O árbitro não ajudou? Pois não. A selecção muito menos

1. Concentrar a análise do jogo Alemanha-Portugal na actuação do árbitro sérvio Milorad Mazic é meio caminho para nova derrota. É não perceber o que se passou na Arena Fonte Nova. É esconder os erros próprios com acusações a terceiros. A única esperança é que as críticas de Paulo Bento à arbitragem não sejam mais do que uma estratégia de contenção de danos psicológicos nos jogadores, que certamente terão saído do relvado envergonhados com tão fraca exibição. No lance do primeiro golo alemão, João Pereira toca em Götze. Pode questionar-se se o árbitro marcaria penálti se fosse na área alemã (é verdade que não marcou uma falta clara sobre Éder aos 75’), mas objectivamente há contacto. Até considero que a expulsão de Pepe é algo exagerada, mas em primeiro lugar deve criticar-se o jogador. Como é que um futebolista experiente (e com o historial de Pepe) arrisca tocar na cabeça do adversário?

2. Nesta estreia no Mundial 2014, a dependência da selecção em relação a Cristiano Ronaldo foi doentia. Ter um dos melhores jogadores do mundo pode (e deve) ser uma vantagem. É até natural que se peça que ele apareça nos momentos decisivos. O que não pode acontecer é que os colegas de equipa dêem razão às piadas que circulam na Internet, dizendo que a táctica de Portugal é passar a bola a Ronaldo e esperar que ele marque. Mas foi isso que pareceu quando Nani e Coentrão, em dois lances, se mostraram mais preocupados em passar a bola a Ronaldo do que em acertar na baliza alemã. Esta fixação em Ronaldo é ainda menos inteligente numa altura em que o jogador do Real Madrid está longe da sua melhor condição física.

3. Frente à Alemanha, Portugal perdeu mais do que um jogo. Perder três pontos frente aos germânicos, um dos grandes favoritos à vitória, até seria normal. Mas uma derrota por 4-0 é dolorosa do ponto de vista matemático, porque a diferença de golos nos jogos do grupo é o segundo critério de desempate, a seguir aos pontos. Ou seja, Portugal está obrigado a vencer os próximos dois jogos.

A goleada é igualmente dolorosa do ponto de vista emocional. Paulo Bento terá trabalho a dobrar na preparação para o jogo de domingo com os Estados Unidos, até porque a confiança é um factor preponderante em qualquer competição. Mais ainda numa prova curta como um Mundial.

Além do resultado, Portugal perdeu ainda três jogadores para o próximo jogo: Pepe (expulso) e Coentrão e Hugo Almeida (por lesão). O caso de Coentrão é claramente o mais grave, até porque não há outro do lateral-esquerdo de raiz na equipa, muito menos com intensidade do jogador do Real Madrid, que seria muito útil em jogos em que Portugal terá de atacar e marcar.

E como se não bastassem as lesões e castigos, Paulo Bento tem ainda de injectar ânimo e força num meio-campo que não funcionou, numa defesa (guarda-redes incluído) que acumulou falhas e num ataque perdulário, em que Nani foi o único jogador que mostrou alguma rotação.

4. Por muito que nos custe ver jogos do Mundial às onze da noite ou de madrugada, há que dizer que é um absurdo que algumas partidas no Brasil se realizem às 13h locais, de forma a serem transmitidos na Europa em horários decentes. Este comentário, porém, não deve servir de desculpa para a derrota portuguesa. Os jogadores de Paulo Bento pareceram cansados, como se o calor e a humidade os tivessem derretido. Já os alemães pareciam alfaces frescas. Em condições iguais para as duas equipas, a selecção portuguesa correu menos dez quilómetros (111,7 contra 101,9) do que a alemã, sendo obviamente prejudicada pela expulsão de Pepe. Mas mais do que correr menos, a selecção portuguesa correu pior (e jogou pior) do que o adversário.

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