Terão as passadeiras rolantes magnéticas pés para andar?
Tecnologia do comboio magnético Transrapid foi adaptada a uma passadeira rolante, que pode atingir mais de dez quilómetros por hora. No futuro, poderemos chegar mais depressa às estações de metro ou aos terminais nos aeroportos.
Pode uma passadeira rolante acelerar e desacelerar mantendo, ao mesmo tempo, uma velocidade constante? A resposta é não, mas a empresa alemã ThyssenKrupp apresentou uma passadeira inovadora na qual as pessoas entram à velocidade de 2,3 quilómetros por hora, que acelera geralmente até aos 7,2 quilómetros por hora e que reduz para os mesmos 2,3 quilómetros por hora quando se aproxima da saída.
O PÚBLICO experimentou este tapete magnético e constatou que o aumento de velocidade é notório quando, mesmo parado, se começa a sentir uma brisa no rosto. Se se andar sobre a passadeira, então a caminhada parece vertiginosa porque a paisagem ao lado desfila rapidamente. Quase sem se dar por isso, anda-se a uma velocidade entre dez a 12 quilómetros por hora, que é o dobro da marcha humana.
“Isto é magia”, dizem, sorrindo, os engenheiros da ThyssenKrupp, antes de explicar como é que se consegue ter diferentes velocidades numa passadeira rolante que, obviamente, só pode ter uma velocidade constante. O segredo está nas placas de alumínio de grande dimensão que constituem este tapete e que se sobrepõem, alargando ou reduzindo o seu tamanho, no momento de entrar ou sair na passadeira.
É isto que explica outra sensação ao circular no novo invento: o “chão” a esticar e a encolher debaixo dos pés quando se inicia e se termina a viagem. Nada, porém, que perturbe o equilíbrio do utilizador.
Isto só é possível porque, em vez do sistema mecânico das passadeiras rolantes actuais, o Accel – como se designa este novo produto da multinacional alemã – move-se através de motores de levitação magnética instalados em cada placa. Cada 100 metros de percurso têm 285 pequenos motores instalados, que asseguram o funcionamento da passadeira.
Ideia inovadora
Desde os anos 1960 que é conhecida a tecnologia da levitação magnética. Alemães por um lado, japoneses por outro, tentaram aplicá-la a um comboio de alta velocidade que poderia circular a velocidades superiores a 400 quilómetros por hora. E, assim, na década de 1990, foi inventado o comboio magnético: o Transrapid, na Alemanha, e o Maglev, no Japão, mas sem grande aplicação comercial.
Estes comboios funcionam com os chamados “motores eléctricos lineares”, constituídos por ímanes, ou magnetos, sendo desta forma impulsionados pelas forças atractivas e repulsivas do magnetismo. Mas os primórdios desta tecnologia são muito mais antigos e remontam ao trabalho sobre os motores eléctricos lineares de Charles Wheatstone, na década de 1840, no King's College de Londres, ainda que na altura fossem muito pouco eficientes.
A primeira tentativa de aplicar um motor eléctrico linear a uma máquina real aconteceu nos anos 1950 em Inglaterra, quando Eric Laithwaite tentou fazê-lo funcionar em teares eléctricos. A experiência resultou suficientemente bem para que o Imperial College de Londres então o designasse como o motor das máquinas eléctricas do futuro.
Mas a verdade é que esse futuro tardou em chegar. Foi preciso esperar pela invenção dos comboios de levitação magnética. No fim do século XX, a agência espacial norte-americana NASA também se interessou por esta tecnologia para criar rampas de lançamento de veículos para o espaço. Uma pista de 1,5 quilómetros de comprimento dotada com motores lineares permitiria acelerar um veículo a quase 1000 quilómetros por hora em 9,5 segundos, lançando-o para o espaço. A economia em termos de combustível seria óbvia, mas a ideia nunca avançou.
Em Emsland (Hamburgo), na Alemanha, um consórcio que inclui a ThyssenKrupp e a Siemens, entre outras empresas, possui uma pista de ensaios de 31,5 quilómetros na qual um comboio Transrapid circula a 400 quilómetros por hora.
Embora na China já exista um comboio destes a ligar o aeroporto de Xangai ao centro da cidade, esta tecnologia não logrou um grande sucesso comercial. O TGV e os outros comboios de alta velocidade, circulando sobre carris, acabaram por levar a melhor sobre este sempre adiado “comboio do futuro”.
Até que a ThyssenKrupp teve uma ideia diferente: a aplicação do conceito de levitação magnética às passadeiras rolantes. Enquanto há anos todos julgavam que o caminho lógico era o Transrapid, uma ideia inovadora posicionou esta tecnologia numa outra direcção.
Da ideia à prática demorou-se 20 meses de trabalho no centro de investigação que a empresa possui em Gijón (Astúrias, Espanha) e onde o invento foi apresentado ao mundo no final de Outubro, durante uma sessão que reuniu jornalistas e potenciais clientes dos quatro continentes.
A empresa fez o trabalho de casa. Encomendou um estudo que prova que a atracção das estações de metro se esgota nos 500 metros e que a partir dessa distância as pessoas têm tendência a optar por outros modos de transporte (normalmente o carro ou o autocarro), apesar de com isso contribuírem para o congestionamento urbano.
O Accel aparece assim como uma forma de aumentar a proximidade às estações de metro, pois é possível construir corredores de 500 ou 1000 metros em que as pessoas “podem tranquilamente deslocar-se, estando paradas, a 7,2 quilómetros por hora, lendo as suas mensagens no telemóvel, ou, se estiverem com pressa, caminhando a dez ou mais quilómetros por hora”, conforme disse Andreas Schierenbeck, presidente mundial da ThyssenKrupp.
Esta inovação pode também ser aplicada para ligar linhas e estações de metro, evitando os longos percursos por entre os corredores subterrâneos. Mas terá sobretudo grande aplicabilidade nos aeroportos. Aliás, não foi inocente a escolha de um actor asiático no vídeo de apresentação do produto que a Thyssen mostrou em Gijón. Os maiores aeroportos do mundo, com terminais que distam três quilómetros uns dos outros, estão a Oriente.
A comercialização começa agora. E ditará o sucesso desta inovação. Tem havido várias tentativas de instalar passadeiras rolantes magnéticas, com diferentes velocidades. Mas não têm tido sucesso, devido a problemas técnicos e de segurança.
Por exemplo, uma passadeira que se movia a grande velocidade na estação de metro de Montparnasse, em Paris, foi obrigada a parar em 2009, devido a ferimentos que provocava e problemas de funcionamento, relata o jornal britânico “Financial Times”. Inicialmente, deslocava-se a 12 quilómetros por hora, depois, antes da paragem, a sua velocidade ainda chegou a ser reduzida para nove quilómetros por hora, porque os passageiros estavam sempre a cair. A única passadeira destas em funcionamento está agora no aeroporto internacional de Toronto, no Canadá, e a sua velocidade máxima não ultrapassa os sete quilómetros por hora. Instalada lá em 2007 pela ThyssenKrupp, a empresa garante que os seus engenheiros aumentaram a segurança das passadeiras rolantes magnéticas.
Questionado sobre o preço deste novo produto, Ramon Sotomayor, presidente da ThyssenKrupp Espanha, foi claro: “Isto está entre uma passadeira rolante e um transporte automatizado, por isso o seu preço também é intermédio e terá de ser estudado caso a caso.”
A tecnologia dos motores lineares, desde que deixou de ser vista como só aplicável aos comboios de alta velocidade, tem agora em aberto novos caminhos. A Thyssen é conhecida pelos elevadores e, no futuro, estes poderão levitar em vez de serem içados por cabos. E nada impede que os ascensores venham a poder deslocar-se na vertical e na horizontal viajando dentro dos edifícios. Algo que poderá mudar a maneira como os prédios (sobretudo os arranha-céus) podem vir a ser construídos no futuro.
O PÚBLICO viajou a convite da ThyssenKrupp