Portugal tem dois meses para remover resíduos tóxicos das minas de S. Pedro da Cova

Adjudicação da remoção foi travada por duas providências cautelares de concorrentes preteridos no concurso público. LNEC comprovou que os resíduos em causa são muito perigosos

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Resíduos muito perigosos foram depositados nas minas de carvão desactivadas Adriano Miranda

A Comissão Europeia deu dois meses ao Governo português para limpar as “elevadas quantidades” de resíduos tóxicos depositados nas minas desactivadas de S. Pedro da Cova, em Gondomar, distrito do Porto. Caso não cumpra, Portugal poderá ter de responder perante o Tribunal de Justiça Europeu.

“Entre 2001 e 2002, cerca de 320 mil toneladas de resíduos tóxicos provenientes das anteriores instalações da Siderurgia Nacional do Porto [na Maia] foram depositadas nas minas [de carvão, já desactivadas, de S. Pedro da Cova, Gondomar], embora o local dispusesse de licença apenas para 97,5 toneladas de resíduos inertes”, escreve a Comissão Europeia numa nota de imprensa. Em consequência, as águas subterrâneas locais ficaram impróprias para consumo humano.

Bruxelas reconhece que Portugal assumiu o problema e “adoptou um programa de recuperação”. Mas, “apesar de uma anterior notificação para cumprimento e de um diálogo regular com as autoridades portuguesas, a Comissão está preocupada com a lentidão da operação de limpeza, que ainda não teve início”.

O processo não começou porque está em tribunal. Em Julho deste ano, a então ministra do Ambiente, Assunção Cristas (agora ministra da Agricultura e do Mar), adjudicou o concurso público internacional (lançado em Dezembro de 2012) para a remoção dos resíduos à empresa Ecodeal – Gestão Integral de Resíduos Industriais, por 9,9 milhões de euros, acrescidos de IVA e de taxa de gestão de resíduos.  

No entanto, a operação foi travada por duas providências cautelares que contestam a adjudicação. Segundo a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), as providências cautelares foram apresentadas por duas das 14 empresas que se apresentaram a concurso: a Semural – Waste&Energy, SA; e a ABB – Alexandre Barbosa Borges, SA.

O início da remoção dos resíduos – considerados altamente perigosos, com teores muito elevados de chumbo, cádmio, arsénio e zinco – está agora dependente da decisão do tribunal.

A Comissão Europeia avisa, porém, que, “se Portugal não agir no prazo de dois meses, a questão pode ser submetida à apreciação do Tribunal de Justiça da União Europeia”.

A CCDRN tem vindo a precisar que a quantidade de resíduos em causa – que foram objecto de levantamento e análise por parte do LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil), que concluiu pela sua alta periculosidade, com teores elevadíssimos de chumbo, cádmio, crómio, arsénio e zinco – é de 88 mil toneladas, e não de 320 mil toneladas. Em comunicado de 13 de Outubro deste ano, a CCDRN também informou que "aguarda o desfecho do processo judicial" aberto pelos dois concorrentes preteridos no concurso público, "esperando que a disputa judicial não trave, por muito tempo, a urgente operação de remoção (...) de resíduos perigosos, com uma duração estimada em nove meses, nem a viabilidade do financiamento comunitário aprovado no QREN para a sua execução, em Julho de 2012, a uma taxa de 85%".

Contactado pelo PÚBLICO, o presidente da União de Freguesias de Fânzeres e S. Pedro da Cova, Daniel Vieira, que há vários anos – então como presidente da Junta de S. Pedro da Cova – vem lutando pela remoção dos resíduos, disse esperar que esta intrervenção da Comissão Europeia venha a apressar o processo. O autarca da CDU ressalvou que tem consciência de que o caso se encontra nos tribunais, que se deve "deixar à justiça o que é da justiça e à política o que é da política", e que não está habilitado, do ponto de vista jurídico, a apontar a solução para o problema. Mas insistiu que alguma coisa terá de ser feita, "alguma cláusula terá de ser accionada", para pôr cobro a uma situação que considera ser "de emergência", por representar um risco comprovado para a saúde das populações: "Há gente a consumir água dos poços e produtos agrícolas dos campos da zona", alertou. "E se o processo se arrastar durante anos na justiça? Há-de haver uma solução..."
 

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