Ana Gomes, uma derrota com futuro

A candidata perdeu a segunda volta e não teve uma votação muito significativa, mas ficou à frente de Ventura e teve mais votos do que Marisa Matias e João Ferreira juntos. Ana Gomes não afasta uma nova candidatura a Belém.

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"Até à próxima", disse Ana Gomes Rui Gaudêncio

Ana Gomes falhou o seu grande objectivo de disputar uma segunda volta com Marcelo Rebelo de Sousa, muito porque não conseguiu chamar o voto dos socialistas. E aqui também perdeu para António Costa, que, ainda que indirectamente, endossou o voto ao Presidente-candidato.

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Ana Gomes falhou o seu grande objectivo de disputar uma segunda volta com Marcelo Rebelo de Sousa, muito porque não conseguiu chamar o voto dos socialistas. E aqui também perdeu para António Costa, que, ainda que indirectamente, endossou o voto ao Presidente-candidato.

Mas, ainda que à tangente, ficou à frente de André Ventura e conseguiu mais votos do que o conjunto dos alcançados por Marisa Matias e João Ferreira – uma vitória também para o PAN e Livre, que apoiaram a candidata. E passou a ser a mulher mais votada numa eleição presidencial. E assim nasceu uma nova voz de peso no lado esquerdo da política portuguesa. Dentro e fora do PS. E que até não afasta uma nova candidatura a Belém.

Na eleição presidencial de 2016, o candidato Sampaio da Nóvoa, informalmente apoiado pelo PS, alcançou 921.871 votos (22,40% do total). Antes, nas presidenciais de 2011, sem o apoio dos socialistas, Manuel Alegre teve 832.637 votos (19,76%). Nas legislativas de 2019, o PS obteve 1.908.036 votos (36.34%). Na eleição deste domingo, sem o apoio do PS e com muitos socialistas a preferirem Marcelo, Ana Gomes conseguiu 541.345 votos (12,97%).

Mas os números também mostram uma das principais derrotas de Ana Gomes nesta eleição presidencial: apesar de alguns apoios importantes do partido, não conseguiu cativar o eleitorado socialista, que, claramente, preferiu Marcelo Rebelo de Sousa, seguindo as indicações da maior parte da direcção do PS, com Costa à cabeça.

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A satisfação socialista com o resultado ficou clara numa declaração do presidente do partido, Carlos César, na noite eleitoral: “A sua [de Marcelo] vitória é uma boa notícia para o PS porque é uma boa notícia para a confirmação do regime democrático, uma boa notícia da derrota do extremismo de direita, uma boa notícia de valorização política e para a continuidade de uma prática responsável de cooperação institucional, designadamente entre o Governo e a Presidência da República.”

Mas as derrotas de Ana Gomes também têm dentro algumas vitórias. Ficou à frente do candidato de extrema-direita, André Ventura, um dos principais alvos da sua campanha eleitoral, e obteve mais votos do que os outros dois candidatos de esquerda, Marisa Matias, apoiada apelo BE, e João Ferreira, do PCP. Não é pouco. A voz de Ana Gomes passa a ter um peso importante na esquerda portuguesa, que, durante a campanha, defendeu que devia estar unida.

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E no PS também. Durante a campanha, lançou Pedro Nuno Santos, ministro das Infra-Estruturas e seu apoiante, para a disputa da liderança do PS, e o peso que ganhou nestas eleições pode reforçar o lado mais à esquerda dos socialistas, nos quais se inclui o governante e, assim, complicar a vida a António Costa. Passou ainda a ser a mulher mais votada numa eleição presidencial, “trono” que Marisa Matias tinha conquistado na última corrida a Belém.

No seu discurso final não faltaram, mais uma vez, críticas à direcção do PS e a Costa. “Lamento profundamente a não comparência nestas eleições por parte do meu partido, o PS, que assim contribuiu para dar a vitória ao candidato da direita democrática. Não estivesse no terreno a minha candidatura e acabava a fazer o jogo da extrema-direita, permitindo elevá-la a alternativa”, afirmou.

E deixou um aviso: “Quanto à direcção do PS, espero que os militantes a ajudem a reflectir profundamente e a tirar consequências da sua actuação, que fez eleger o candidato da direita democrática. A direcção do PS apostou na diluição das fronteiras políticas entre a esquerda e a direita democrática. (…) Tal diluição não serve certamente a democracia.”

“Mantenho a condição de militante de base do PS e não desistirei nunca de fazer tudo que for preciso para servir a democracia. O que implica pô-la a dar respostas aos problemas dos cidadãos, a exigir isenção e transparência a quem governa e a exigir o regular e independente funcionamento das instituições”, salientou.

Já nas respostas aos jornalistas, garantiu que continuará a ter “intervenção cívica e política” como militante de base do PS. “Não estou reformada, nunca me reformarei enquanto cá andar neste mundo.”

Sobre Belém, com outro PS, não afastou totalmente uma nova candidatura: “Eu sei lá se ainda estou viva daqui a cinco anos [risos]. Eu, como digo, sou reformada da vida profissional, mas nunca da vida, nunca me reformarei da política, porque acho que a política é um dever de cidadania. E portanto estou aqui para continuar a intervir.”