Tribunal de Contas detecta violação da lei em concurso da Câmara do Porto

TC chumbou, em Setembro, contrato para entrega da gestão da contratação de professores para actividades extra-curriculares a uma empresa. Câmara recorreu.

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O Inglês é uma das disciplinas previstas nas actividades extra-curriculares do primeiro ciclo do ensino básico. Fernando Veludo/NFactos

A Câmara do Porto lançou este ano um concurso público para entregar a privados um serviço que, por lei, segundo o Tribunal de Contas, teria de ser gerido pelo próprio município. Em causa estão as actividades de enriquecimento curricular (AEC) dos alunos do primeiro ciclo e das crianças que frequentam os jardins de infância, que o executivo pretendia adjudicar, após concurso, à empresa Know-How, por mais de três milhões de euros, num contrato de três anos.

A recusa de visto, divulgada na sexta-feira no site do Tribunal de Contas, chegou à câmara no final de Setembro, que recorreu desta decisão mas tratou de resolver, internamente, o recrutamento dos docentes, logo em Outubro. Em resposta a questões do PÚBLICO, o gabinete de imprensa do município explica que este se limitou a seguir uma prática já corrente de externalização deste serviço. “O primeiro desses contratos foi celebrado em 2009 e o segundo em 2012, tendo ambos obtido declaração de conformidade do Tribunal de Contas”, assinala. A mesma fonte acrescenta que o município, apesar de ter ultrapassado o problema, recorreu da decisão do TC.

No acórdão proferido a 29 de Setembro, o TC deixa claro que, depois de várias alterações legais, as AEC passaram a estar regulamentadas por um despacho do secretário de Estado do Ensino Básico e secundário, de 15 de Julho de 2013, que revogou normas anteriores, pelo que, nestes termos, a autarquia acabou por avançar para uma solução que lhe estava legalmente vedada. “É obrigatória para os municípios a utilização dos mecanismos previstos no decreto-lei n.º 212/2009 e é claríssimo, nos termos desse diploma, que devem ser os próprios municípios a seleccionar e contratar os docentes necessários ao desenvolvimento das actividades de enriquecimento curricular, nos termos de legislação imperativa relativa a vínculos laborais de direito público”.

O concurso internacional foi ganho pela empresa know How - Sociedade de Ensino de Línguas e Acção Social, Unipessoal Ldª, que iria assegurar a contratação e pagamento dos docentes necessários ao desenvolvimento de várias actividades, como o inglês, música, informática expressão dramática e expressão plástica e até educação física. A questão, releva o Tribunal de Contas, é que a lei estabelece que os contratos de trabalho a celebrar entre os municípios e os técnicos envolvidos nas AEC “se regem pelo disposto na Lei n. 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e no regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela lei n.º 59/2009 (…) e ainda que esses contratos são outorgados em representação do município pelo respectivo presidente da câmara”.  

Este enquadramento legal não foi, assim, sido tido em conta pelos juristas do município e pela vereadora Guilhermina Rego, que já tutelava a educação no mandato anterior, durante o qual se iniciou a externalização do serviço de contratação. Então, a lei, como explica o TC, “admitia” que assim fosse, mas o processo gerou contestação. Os professores denunciaram a perda de mais de um terço do seu rendimento mensal face ao que ganhariam no quadro contratual anterior.

Apesar de o programa do concurso estabelecer que o contrato, celebrado a 8 de Agosto, não produziria efeitos antes do visto do Tribunal de Contas, o site do município na internet ainda refere que foi a Know  How  quem geriu o processo de candidaturas de docentes para as AEC. Esse prazo decorreu entre 18 e 31 de Agosto de 2014, as propostas tinham de ser encaminhadas para um email relacionado com a empresa, e os pedidos de informação eram remetidos para os contactos e uma morada em Lisboa.

A Know How já desempenhou estas mesmas tarefas na capital, num processo com algumas polémicas. A fundadora e directora da empresa, a escritora Maria João Lopo de Carvalho, era  assessora no Gabinete de Vereação da Educação e Acção Social do Município, quando a sua firma prestava o serviço e, em 2007, acusou a autarquia de lhe dever 120 mil euros, valor que depois acabou por receber. Na capital, entretanto, as entidades promotoras das AEC passaram a ser as Juntas de Freguesia ou os Agrupamentos de Escolas da cidade.

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