Certificação florestal deve ser “financiada directamente pela UE”

O secretário-geral do Programme of Endorsement for Forest Certification Schemes admite a ambição que “a sustentabilidade seja uma tendência e não seja mais um nicho”. E sublinha que a certificação florestal não é um “investimento de curto prazo”, antes “um investimento sustentável para o futuro das nossas florestas” – no qual a União Europeia pode desempenhar um papel fundamental.

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Ben Gunneberg é um dos fundadores daquele que é hoje o maior sistema de certificação florestal do mundo – o PEFC (Programme of Endorsement for Forest Certification Schemes), assumindo actualmente as funções de CEO e secretário-geral da organização. No final de Setembro, participou no Encontro PEFC Portugal – Floresta e Sustentabilidade. Em entrevista exclusiva ao PÚBLICO, por e-mail, sublinha as vantagens económicas, ambientais e sociais da certificação florestal e lança um repto aos responsáveis políticos europeus: “Não podemos perder de vista as pessoas, os empregos e as zonas rurais que dependem das florestas” e o próximo Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 da UE deve “financiar directamente” a certificação florestal.

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Ben Gunneberg é um dos fundadores daquele que é hoje o maior sistema de certificação florestal do mundo – o PEFC (Programme of Endorsement for Forest Certification Schemes), assumindo actualmente as funções de CEO e secretário-geral da organização. No final de Setembro, participou no Encontro PEFC Portugal – Floresta e Sustentabilidade. Em entrevista exclusiva ao PÚBLICO, por e-mail, sublinha as vantagens económicas, ambientais e sociais da certificação florestal e lança um repto aos responsáveis políticos europeus: “Não podemos perder de vista as pessoas, os empregos e as zonas rurais que dependem das florestas” e o próximo Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 da UE deve “financiar directamente” a certificação florestal.

Porque é que os proprietários florestais devem investir na certificação florestal? Além dos benefícios ambientais, há vantagens económicas e financeiras?

A certificação florestal é crucial, como forma de verificação e reconhecimento independente da gestão florestal sustentável. E oferece vantagens significativas do ponto de vista ambiental, uma vez que garante que as florestas podem manter-se como florestas e continuarem a absorver CO2 da atmosfera e a abrigarem mais de 80% das espécies terrestres. Por outro lado, a gestão florestal sustentável torna as florestas mais resistentes às mudanças climáticas e aos desastres naturais.

Em paralelo, há um ganho financeiro importante para os proprietários florestais, dado que a certificação florestal, ao criar confiança no consumidor, acrescenta valor às florestas. Muitas pessoas ainda se preocupam com o facto de a compra de produtos de madeira poder contribuir para a desflorestação, mas podem ter a certeza: se virem o rótulo PEFC num produto, o material à base de madeira provém de florestas geridas de forma sustentável. Graças a essa garantia, as pessoas procuram cada vez mais produtos de madeira, gerando uma procura adicional de produtos florestais e ganhos financeiros para os proprietários.

Pergunto-lhe pelas vantagens económicas e financeiras porque, em Portugal, é frequente ouvir os proprietários e as organizações reclamarem que a produção florestal não é rentável. Como conciliar os custos da certificação com os custos da produção e ser bem pago por isso?

Dada a importância vital, do ponto de vista ambiental, social e económico, das florestas, é fundamental que a produção florestal seja rentável. Se as florestas não forem rentáveis correm o risco de serem convertidas para usos alternativos, como a agricultura. É precisamente aqui que a certificação PEFC entra e pode ajudar. Graças ao rótulo PEFC em produtos de base florestal, como o papel, lenços de papel, móveis de madeira e até na moda, os proprietários florestais podem provar que gerem as suas florestas de forma sustentável. E isso ajuda a aumentar a confiança dos consumidores na compra desses produtos, pois sabem que não estão a contribuir para a desflorestação. Criar mais procura de produtos de base florestal gera mais valor para as florestas.

A somar a isto, a certificação florestal facilita a venda, fora de Portugal, da madeira e dos produtos por parte dos proprietários e das empresas florestais. Em muitos países, a certificação é um pré-requisito para fazer negócios e as políticas de compras públicas e privadas exigem cada vez mais materiais de origem florestal certificados.

Com mais de metade de toda a madeira importada em mercados como o Reino Unido e a Holanda com certificação PEFC, a nossa marca oferece uma vantagem real de mercado aos proprietários e gestores florestais com a nossa certificação.

Certificação de grupo para pequenos produtores

Sobretudo no Norte e Centro de Portugal, temos muitas pequenas propriedades florestais. A certificação está disponível e é possível para estes proprietários?

Sim. O sistema de certificação PEFC foi criado para garantir que os proprietários florestais pequenos e familiares tenham as mesmas vantagens que os operadores maiores. Por isso, desenvolvemos a certificação de grupo, que permite também que os pequenos proprietários se agrupem e organizem, reúnam seus recursos e trabalhem em equipa para obterem a certificação. É isso que torna a certificação PEFC acessível e prática para eles.

Cerca de um milhão de pequenos proprietários florestais já obtiveram a certificação PEFC através da certificação de grupo e o número está a aumentar. Em suma, os custos de certificação são reduzidos, porque nem todos os proprietários florestais do grupo são auditados individualmente todos os anos. Em vez disso, o organismo de certificação audita apenas uma amostra dos membros do grupo. Por exemplo, o organismo de certificação pode visitar quatro propriedades florestais de um total de doze em cada ano. E isto é possível porque todos os proprietários florestais dentro do grupo são cobertos pela auditoria interna que a entidade do grupo realiza anualmente.

Mas como se convencem os proprietários florestais a certificarem as suas propriedades, se muitos deles nem sequer têm suas propriedades cadastradas?

A certificação em grupo em Portugal já permitiu que alguns proprietários de pequenas florestas obtivessem a certificação, embora a maioria dos 400 mil proprietários de pequenas explorações florestais ainda não tivessem arriscado.

Como forma de desenvolver ainda mais a certificação em grupo em Portugal, o nosso Fundo de Colaboração PEFC 2015 apoiou um projecto com o objectivo de aumentar o número de pequenos proprietários florestais que beneficiam da certificação. Os parceiros desse projecto realizaram uma série de actividades de divulgação, como forma de aumentar a conscientização para a certificação PEFC entre os pequenos proprietários florestais portugueses. No final do projecto, em 2017, registou-se um aumento de 50% da área florestal certificada no país.

Em vez de convencermos os proprietários florestais a terem suas florestas certificadas, queremos alargar os muitos benefícios que uma certificação PEFC pode ter para eles. E um dos principais benefícios da certificação PEFC é que ela confere aos proprietários florestais a oportunidade de obterem suporte técnico em todos os aspectos relevantes da certificação florestal e também para demonstrarem a conformidade legal e os direitos de propriedade da terra. Esta é ainda uma oportunidade de obter aconselhamento e suporte técnico de especialistas, que trabalham no terreno a certificação florestal.

Certificação de cadeia de custódia

Em Portugal não existem apoios públicos directos à certificação florestal. Há apenas algumas bonificações que podem conferir melhor pontuação em certas candidaturas a fundos europeus. Há outros mecanismos que os proprietários possam utilizar para financiarem a certificação? Que conselho lhes deixa?

A certificação PEFC em grupo reduz significativamente os custos com a certificação e tornou-a acessível a mais de um milhão de pequenos proprietários florestais em todo o mundo. E esse número continua a crescer. O meu conselho é que os proprietários e gestores florestais encarem a possibilidade de entrar em novos mercados com madeira e outros produtos florestais certificados, vendendo às empresas que adquirem exclusivamente madeira certificada. Há também benefícios financeiros indirectos: a gestão florestal sustentável, em geral, melhora a produtividade florestal e a diversidade dos produtos florestais, gerando um maior retorno financeiro.

Qual é o papel da indústria no processo de certificação florestal? Considera que apoia suficientemente os produtores na certificação?

A cadeia de abastecimento de produtos florestais tem um papel extremamente importante a desempenhar no apoio aos produtores, garantindo, desde logo, a compra de produtos certificados e com origem sustentável como forma de promover a importância da certificação junto dos seus próprios clientes.

E as empresas ao longo da cadeia de abastecimento florestal podem-se certificar através da certificação de cadeia de custódia PEFC. Essa certificação garante que todas as etapas da cadeia de valor, desde a floresta até o produto final, estão de acordo com os requisitos de sustentabilidade PEFC. As próprias empresas certificadas obterão naturalmente a madeira para os seus produtos a partir de florestas certificadas pelo PEFC, garantindo uma procura consistente de madeira certificada.

Por outro lado, ao usar o rótulo PEFC no produto final, as empresas industriais estão a cumprir um papel fundamental na conscientização dos consumidores para a importância da gestão florestal sustentável. À medida que o consumidor ganha mais consciência disso, os ganhos obtidos pela procura terão repercussão na cadeia de valor para os proprietários e gestores florestais. É desta forma que a indústria e os proprietários florestais se podem entreajudar e beneficiar com a certificação uns dos outros.

A indústria deveria remunerar melhor a madeira oriunda de florestas certificadas? Que experiências pode partilhar de outras empresas na Europa?

A nossa ambição é que a sustentabilidade seja uma tendência e não seja mais um nicho ou uma excepção. Se os proprietários ou as empresas estão à espera de um preço premium para os produtos e materiais oriundos de florestas geridas de forma sustentável, isso nunca será possível. Isto é básico: enquanto a oferta for baixa e a procura elevada, pode haver uma remuneração extra durante um curto período de tempo, mas à medida que a oferta iguala a procura e a sustentabilidade se torna uma tendência, os preços seguem regras normais da competitividade. Isso é o que temos visto em todo o mundo.

“Certificação devia ser directamente financiada pela UE”

A União Europeia está a preparar um novo ciclo (2021-2027) de fundos comunitários, nomeadamente para a agricultura, incluindo as florestas. Os fundos europeus deveriam apoiar directamente a certificação florestal?

A certificação florestal é uma ferramenta de qualificação ambiental, social e económica para as áreas rurais, que garante serviços ao ecossistema. E que ajuda os proprietários e gestores florestais a aumentarem o seu retorno financeiro enquanto zelam pelas nossas florestas. Não se trata de um investimento de curto prazo, mas de um investimento sustentável para o futuro das nossas florestas. Como tal, devia ser directamente financiado pela União Europeia.

Por isso, apoiamos totalmente o apelo feito pela Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (AGRI) do Parlamento Europeu para que a Estratégia Europeia para as Florestas pós-2020 seja ambiciosa, independente e autónoma e que apoie politicamente e de forma real o sector florestal. A AGRI realça que a próxima Estratégia Florestal da UE deve promover modelos de gestão que garantam a sua sustentabilidade florestal aos níveis ambiental, mas, também, social e económico.

Nesse sentido, assinámos, juntamente com outras organizações do sector florestal – incluindo proprietários florestais públicos e privados – uma declaração conjunta que elenca as questões críticas para a futura Estratégia Florestal da UE. E que realça que todas as funções e benefícios gerados pelas florestas devem ser considerados e equilibrados nessa estratégia. Não podemos perder de vista as pessoas, os empregos e as zonas rurais que dependem das florestas. É necessária uma maior coerência e coordenação.

Nos últimos anos, foi acordado um número crescente de políticas da UE sobre florestas com origem em vários sectores, o que levou a um quadro político bastante fragmentado e complexo. A futura Estratégia Florestal da UE precisa de ter como ambição proporcionar uma abordagem homogénea às nossas florestas, de modo a protegê-las de forma eficaz e sustentável. Tal beneficiará, não apenas as florestas, mas também nos ajudará a responder às crescentes expectativas da sociedade, no sentido de gerarmos uma economia verde e neutra em carbono.