Cumprir Portugal: a capacidade no sector da energia oceânica

Há que promover políticas que apostem no crescimento sustentável.

Mas, tal como noutras situações, dispor do ativo não chega. Há que promover as condições para o desenvolvimento e potenciação do mesmo, mediante políticas que apostem no crescimento sustentável, inteligente e que tenham em conta as possibilidades de interação entre os diversos usos e atividades. 

No âmbito do Programa-Quadro de Investigação & Inovação da União Europeia (UE) “Horizonte 2020”, foi apresentado, no início deste ano, pela Comissão Europeia (CE) o seu plano de ação estratégico “Crescimento Azul” para 2020, com o intuito de apoiar e promover o crescimento e aproveitamento sustentável da energia oceânica renovável nos mares e oceanos europeus. O litoral atlântico é, precisamente, identificado como aquele que oferece maiores potencialidades de exploração da fonte de energia oceânica, ocupando Portugal um papel de destaque. O plano Crescimento Azul identifica como atividades com potencial de intervenção estratégica, a energia dos oceanos, a aquicultura, o turismo costeiro, a exploração mineira dos fundos marinhos e a biotecnologia marinha. Sendo a nossa posição privilegiada e dispondo da capacidade para nos movermos na maioria das referidas atividades, o que é que nos faz falta para concretizar a nossa vocação? 

Recentemente foi apresentada a Estratégia Nacional para o Mar 2013-2020, que integra o plano de ação interno, o Plano Mar-Portugal (PMP), e pretende valorizar em termos económicos, sociais e ambientais o espaço marítimo português com a execução, não só de novos projetos sectoriais e intersectoriais como dos planos estratégicos já existentes ou em fase pré-comercial. Entretanto, foram também definidas as bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional, que visam assegurar uma exploração económica sustentável racional e eficiente dos recursos marinhos e dos serviços dos ecossistemas, garantindo a compatibilidade e sustentabilidade dos diversos usos e das atividades desenvolvidas no espaço marítimo. 

O paradigma alterou-se e não podemos continuar de costas viradas para o mar, continuadamente ignorando as potencialidades do nosso país e adiando a remoção dos obstáculos e dificuldades já identificados, sobretudo aqueles em que de facto, temos o poder e a capacidade de os remover. O investimento na energia oceânica permite não só fomentar o crescimento económico e a inovação como criar postos de trabalho qualificados nas zonas costeiras europeias, como é o caso português, contribuindo para alcançar os objetivos da Estratégia Europa 2020. Enquanto fonte renovável, a energia dos oceanos representa um contributo fundamental para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis para a produção elétrica, potenciando a descarbonização e a maior segurança do abastecimento energético europeu, em linha com os objetivos definidos no pacote clima-energia a curto e longo prazo. Sendo ainda difícil competir em termos de investimento com outros países a nível europeu e mundial e atendendo à crescente dependência energética de Portugal, considero que o caminho a seguir, em linha com os objetivos propostos nos programas de ação do PMP, partirá da aposta na capacitação da investigação tecnológica e científica no setor da designada energia azul, no incremento da produção de energias renováveis offshore e da instalação de novos projetos comerciais nacionais e internacionais na zona-piloto, à qual deverá corresponder a promoção de uma mão-de-obra mais qualificada que consiga dar resposta à complexidade técnica que caracteriza este sector e a sua tecnologia.

Apesar do caminho feito, é certo que será necessário ter um quadro legislativo completo no sentido de serem devidamente esclarecidas as funções e atribuições dos vários intervenientes, facilitando a desburocratização administrativa e promovendo uma efetiva e melhor coordenação das ações públicas e privadas. A regulamentação sobre o regime de utilização do espaço marítimo nacional, assim como o regime económico e financeiro aplicável deve ser concretizado com maior brevidade possível, tornando este sector competitivo e atrativo, capaz de gerar empreendedorismo e a fixação de investimento.

Já sabemos que os altos custos tecnológicos em parte associado à evolução lenta da tecnologia, a deficiente infraestrutura da rede de transporte de eletricidade marítima e fronteiriça e os problemas relacionados com a ligação à rede nacional e ao mercado europeu, são questões essenciais que têm de ser ultrapassadas sob pena de comprometermos o nosso potencial de integração de eletricidade. Todavia, existem aspetos que podem incentivar o tão desejado empreendedorismo no sector da energia oceânica, designadamente, o reforço da produção de energia marinha nas infraestruturas portuárias (com vista à redução de custos), a identificação de sectores de indústria especializada e nichos de atividade com maior potencial que possam ser fomentados ou revitalizados tornando-os competitivos, criação de sinergias entre os diversos usos e atividades (eólica offshore, ondas, pesca e aquacultura), o reforço das infraestruturas de teste de protótipos, a promoção da inovação e a investigação (articulação entre a indústria e as universidades) bem como a formação especializada no nosso país, no âmbito do sector.

Seguramente que muitas sugestões existem, mas é inegável que o nosso ativo está praticamente em bruto e com um potencial intrínseco substancial. Temos de ser capazes de implementar medidas estruturadas que possam estimular o desenvolvimento e estabelecer uma exploração sustentável e competitiva deste nosso recurso e que nos posicionem de forma relevante, no contexto da energia oceânica mundial.

Sócia responsável pela área de Ambiente e Energia da PBBR – Sociedade de Advogados

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