Para resolver o problema da habitação, é preciso coragem política!

Desejamos que o Ministério da Habitação, na pessoa da nova ministra, Marina Gonçalves, compreenda que são necessárias mudanças, a sério.

Já assistimos antes à “promoção” da Habitação, quando passou da dependência direta do Ministério do Ambiente para uma Secretaria de Estado com nome próprio. E vimos o pouco resultado que isso teve, em termos de melhoria do estado da política da habitação. Nestes anos, desde 2018 até agora, a habitação tornou-se ainda mais inacessível: subiram as rendas e os preços de venda de casas, há menos casas disponíveis para habitação, aceder à habitação tornou-se um calvário em quase todo o território, a menos que se tenha muito dinheiro.

Se a separação da Habitação das Infraestruturas significasse maior prioridade à resolução da enorme crise nacional que se alastra na habitação, seria positivo. No entanto, nada nos leva a crer que seja o caso. A crise da habitação está associada a políticas específicas promovidas por este Governo (e anteriores) que assentam num triste modelo de desenvolvimento para o país, baseado na especulação, na subida permanente dos preços do imobiliário para manter o balanço positivo das instituições financeiras, ou em nome da atração do investimento estrangeiro.

Dar prioridade à resolução efetiva do problema da habitação em Portugal teria de resultar numa inversão desse conjunto de políticas que, na verdade, não está, em boa parte, no Ministério da Habitação. Falamos de políticas que continuam a ser decididas no Ministério da Economia ou nas Finanças: a política de "vistos gold" (que se mantém em todo o território, ao contrário do que foi anunciado pelo Governo), a política de atração de residentes não habituais e nómadas digitais com rendimentos muito elevados, as isenções fiscais aos fundos e empresas de investimento imobiliário que só constroem casas de luxo, os fortes incentivos à transformação da habitação em alojamentos turísticos, etc. Estas (entre outras) são as políticas que mantêm a especulação e os preços proibitivos a que chegámos em Portugal e que impedem o acesso à habitação adequada ou obrigam a taxas de esforço elevadíssimas às famílias que vivem e trabalham em Portugal, empobrecendo-as e tornando a sociedade cada vez mais desigual.

Mas há políticas que o Ministério da Habitação poderia promover diretamente desde já e que trariam uma mudança efetiva: desde logo regular o mercado de arrendamento, com uma nova lei das rendas que previsse uma regulação que controlasse e baixasse as rendas e desse uma real estabilidade aos contratos, promovendo igualmente o impedimento de despejos quando não há alternativas de habitação adequadas e penalizando efetivamente as casas vazias.

Como já foi dito por inúmeros atores, da academia ao mundo associativo e político, não chega o PRR e o desenvolvimento tardio, apressado e muito insuficiente de habitação social ou acessível que tem sido durante anos a bandeira do Governo. Bandeira discursiva, pois as metas estão muito longe de ser cumpridas e a situação da habitação continua a deteriorar-se.

Desejamos que o Ministério da Habitação, na pessoa da nova ministra, Marina Gonçalves, compreenda que uma política de habitação que garanta esse direito a todas as pessoas passa por ter a coragem e a força política para enfrentar os interesses imobiliários e financeiros que hoje adquiriram demasiado poder e dominam a habitação e o imobiliário e opor-se às políticas de promoção de preços altos e da especulação. Tornar a habitação na prioridade nacional que o Governo diz ser implicará uma mudança radical.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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