Antigo presidente da Junta da Maia exige em tribunal à nova junta 260 mil euros

Ex-autarca diz que grande parte do valor se refere a empréstimos pessoais que fez à junta, quando ainda era presidente, e dos quais não foi ressarcido.

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Uma parte importante do dinheiro que o autarca diz que a junta lhe deve tem a ver com o zoo da Maia Paulo Pimenta

O ex-presidente da Junta de Freguesia da Maia, Carlos Teixeira, avançou com um processo em tribunal contra a actual Junta de Freguesia da Cidade da Maia exigindo o pagamento de mais de 260 mil euros. Grande parte deste valor diz respeito, alega, a empréstimos que realizou, a título pessoal, à junta quando ainda era autarca, para a realização de obras no Jardim Zoológico da Maia. A junta contesta a acção e diz que é Carlos Teixeira quem deve à junta, pelo menos, 278 mil euros, referentes a verbas de que o ex-autarca se terá apropriado indevidamente.

O processo está no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TFAP) e contempla a assunção, por parte do ex-autarca, de várias irregularidades. Carlos Teixeira alega na acção, a que o PÚBLICO teve acesso, que confrontado, em 2012, com a necessidade de fazer obras urgentes no Jardim Zoológico da Maia, para evitar a ameaça de encerramento por falta de licenciamento, e sem outros meios de financiamento no imediato – apesar de haver, segundo diz, uma promessa de candidatura a fundos comunitários por parte da Câmara da Maia –, avançou com “empréstimos pessoais” à junta.

O processo, explica-se no documento, era o mesmo que fora seguido pelo então autarca em outras ocasiões – Carlos Teixeira emprestava dinheiro à junta em situações de fragilidade da tesouraria, os serviços entregavam-lhe um cheque no mesmo valor do empréstimo, sem data, que este descontava apenas quando havia dinheiro em caixa.

A situação alterou-se nas últimas eleições autárquicas, quando Carlos Teixeira, que presidia à junta desde 1982, foi substituído por Olga Freire na presidência da nova junta, resultante da união das freguesias da Maia, Vermoim e Gueifães. Nessa altura, alega o ex-autarca na acção que corre no TAFP, os empréstimos que fizera à junta, por força das obras do Zoo, e que ainda não tinham sido reembolsados, ascendiam a quase 190 mil euros. Foi então que, descreve-se na acção, se realizou uma reunião na Câmara da Maia, em que este diz ter sido “pressionado pelo Sr. Presidente da Câmara [Bragança Fernandes], vice-presidente [Silva Tiago] e (…) Olga Freire, a devolver” os cheques, o que – refere – “fez convencido que tais valores lhe iriam ser pagos”. O PÚBLICO questionou a Câmara da Maia sobre este encontro, mas o assessor de imprensa da autarquia afirmou que não iria fazer comentários, por o processo estar ainda em tribunal, “aguardando-se a resolução do mesmo”.

Foi a ausência de pagamento daqueles cheques que terá levado Carlos Teixeira a avançar para tribunal, reclamando, além de 190.600 euros, relativos ao alegado empréstimo e a 4800 euros de um cheque depositado para “saldar o descoberto” de uma conta da junta, mais cerca de 69.500 euros relativos a uma compensação a que teria direito por ser presidente da junta de uma freguesia com mais de 10 mil eleitores. A soma destas parcelas é que totaliza os 260 mil euros que Carlos Teixeira reclama.

A Junta de Freguesia da Cidade da Maia já contestou a acção, manifestando o seu “mais veemente repúdio, estupefacção e incredibilidade com a actuação” de Carlos Teixeira. Defendendo que a gestão do ex-autarca do PSD “mais do que amadora, foi ilegal”, a nova junta social-democrata alega que foram “desviadas verbas provenientes da receita de bilheteira [do Zoo] para o património” de Carlos Teixeira, e que foram feitos depósitos da junta em contas bancárias do ex-autarca que provam que este deve à freguesia, pelo menos 278 mil euros – valor que poderá crescer, avisa-se na contestação, quando estiver concluída uma auditoria em curso à gestão da autarquia.

Carlos Teixeira assume, na resposta à contestação da Junta, que havia duas contabilidades relativas ao Jardim Zoológica. A verdadeira, que ficava na junta e uma falsa, que era enviada para o Tribunal de Contas. “Com efeito, segundo apuraram, se a receita ultrapassasse um determinado valor, a Ré [Junta] era obrigada a ter outro tipo de contabilidade mais onerosa e mais complicada e até poderia perder determinados benefícios. Assim e como era do conhecimento de todos os membros da Junta, as folhas com as receitas que eram enviadas para o Tribunal de Contas, eram acertadas” com outros funcionários da autarquia, refere-se na acção. O ex-autarca defende, por isso, que “não é por esses mapas, que não correspondem à verdade, que se deve apurar a receita”, mas sim pelas “folhas da caixa do Zoo” que provam, segundo ele, que “ninguém ficou com qualquer quantia, por pequena que fosse”.

O autarca admite também que, desde 2010, confrontado com o facto de a Junta não se poder endividar junto do sector bancário, por força da Lei, abriu uma conta pessoal, na qual eram depositadas verbas destinadas à junta, que ele transferia, depois, para este organismo. Carlos Teixeira junta ao processo a lista dos cheques que provam a transferência destas verbas da sua conta para a conta da junta, e, na contestação, a junta agora presidida por Olga Freire admite que os depósitos “efectivamente existiram”, mas recusa “que os mesmos se tratassem de mútuos recebidos por esta do Autor [Teixeira]”, sendo “nomeadamente [verbas] provenientes da receita de bilheteira do Zoo que lhe foram pessoalmente entregues e que, ilicitamente, o Autor não depositou nas contas da Junta nem, tão pouco, registou na contabilidade da Junta”.

O TAFP deverá decidir quem tem razão.

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