Pandemia levou mais portugueses a recorrer ao online dating

Estudo do Iscte Media Lab foca-se na plataforma Felizes.pt onde, entre Março e Abril, inscreveram-se mais 11.900 pessoas. E a pandemia é tema de conversa entre elas.

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Na impossibilidade de conhecer pessoas fora de casa, portugueses optaram pela Internet Philipp Meiners/Unsplash

A pandemia e o sucessivo confinamento parecem ter levado mais portugueses a recorrer às plataformas de online dating, ou seja, a utilizar a Internet para encontrar novos relacionamentos. É uma das conclusões do estudo “Influência da pandemia covid-19 nas plataformas de online dating: estudo de caso do felizes.pt” levado a cabo pelo ISCTE Media Lab acerca da plataforma Felizes.pt.

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A pandemia e o sucessivo confinamento parecem ter levado mais portugueses a recorrer às plataformas de online dating, ou seja, a utilizar a Internet para encontrar novos relacionamentos. É uma das conclusões do estudo “Influência da pandemia covid-19 nas plataformas de online dating: estudo de caso do felizes.pt” levado a cabo pelo ISCTE Media Lab acerca da plataforma Felizes.pt.

“Construído por portugueses e para portugueses”, como se descreve a própria plataforma, o Felizes.pt conta com mais de 200 mil utilizadores inscritos e cerca de 60 mil pessoas visitaram o site no último mês. A inscrição obriga a uma descrição de algumas características dos utilizadores que depois podem entrar em contacto com outros membros do serviço através do serviço de chat, uma sala virtual de conversação, incluído. Só entre Março e Abril, foram criados 11.900 novos perfis, um aumento de 27% face ao mesmo período do ano passado.

Uma vez que há mais gente a criar perfis, o número de acessos também cresceu: de cerca de 634 mil visitas à plataforma em Fevereiro para mais de 806 mil em Maio. Já o tempo que dura cada visita parece não ter sido alterado. “Ora, durante o confinamento, e como as pessoas estão em casa, poderíamos assumir que poderiam dedicar mais tempo a utilizar o site, o que parece não acontecer”, afirma o estudo, que reporta uma duração média de 19 minutos por cada vez que um utilizador acede à página. “O confinamento trouxe, para muitas pessoas, o teletrabalho ou a telescola” começam por explicar os investigadores Rita Sepúlveda e Miguel Crespo ao PÚBLICO, adicionando que “os utilizadores do Felizes.pt continuam a reservar o período do fim-de-semana e da noite como o preferido para estar online”.

Porém, e uma vez que a maior parte do tempo no site é passado no chat, o estudo admite que “existe também a possibilidade de, na fase de descoberta [de novos contactos], os utilizadores partilharem outras formas de contacto, como o Facebook Messenger ou o WhatsApp, migrando as conversas para essas plataformas”.

Quem são os participantes?

Questionados se este número de inscritos deverá voltar para níveis pré-pandemia à medida que avance o desconfinamento, os investigadores afirmam que “enquanto a utilização da plataforma satisfizer as necessidades inerentes aos motivos pelos quais os utilizadores se registaram, é natural que estes se mantenham activos”. Nesse sentido, Rita Sepúlveda e Miguel Crespo consideram ser difícil prever se, “mesmo em tempo de comportamentos excepcionais provocados por factores externos como a actual pandemia”, os inscritos irão continuar a recorrer a este tipo de plataformas ou voltar às suas rotinas sociais pré covid-19.

A plataforma assume que a falta de “outras formas de entretenimento ou socialização, tenha levado a uma presença mais constante no site e este tornando-se, assim, uma forma de entretenimento que substituiu jantares e idas ao teatro ou ao cinema, durante a semana”.

As motivações para aceder às plataformas virtuais deste tipo são várias e não são estanques. Entre a socialização, procura de entretenimento, procura de relacionamentos ou parceiros sexuais são várias as razões que os investigadores enumeram numa resposta conjunta enviada ao PÚBLICO. Se por um lado existem acontecimentos que permitem contextualizar a adesão, tais como o terminar de uma relação ou a mudança de local de residência, também a covid-19 “poderá consistir num evento disruptivo” que, aliado à imposição de isolamento, justifica essa decisão.

 Os dados globais referentes a 2019 acerca das idades dos utilizadores de plataformas de online dating indicam que “a faixa etária mais comum é a 25-34 anos”, mas o pico no Felizes.pt está entre os 40-50 anos e foi, inclusive, a faixa etária que mais cresceu durante a pandemia, com 32% dos novos inscritos. Segundo o estudo, a discrepância pode estar relacionada com o posicionamento da plataforma, mas “sugere que os utilizadores a podem ver como uma solução para aqueles que procuram novos relacionamentos, ou também como resposta a ser mais ‘difícil’ pessoas de tal idade encontrarem outros relacionamentos nos meios mais comuns”. Porém, isso não significa que a aposta esteja apenas no mundo virtual. “Os utilizadores não descartam as redes sociais e locais tradicionais, mas as plataformas de online dating são encaradas como um meio complementar a outros espaços reais ou virtuais onde podem conhecer várias pessoas”, refere-se.

Há ainda a indicação da “curiosidade de existirem 776 utilizadores com mais de 75 anos”.

A covid-19 é tema de conversa

O estudo do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (Iscte-IUL) também tentou perceber a influência da pandemia no online dating através das expressões relacionadas com a pandemia covid-19 que estão presentes nos perfis e nas mensagens.

Entre palavras como covid, coronavírus, pandemia ou quarentena, os investigadores consideram “inevitável” que a pandemia “seja um assunto transversal na sociedade, marcando um conjunto de dinâmicas relacionais às quais os utilizadores de plataformas de online dating não são excepção”. Por isso, admitem ser “natural” o surgimento dessas expressões nos campos de “introdução” do perfil dos utilizadores e que seja um tema que faça parte das conversas mantidas no site.

O estudo refere que “o volume de mensagens e referências a termos relacionados com a covid-19 durante a fase da descoberta” ajuda a reforçar “a ideia de que as pessoas em tempo de confinamento passam mais tempo no chat e que a pandemia é inevitavelmente parte da conversa”. Desde Fevereiro que se começou a verificar menções ao vírus e o pico deu-se entre finais de Março e início de Abril.

“Portanto”, conclui o estudo, “também no online dating a pandemia deixa marcas” e obriga as plataformas a “serem mais informativas com os seus utilizadores, e estes a interiorizar a nova realidade e a exprimi-la” naqueles espaços virtuais.