Covid-19: AstraZeneca retira do mercado vacina Vaxzevria por razões comerciais

A infecciologista Margarida Tavares sublinha importância da vacina, uma das primeiras contra a covid-19, e entende retirada do mercado como uma decisão puramente comercial, que não lhe retira valor.

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A vacina foi uma das primeiras a ser comercializadas durante a pandemia YVES HERMAN / REUTERS
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A gigante farmacêutica britânica AstraZeneca retirou nesta quarta-feira do mercado, por razões comerciais, a sua vacina contra a covid-19 Vaxzevria, uma das primeiras a ser comercializadas durante a pandemia. Ao PÚBLICO, a médica infecciologista e ex-secretária de Estado de Promoção da Saúde Margarida Tavares defende que se trata de uma decisão comercial, “que em nada retira o valor desta vacina”. Em Portugal, de acordo com o Infarmed, não existe stock destas vacinas disponível desde o final de Junho de 2022.

“Dado que foram desenvolvidas múltiplas vacinas contra a covid-19, há um excedente de vacinas actualizadasface às diferentes variantes do vírus, o que resultou numa diminuição da procura, justificou a farmacêutica, em comunicado.

O anúncio de que a vacina deixaria de ser comercializada a partir desta quarta-feira tinha sido feito no início da semana pela farmacêutica.

A Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde - Infarmed, em resposta escrita enviada ao PÚBLICO, confirma que, a 27 de Março, a Comissão Europeia aceitou um pedido de revogação da Autorização de Introdução no Mercado submetido pela empresa titular AstraZeneca.

No final de Abril, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA, sigla em inglês) recomendou a actualização das vacinas contra a covid-19 para a campanha de vacinação de 2024/2025, para proteger contra a nova variante do vírus SARS-CoV-2, a JN.1. “A JN.1 difere da família XBB visada pelas anteriores vacinas actualizadas e ultrapassou agora as variantes XBB para se tornar a variante de maior circulação em todo o mundo”, salienta a farmacêutica.

As empresas que estão actualmente a desenvolver novas vacinas contra a covid-19 que não visam a JN.1 foram também incentivadas a contactar a EMA para discutir estratégias para alterar a composição das suas vacinas.

“Visto que a vacina não tem sido prescrita, a farmacêutica entendeu, e provavelmente é muito aceitável esse entendimento, que não valeria a pena estar a fazer a actualização da vacina para esta nova variante dado que, independentemente desta sua actualização ou não, ela não está a ser prescrita de forma significativa para manter a produção”, desenvolve Margarida Tavares.

Em Fevereiro de 2021, Portugal desaconselhou a administração da vacina da AstraZeneca a maiores de 65 anos. Alguns meses mais tarde, em Abril, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) viria a recomendá-la só a maiores de 60 anos. A decisão surgiu depois de a Agência Europeia de Medicamentos ter admitido a existência de uma ligação entre esta vacina e casos raros de tromboembolismo associado a baixa acentuada de plaquetas. Foi pelo “princípio da precaução” que as autoridades de saúde portuguesas decidiram fazê-lo, suspendendo assim a imunização da população mais jovem com esta vacina.

Apesar deste caminho, Margarida Tavares não deixa de sublinhar a importância que a vacina contra a covid-19 Vaxzevria teve: “O passado é muito importante. A AstraZeneca foi uma das primeiras – e isso é mesmo muito importante – a poder proteger as pessoas contra a covid-19 e tinha elevadíssima eficácia e efectividade.”

Efeitos secundários raros

Questionada sobre os relatos de casos de efeitos secundários associados a esta vacina, a ex-secretária de Estado frisa a segurança que sempre foi demonstrada pelo fármaco em diversos estudos. “Aquilo que fez com que a vacina fosse preterida são efeitos muito raros”, a saber, casos de tromboembolismo associado a baixa acentuada de plaquetas.

Remetendo para os estudos científicos existentes e para o próprio reporte da EMA, Margarida Tavares refere que os dados disponíveis dão conta de que, até Maio de 2023, se registaram cerca de 900 casos de síndromes de trombose associados à baixa de plaquetas. “E destes 900, reduzem-se para 200 os casos que se associaram a um resultado fatal. Isto é muito pouco para a imensidão de pessoas que foi vacinada.”

Posto isto, a epidemiologista do Hospital de São João, no Porto, entende que o facto de as vacinas contra a covid-19 terem surgido tão rapidamente trouxe consigo “alguma insegurança e receio”, que são, todavia, “totalmente infundados”. “As vacinas são altamente seguras e eficazes e protegem as pessoas de doença grave, hospitalização e morte”, remata.

Já o Infarmed sublinha que estes acontecimentos não podem ser considerados relacionados com a vacina contra a covid-19 apenas porque foram notificados de forma espontânea ao Sistema Nacional de Farmacovigilância. Segundo esta autoridade do medicamento, até esta terça-feira, o número total de casos de reacções adversas a medicamentos (RAM) notificados relativos a esta vacina foi de 9852. Assim sendo, o número de casos de RAM/ 1000 vacinas administradas corresponderá a uma incidência de 4,4 casos de RAM / 1000 vacinas administradas”, afirma a autoridade do medicamento.

De acordo com os dados enviados ao PÚBLICO, destes quase dez mil relatos de reacções adversas à vacina, o critério de gravidade que foi atribuído ao caso no momento da notificação, pelo notificador, distribui-se da seguinte forma: 32 casos de morte; 94 de risco de vida; 218 de hospitalização; 443 de incapacidade; 1089 casos clinicamente importantes; e 7976 casos não graves.

Na grande maioria dos casos notificados em que há informação sobre história clínica e medicação concomitante, um resultado adverso fatal pode ser explicado pelos antecedentes clínicos do doente e/ou outros tratamentos, sendo as causas de morte diversas e sem apresentação de um padrão homogéneo. A vacinação contra a covid-19 não reduz as mortes provocadas por outras causas, problemas de saúde não relacionados com a administração de uma vacina, pelo que durante as campanhas de vacinação é expectável que as mortes por outras causas continuem a ocorrer, por vezes em estreita associação temporal com a vacinação, e sem que necessariamente haja qualquer relação com a vacinação”, frisa o Infarmed.

Notícia actualizada às 19h 52 do dia 8 de Maio de 2024 com informações recolhidas junto do Infarmed

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