“A roupa que vestimos é estúpida”: o futuro da moda está atrasado, diz Lisa

Lisa Lang gostava que as roupas que usamos deixassem apenas de servir para nos cobrir. A fundadora de três marcas de fashion tech junta designers e engenheiros para criar peças que aliam a estética à funcionalidade. Sempre em boa medida: “Ninguém quer parecer estúpido.”

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Lisa Lang nasceu na Alemanha, viveu na Austrália e agora está em Portugal Anna Costa

Lisa Lang acende tranquilamente um cigarro antes de encolher os ombros e dizer, com naturalidade, que as roupas que vestimos são simplesmente “estúpidas”. Porque além de “não fazerem nada” — a não ser tapar-nos —, deixam rapidamente de satisfazer as nossas necessidades. É precisamente essa a explicação que dá para a nossa constante vontade de renovar o armário: “As roupas não se adaptam a nós, nós é que nos adaptamos a elas.” E a forma de nos “adaptarmos” é através da sua substituição. 

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Lisa Lang acende tranquilamente um cigarro antes de encolher os ombros e dizer, com naturalidade, que as roupas que vestimos são simplesmente “estúpidas”. Porque além de “não fazerem nada” — a não ser tapar-nos —, deixam rapidamente de satisfazer as nossas necessidades. É precisamente essa a explicação que dá para a nossa constante vontade de renovar o armário: “As roupas não se adaptam a nós, nós é que nos adaptamos a elas.” E a forma de nos “adaptarmos” é através da sua substituição. 

“Mas imagina se tivesses uma peça que muda de cor — que é azul se estás num espaço interior e laranja se vais para o exterior —, cujo modelo é adaptável — se está frio as mangas são compridas, se está calor são curtas —, ou que é feita de um material que aquece ou arrefece”, atira Lisa. Talvez assim não precisássemos de ter tanta roupa. “Parece loucura”, mas “essas funções já existem” — só é preciso alguém que as consiga juntar. E é aí que Lisa, que protagonizou uma palestra na quinta conferência do Porto Tech Hub, a 11 de Outubro, entra.

Foi educada para ser dona de casa, mas quis ser carpinteira, depois jornalista, e chegou a fazer um estágio em fotografia. Estudou artes na Alemanha, onde nasceu. Mudou-se para a Austrália e, durante os seis anos em que lá viveu, trabalhou numa agência de web design e depois numa start-up, onde assumiu um cargo de chefia. Foi aqui que surgiram as primeiras preocupações acerca do que vestia: “Sendo a única mulher num ambiente dominado por homens, o que eu vestia tornou-se muito importante para mim. Como se se tratasse de uma armadura.”

Foi também nesta altura que apareceram os primeiros relógios desportivos — cuja funcionalidade se estendia para além da de mostrar as horas —, que despertaram um gatilho. “Ou uso peças bonitas que são estúpidas, porque não têm qualquer função, ou uso algo com função, como os relógios desportivos que, francamente, são feios”, pensou. E a ideia de aliar o design de moda à tecnologia nasceu na forma desta pergunta: “Porque é que não posso ser bonita e sofisticada ao mesmo tempo?”

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Anna Costa

Em 2013, já com o bichinho na cabeça, voltou à Alemanha e começou a estudar marketing. Até que teve uma epifania: percebeu que a indústria da moda não evoluía há cerca de 30 anos, apesar de desde sempre ter sido uma indústria inovadora (veja-se o exemplo dos fechos ou das máquinas de costura). Se todas as outras indústrias eram questionadas e revolucionadas, a indústria da moda também teria que o ser, eventualmente. E ninguém melhor do que alguém de fora do sector para o fazer (“A Uber não foi criada por taxistas, mas sim por um grupo de pessoas que estavam frustradas com o status quo e usaram tecnologia para o mudar”).

Decidiu criar, um ano mais tarde, a primeira peça que aliava o design com a tecnologia: um colar que não utilizava diamantes ou safiras, mas incorporava LED — que também brilham. A peça não tinha uma funcionalidade além da estética, mas as luzes eram “a forma de tirar o medo das pessoas em relação à tecnologia”, por provocarem uma resposta emocional. Afinal, quem não gosta de contemplar árvores de natal ou o pôr-do-sol?

“As pessoas têm medo que a tecnologia as transforme em robôs, que lhes tire o lado humano”, explica. “Só porque do ponto de vista da tecnologia é possível fazer um determinado produto, não significa que tenha de ser feito” — o mercado vai rejeitar tudo o que o faça parecer “estúpido” ou com um robô. Só uma simbiose entre designers e engenheiros poderá criar um produto emocionalmente apetecível para o mercado, explica Lisa. E é essa simbiose que a Elektrocouture, marca criada pela empreendedora em 2014, faz.

A marca foi crescendo e adicionando uma série de produtos ao catálogo, criados a várias mãos, com intervenção de profissionais de diferentes áreas. Alguns meramente estéticos, outros com funcionalidades mais visíveis: um chapéu que mede a actividade cerebral e a transmite através de luzes é um dos produtos que alia a tão desejada funcionalidade com estética. “O trabalho do designer é procurar o que já existe em indústrias completamente diferentes, como a da medicina, onde há tecidos que mudam de cor com base na pressão arterial ou temperatura”, refere.

Lisa acredita que, além do potencial de funcionalidades, a tecnologia pode ter um papel relevante no que toca à questão da sustentabilidade, já que a indústria da moda é uma das mais poluentes. E declara a morte da fast-fashion: “A geração Z recusa-se a comprar roupa, eles compram em segunda mão ou transformam a roupa antiga. Questionam o status quo, não aceitam tretas e recusam-se a obedecer.” É preciso não só criar roupas mais adaptáveis, mas também pensar na substituição de alguns materiais por outros biodegradáveis e compostáveis, por exemplo.

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O colar de LEDs criado por Lisa DR

Depois da The Power House, uma “agência de FashionTech” fundada pela ElektroCouture em 2017, Lisa começou agora no Porto, onde actualmente vive, uma nova empresa: O Fundamento. A empreendedora quer ir, “passo a posso”, a todos os fabricantes da zona, para “dar um novo propósito à infra-estrutura que eles já têm”. Afinal, “a única barreira é a mentalidade”.