Covid-19: especialistas em saúde dizem que plano do Governo britânico para o Natal é “kamikaze”

Duas das mais importantes revistas médicas britânicas fizeram um editorial conjunto pedindo mudança de planos. Sindicatos dos médicos diz que relaxamento das medidas é “kamikaze”.

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Natal em Inglaterra: os planos de permitir que três agregados se juntem em interiores esta a gerar alarme TOBY MELVILLE/Reuters

O Governo britânico tem de recuar na decisão de suavizar no período do Natal as restrições em vigor para diminuir a transmissão da covid-19, disseram num raro editorial conjunto duas das mais importantes revistas médicas britânicas. Caso não o faça, irão perder-se muitas vidas.

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O Governo britânico tem de recuar na decisão de suavizar no período do Natal as restrições em vigor para diminuir a transmissão da covid-19, disseram num raro editorial conjunto duas das mais importantes revistas médicas britânicas. Caso não o faça, irão perder-se muitas vidas.

A juntar-se à pressão, a responsável pelo sindicato dos médicos hospitalares, Claudia Paoloni, disse que o plano do Governo de Boris Johnson para Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte é “kamikaze”. E o líder do Labour Keir Starmer pediu, em carta, ao primeiro-ministro que reconsiderasse os planos.

As revistas British Medical Journal e Health Service Journal dizem que caso vá em frente com a autorização permitir de convívio em espaços fechados entre pessoas que não vivam juntas, o Governo não vai poder continuar a dizer que está a proteger o serviço nacional de saúde (NHS).

Se a tendência actual continuar, dizem, haverá 19 mil doentes com covid-19 nos hospitais ingleses, o mesmo número do pico da primeira vaga, a 12 de Abril. Isto sem contar com o impacto de contactos durante o Natal se forem autorizadas as viagens para ver familiares e o convívio em interiores: neste momento, está previsto que possam estar juntos elementos de três agregados familiares diferentes entre 23 e 27 de Dezembro.

Caso se mantenham os planos, a carga extra de doentes com covid-19 deverá ser 40 vezes mais alta do que no início da segunda vaga.

“Acreditamos que o Governo está prestes a cometer outro erro enorme que irá custar muitas vidas”, afirmaram.

Antecipando dificuldades para o Governo justificar a decisão, o editorial sublinhava: “Quando o Governo fez os planos actuais de permitir mistura de agregados no Natal, partia do princípio de que a pressão de doentes com covid-19 estava a diminuir. Mas não está, está a aumentar, e o surgimento de uma nova variante do vírus introduziu novos perigos.”

Este foiapenas o segundo editorial conjunto na história das duas revistas, que têm mais de cem anos. O anterior foi em 2012 sobre as reformas do NHS.

O Partido Trabalhista, pelo seu lado, fala em consequências “inimagináveis” dos planos actuais e sugeriu que o primeiro-ministro reunisse o gabinete de crise “Cobra” (que responde a situações de crise e urgência nacional) para mudar o curso. Starmer prometeu o apoio do Labour caso esta seja a decisão de Johnson.

O Governo fez saber que vai ouvir responsáveis as várias regiões sobre a suavização das restrições.

Para o Labour, o sistema de três níveis, em que algumas zonas estão no nível máximo de restrições (Londres, e partes de Essex e Hertfordshire) não é suficiente no contexto actual.

Também entre os Conservadores há vozes a defender o mesmo. Jeremy Hunt, antigo ministro da Saúde que chefia a comissão de saúde da Câmara dos Comuns, também pediu ao Governo que considerasse mudar os planos. Se não o fizer, a situação será “muito muito perigosa e precária para o NHS”.

Hunt acrescentou ainda que o Governo não devia manter o plano só para evitar mudanças. “Penso que não devíamos nunca criticar pessoas quem mudem de opinião numa pandemia, porque os dados também mudam”, disse.

Claudia Paoloni, do sindicato dos médicos hospitalares, tem outra palavra para o plano: “kamikaze”, e por isso apela ao seu cancelamento “imediato”. Comparado, por exemplo com a Alemanha, que entra esta quarta-feira em confinamento, o sistema de saúde britânico já está a sofrer com o excesso de doentes com covid, que impedem que sejam feitas cirurgias programas e tratamentos necessários. “A inacção vai fazer com que haja doentes a morrer sem necessidade, e milhares de casos críticos que vão ficar sem tratamento.”