Nuno Lacasta diz que impostos e valor das concessões da EDP não passaram pela APA

“Cada macaco no seu galho”, diz o presidente da APA, defendendo que o Estado está “mais bem protegido” com as adendas feitas às concessões das barragens vendidas à Engie e que não tinha de se pronunciar sobre o seu valor e o pagamento de impostos. Em 11 meses, a análise à valorização das concessões nunca chegou a ser feita.

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A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) é presidida por Nuno Lacasta Sergio Azenha

O presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), Nuno Lacasta, afirmou nesta quarta-feira no Parlamento que a APA salvaguardou de forma plena o interesse público” no negócio das barragens da EDP, e que as adendas que fez incluir nos contratos de concessão os tornaram “mais robustos”, deixando o Estado “mais bem protegido e defendido”.

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O presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), Nuno Lacasta, afirmou nesta quarta-feira no Parlamento que a APA salvaguardou de forma plena o interesse público” no negócio das barragens da EDP, e que as adendas que fez incluir nos contratos de concessão os tornaram “mais robustos”, deixando o Estado “mais bem protegido e defendido”.

Mas não se livrou das críticas dos vários quadrantes políticos, nem das acusações do PSD e do Bloco de Esquerda, de que deixou perguntas sem resposta ao final de duas horas de audição sobre o polémico negócio de 2,2 mil milhões de euros.

A APA exerce “funções exclusivamente técnicas” e “não faz política”, disse Lacasta aos deputados, frisando que as questões económico-financeiras (relacionadas com o valor das concessões) e as questões fiscais (como o pagamento do imposto do selo) nunca foram analisadas pela APA, porque não é essa a sua competência, nem tem conhecimentos para tal. “Cada macaco no seu galho”, afirmou.

Lembrando que a transmissão das concessões hídricas está prevista na lei, disse que aquilo que a agência fez foi salvaguardar o cumprimento dos aspectos sobre os quais tem competência legal: os procedimentos operacionais da gestão das barragens (como os caudais, gestão de comportas e segurança das barragens); as medidas ambientais relacionadas com as reposições de caminhos e a protecção da fauna, e a capacidade técnica e financeira da empresa que queria ficar com as concessões.

“Não facilitámos a vida a ninguém”, afirmou o presidente da APA, em resposta ao deputado do PSD Luís Leite Ramos, que afirmou que a entidade tutelada pelo ministro Matos Fernandes “esteve mais preocupada em facilitar a vida à EDP” do que em defender o interesse público.

Em sintonia à esquerda, Duarte Alves, do PCP, acusou a APA de ter feito “trabalho de consultoria para a EDP”, prolongando o processo de análise ao longo de 11 meses, em vez dos 30 dias que a lei prevê para a emissão de um parecer, até se “encontrar uma solução que tornasse aceitável a operação” pretendida pela eléctrica.

Foi um processo “muito complexo”, que exigiu a análise de muita informação e originou vários pedidos de informação às partes, justificou Nuno Lacasta aos deputados. A APA até foi questionar a multinacional francesa Engie sobre os recursos que iria aportar à operação em Portugal e ficou descansada sobre essa matéria.

A APA também “não tinha de se pronunciar” sobre as questões de natureza societária envolvendo a transacção – “a figura veículo existe na lei – e o que interessava era a capacidade de quem queria comprar.

Dúvidas “foram sendo dissipadas"

E sobre o parecer produzido em Junho do ano passado (antes da aprovação formal da operação, em Novembro), pela directora de recursos hídricos da APA, que considerava que a agência não estava em condições de autorizar a transmissão das concessões, por estar “em causa o interesse público” e a situação não ser “clara face aos processos judiciais, nacional e comunitário” em curso, aconselhando que se pedisse um parecer jurídico que avaliasse se ficaria “garantido o interesse público com a transmissão de cada uma destas concessões”, o presidente da APA disse que foi muito importante e que levantou questões “que foram sendo dissipadas”.

Além da investigação do Ministério Público aos contratos CMEC e ao prolongamento da concessão de 27 barragens sem concurso público, em 2008, por cerca de 700 milhões de euros, também há um contencioso comunitário relativamente a essa adjudicação directa à EDP.

Nas adendas feitas aos contratos, o Estado garante que, qualquer que seja o desfecho destes processos, a Engie não poderá exigir qualquer tipo de modificação ou reparação.

Ainda sobre a directora de recursos hídricos da APA, Felisbina Quadrado, Nuno Lacasta assegurou que essa responsável da APA (que entretanto foi reconduzida no cargo) participou no processo que contribuiu para a aprovação da transmissão, já no final de 2020.

“Participou, concordou e revê-se na decisão final tomada. E autorizou-me a dizê-lo hoje”, afirmou Nuno Lacasta, sem responder directamente à questão levantada pelo PSD e pelo Bloco de Esquerda sobre se há um parecer, ou qualquer outro documento assinado por esta responsável, expressando a sua concordância.

Nuno Lacasta também não respondeu directamente a várias questões colocadas pela deputada do Bloco Mariana Mortágua, que as repetiu mais duas vezes, acusando o presidente da APA de não responder a questões concretas, e insistir em “declarações abstractas sobre cumprimentos técnicos”.

Concessões não foram avaliadas

Mortágua quis saber se a APA chegou a saber qual foi o valor pelo qual a EDP vendeu cada uma das barragens e se teve acesso aos contratos de venda à Engie. Também procurou saber quais os elementos que permitiram à direcção de recursos hídricos da APA calcular que a avaliação das três barragens no Douro Internacional (das seis que foram vendidas) era de 1,7 mil milhões de euros.

Sabendo que o concedente (a APA) tem a possibilidade de examinar os pressupostos dos contratos de concessão de dez em dez anos, questionou se alguma vez a EDP foi notificada nesse sentido, e se alguma vez a EDP notificou formalmente o Estado para exercer o direito de preferência na transmissão das concessões, como a lei prevê.

Lacasta sublinhou que o Ministério das Finanças foi envolvido no processo e que a Parpública se pronunciou “sobre as condições contratuais da operação da alienação, nomeadamente de natureza financeira”. A holding que gere as participações empresariais do Estado “concluiu tratar-se de um negócio entre dois particulares e que não cabia ao Estado qualquer análise e/ou intervenção para além da que possa impactar com os contratos de concessão”.

A Parpública concluiu que as questões do valor das concessões “não poderiam ser englobadas” nesta análise, destacou o presidente da APA. “O que estava em cima da mesa é que se tratava de um concessionário com contratos de concessão válidos e o que estava em causa era a transmissão desses contratos nos termos da lei”, afirmou. “Não havia qualquer fundamento legal para impedir a transmissão. Fizemos uma due dilligence com todo o detalhe”, acrescentou.

A deputada do Bloco de Esquerda manifestou ainda a sua “perplexidade” pelo facto de aparentemente não haver nenhuma entidade no Estado com capacidade ou com competência para analisar o valor destas concessões que foram transmitidas à Engie. “Não há análise de equilíbrio económico-financeiro, mas o negócio faz-se na mesma. Não é uma explicação aceitável”, sublinhou a deputada.

As respostas de Nuno Lacasta também não satisfizeram o PSD. “A APA podia ter pedido um parecer jurídico sobre a valorização económica das concessões, e não o fez”, afirmou Luís Leite Ramos, dizendo que a agência “estava empenhada em criar condições para que o negócio se realizasse”.