A consagração de um “soft power” em risco de asfixia

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No seu conjunto, os europeus são os maiores contribuintes na ajuda ao desenvolvimento Vincent Kessler/Reuters

O prémio Nobel da Paz consagra o “soft power”, a “diplomacia de influência” da União Europeia, muito empenhada na promoção da democracia e na ajuda ao desenvolvimento, apesar da fraca visibilidade e de uma tentação para avanços e recuos constantes.

O Comité Nobel quis recompensar “a mais importante conquista da UE: o seu combate coroado de sucesso a favor da paz e da reconciliação, da democracia e dos direitos humanos”.

O comité cita, em particular, a política de alargamento da UE que, desde a década de 1980, conseguiu integrar, em troca de reformas democráticas, países saídos da ditadura como a Grécia, Espanha e Portugal. Foram seguidos por ex-países comunistas da Europa Central e de Leste, a que se juntará no próximo ano a Croácia. Mesmo a simples perspectiva de adesão contribuiu para reforçar a reconciliação nos Balcãs ou a democracia na Turquia, acrescenta ainda o comité.

A Turquia é um “bom exemplo” desta influência positiva, confirma Katinka Barysch, investigadora do Centro para a Reforma Europeia em Londres. “O país transformou-se: aboliu a pena de morte e fez grandes reformas, em particular quando foi incentivado pela abertura das negociações” para a adesão, em 2004, explica. Nestes últimos anos, porém, diz Barysch, “as negociações estão em ponto morto e o país recua”

Na ex-Jugoslávia, devastada por conflitos étnicos na década de 1990, a EU contribuiu para a estabilização do Kosovo com a missão de polícia e justiça Eulex. Recompensou o diálogo entre sérvios e kosovares em concedendo à Sérvia o estatuto de candidato e iniciou negociações com o Montenegro. Mas as tensões na região continuam elevadas e a Macedónia não consegue iniciar as negociações para a adesão por falta de acordo com a Grécia a propósito do nome do país.

Este prémio é “um reconhecimento da essencial do próprio alargamento: ultrapassar divisões, transformar e estabilizar”, comentou o comissário europeu responsável pela pasta, Stefan Füle.

Cansaço europeia

A nível mundial, os Vinte e Sete continuam a ser de longe, apesar da diminuição dos orçamentos, os primeiros contribuintes na ajuda ao desenvolvimento, com 53 mil milhões de euros em 2011, ou seja, 56% do total mundial, contra 20% dos EUA. A UE tenta promover a boa governação, mas também a saúde e a educação, em particular em países menos estáveis como o Afeganistão, o Sudão ou a República Democrática do Congo.

Os europeus desenvolvem igualmente missões de “prevenção de conflitos”, enviando militares e civis para o Corno de África ou o Sahel. A UE ocupa também o primeiro lugar no envio de ajuda humanitária de emergência, seja nos casos de catástrofes naturais ou na resposta a conflitos como o que devasta a Síria.

Mas o prémio Nobel foi atribuído num momento em que se assiste a um certo cansaço na opinião pública em relação ao alargamento e em que a Europa está um tanto enredada com os seus problemas internos, o maior de todos a crise financeira e económica.

“Sentimos que está menos presente, menos acutilante fora das suas fronteiras. Ora, a UE tem um certo saber a exportar, sobretudo na prevenção de conflitos. Deve ter, por isso, a vontade de reforçar a coesão em matéria de política externa”, disse Louise Arbour, antiga alta comissária das Nações Unidas para os direitos humanos e presidente do International Crisis Group em Bruxelas.

À frente do Serviço diplomáticos europeu, Catherine Ashton tem tido altos e baixos. Representa as grandes potências nas difíceis negociações com o Irão sobre o seu programa nuclear controverso. Mas a britânica tem sido muitas vezes criticada pela falta de iniciativa e pela incapacidade em ultrapassar as divisões entre os Vinte e Sete sobre os grandes temas da política internacional, como é o caso do Médio Oriente.

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