Projecto de “inclusão emancipada” diminui absentismo escolar entre crianças ciganas

Alunos foram colocados como “o centro das atenções na sala de aula” por investigadores da Universidade do Minho, que trabalharam num agrupamento de escolas de Vila Verde, Braga.

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Adriano Miranda

O projecto “Rise”, aplicado num agrupamento escolar de Vila Verde, Braga, “conseguiu” diminuir o absentismo e insucesso escolar de alunos ciganos ao “inverter” o paradigma Ensino/Apendizagem, procurando uma “inclusão emancipada” ao colocar o aluno “no centro das atenções”.

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O projecto “Rise”, aplicado num agrupamento escolar de Vila Verde, Braga, “conseguiu” diminuir o absentismo e insucesso escolar de alunos ciganos ao “inverter” o paradigma Ensino/Apendizagem, procurando uma “inclusão emancipada” ao colocar o aluno “no centro das atenções”.

Em declarações à Lusa, a professora da Universidade do Minho e coordenadora do programa, RISE - Roma Inclusive School Experiences, Maria José Casa-Nova, explicou que o projecto assenta em três pilares: articulação entre famílias e escola; interculturalidade e diálogo; formação de professores e articulação curricular.

Com base neste projecto, que teve início em 2018 e termina em Março de 2020, pretende-se que seja feito um “booklet” de boas práticas para serem seguidas noutras escolas frequentadas por crianças ciganas e de outras minorias socioeconómicas, sendo que o “Rise” foi aplicado no pré-escolar, primeiro e segundo ciclo.

“Mais do que resultados quantitativos deste tipo de projectos é preciso retirar resultados qualificativos. Se por um lado é possível quantificar um menor abandono escolar e taxas de insucesso a diminuir, por outro é preciso salientar esses resultados foram conseguidos pela inversão do paradigma Ensino/Aprendizagem para Aprendizagem/Ensino, colocando o aluno como o centro das atenções na sala de aula”, explicou a docente da Universidade do Minho e também membro do Observatório das Comunidades Ciganas, Maria José Casa-Nova.

Para aquela “inversão”, os professores incluídos no projecto usaram “dispositivos pedagógicos” para levar os alunos a aprender as matérias escolares através do uso de mecanismos que fizeram deles “os protagonistas” das aulas.

“Por exemplo, foi pedido que levassem materiais para construir casas e nelas colocar aquilo que eles têm em casa deles. Neste exercício foi possível ver a multiculturalidade entre as crianças envolvidas e evidenciar as diferenças mas de forma positiva, enquanto aprendiam noções de matemática, meio físico e português”, apontou a investigadora.

Quanto ao primeiro dos pilares referidos por Maria José Casa-Nova, a participação das famílias nas actividades e dinamização escolar, a investigadora disse ser possível concluir que “os pais e familiares das crianças ciganas aderiram e entraram em diálogo com os pais das outras crianças, que se mostraram cada vez mais receptivos às suas ideias e forma de participar no contexto escolar”.

“Conseguiu-se criar uma rede de sociabilidade sem que tenha havido má recepção de nenhuma das partes”, salientou.

No segundo pilar, a formação dos professores, a investigadora apontou a “boa receptividade às acções de formação e o bom entendimento por parte dos docentes da inversão da equação Ensino/Aprendizagem”.

O terceiro pilar, a articulação curricular, “foi aquele do qual mais resultados qualitativos foi possível retirar com o uso e construção dos dispositivos pedagógicos”.

Para Maria José Casa-Nova uma das “mais-valias” do projecto é ter tornado possível “incutir nas crianças, desde cedo, a consciência o não-uso de práticas de desigualdade de género, trabalhar com elas para que percebam que homem e mulher podem fazer as mesmas coisas e que estão em igualdade de circunstâncias.

A coordenadora do “Rise”, embora reconhecendo que “estas alterações de mentalidades não acontecem num ano, nem em dois ou três”, salientou que “por algum lado tem que começar e ao começar desde cedo nos mais novos permite que eles levem estas ideias para casa e as comecem também a difundir e aplicar na sua comunidade”.

Por isso, Maria José Casa-Nova fala em “inclusão emancipada": “Grande parte destas crianças, como outras noutros contextos socioeconómicos de descriminação, se não forem à escola buscar ferramentas de educação não as vão ter em lado nenhum. Por isso a escola tem que agir e formar ao mesmo tempo, trabalhando de forma a que cada sujeito possa fazer o seu caminho de emancipação”, explicou.

Os resultados do projecto, aplicado também em Itália e na Eslovénia, financiado pelo programa Direitos, Igualdade e Cidadania da Comissão Europeia, vão ser apresentados esta terça-feira na Universidade do Minho.