gitega, o que provocou um protesto nas ruas e o corte de estradas.

As autoridades dizem que não é possível adiar mais as eleições - estavam inicialmente marcadas para 26 de Maio e 2 de Junho - devido ao risco de um vazio de poder, uma vez que o mandato de Pierre Nkurunziza termina a 26 de Agosto.

A oposição, que é contra o terceiro mandato, acusa o Presidente de, no seu desejo de se manter no poder, estar a violar o Acordo de Arusha que pôs fim à longa guerra civil que durou entre 1993 e 2006 neste país da região dos Grandes Lagos. Os especialistas em política africana dizem que há o risco de a instabilidade regressar, mas consideram que não se deverá assistir ao regresso de um conflito armado pois Nkurunziza já deixou claro que não hesitará em usar a força para manter a ordem e o seu regime. Logo que surgiu o movimento de contestação à sua terceira candidatura, os protestos foram reprimidos pela força, tendo a polícia e os militares usado fogo real contra os manifestantes.

Ainda assim, os analistas dizem que a cadeia de acontecimentos se assemelha à que levou à queda de Blaise Campaoré no Burkina Faso, no ano passado. Também aí, a intenção do líder há 27 anos no poder em permanecer no posto desencadeou uma onda de protestos violentos.

Segundo as Nações Unidas, desde Abril morreram no Burundi 70 pessoas devido à violência política e 120 mil deixaram o país, refugiando-se na República Democrática do Congo, no Ruanda, na Tanzânia e no Uganda. A maior parte desses refugiados são mulheres e crianças, segundo o ponto de situação feito pela agência das Nações Unidas para a infância (UNICEF).
 

   

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