Número de espécies de aves perdidas da Nova Zelândia levaria 50 milhões de anos a recuperar

Que impacto tiveram os humanos nas aves da Nova Zelândia, desde que lá chegaram pela primeira vez há cerca de 700 anos? Um artigo científico, que tem um investigador português como principal autor, dá uma resposta surpreendente.

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O kaká, uma das espécies endémicas da Nova Zelândia em risco crítico de extinção Juan Carlos García

Até conhecer a presença humana, a Nova Zelândia tinha cerca de 70 espécies de aves terrestres. Não existiam mamíferos para além de morcegos. No entanto, esta realidade mudou com a chegada do povo polinésio maori, há cerca de 700 anos – foram então extintas 22 espécies de aves. Os europeus, há a 200 a 300 anos, vieram agravar aquele número, contribuindo para a extinção de oito espécies de aves no país. Agora, um estudo, que tem como autor principal o cientista português Luís Valente, demonstrou que seriam precisos 50 milhões de anos para surgirem novas espécies que permitissem recuperar o número de espécies de aves perdidas na Nova Zelândia.

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Até conhecer a presença humana, a Nova Zelândia tinha cerca de 70 espécies de aves terrestres. Não existiam mamíferos para além de morcegos. No entanto, esta realidade mudou com a chegada do povo polinésio maori, há cerca de 700 anos – foram então extintas 22 espécies de aves. Os europeus, há a 200 a 300 anos, vieram agravar aquele número, contribuindo para a extinção de oito espécies de aves no país. Agora, um estudo, que tem como autor principal o cientista português Luís Valente, demonstrou que seriam precisos 50 milhões de anos para surgirem novas espécies que permitissem recuperar o número de espécies de aves perdidas na Nova Zelândia.

Apesar de a caça ter sido um dos factores que levou ao desaparecimento daqueles animais, a principal causa foi a introdução de ratos nas ilhas, que viajavam nos porões das embarcações. A isto juntou-se a entrada de gatos e de plantas invasoras (que não são características da Nova Zelândia) e a destruição de floresta para a agricultura. Mesmo actualmente, estas questões continuam a ter impacto.

“Os humanos introduziram tantas espécies no país que o número actual é muito maior do que as que existiam antes. As que foram introduzidas por vezes combatem com aves nativas, não consomem a fruta autóctone e, por isso, também não dispersam as sementes dessas plantas”, explica Luís Valente, de 34 anos, que trabalha no Museu de História Natural de Berlim.

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O investigador Luís Valente Pedro Cascão

O número de espécies extintas – 30 – já era conhecido pela comunidade científica. Por isso, um grupo de investigadores que trabalha na Alemanha, Holanda e Nova Zelândia quis ir mais longe e perceber o impacto evolutivo destas extinções. O resultado foi publicado na última edição da revista Current Biology.

A equipa tinha curiosidade em saber quantos anos seriam necessários para voltar ao mesmo número de espécies que existiam antes da presença humana na Nova Zelândia e, mais tarde, da chegada dos europeus. Os cientistas decidiram ainda avaliar uma outra situação: quantos anos seriam precisos para ter a biodiversidade actual de aves terrestres, caso as 13 espécies que se encontram hoje em vias de extinção desapareçam.

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O papagaio-mocho, umas das aves endémicas da Nova Zelândia em risco crítico de extinção Andrew Digby/Departamento de Conservação da Nova Zelândia

“Um número impressionante”

Para isso, a equipa criou um método estatístico teórico, o software DAISIE – sigla inglesa para Dynamic Assembly of Islands through Speciation, Immigration and Extinction. Depois de se inserirem dados sobre o ADN das espécies no software, o programa consegue calcular quantos anos seriam necessários para recuperar o número de espécies perdidas.

Resultado: teríamos de esperar 50 milhões de anos para ter o mesmo número de espécies que existiam antes da ocupação humana na Nova Zelândia. Se pretendêssemos regressar ao número de espécies existentes no país até à chegada dos europeus, o tempo de espera diminuiria para quatro milhões de anos.

Numa situação ainda mais pessimista, simulando o desaparecimento de 13 espécies actualmente em risco de extinção, seriam precisos cerca de seis milhões de anos para voltar a ter o mesmo número de espécies do presente. A espera aumenta para dez milhões de anos se também forem consideradas as espécies que no futuro podem vir a estar em risco.

“O nosso impacto vai além do número de espécies [perdidas]: implica também a perda de história evolutiva. Já sabíamos que essa perda seria grande, mas quando se fala em 50 milhões de anos… É um número impressionante, nem nós imaginávamos que seria preciso tanto tempo”, admite Luís Valente ao PÚBLICO.

Guiar a conservação noutras ilhas

Mas será que podemos impedir a extinção das 13 espécies ameaçadas de extinção na Nova Zelândia? O investigador português admite que é possível, pela forma como funcionam os programas de conservação do país: “As coisas mudaram. Já existem programas de reprodução em cativeiro e, além disso, há espécies que são colocadas em ilhas pequenas onde se erradicaram ratos e gatos”, esclarece.

No entanto, Luís Valente não descarta que as alterações climáticas possam vir a ter algum impacto nestas espécies neozelandesas em vias de extinção, apesar de não ter feito essa avaliação neste estudo. Por exemplo, espécies como o kaká e o kiwi dependem de certas plantas que podem não sobreviver às altas temperaturas.

Luís Valente já tinha utilizado o software DAISIE noutras duas situações: nas ilhas Galápagos, para calcular taxas de formação de novas espécies; e na análise dos morcegos das Caraíbas, quando o investigador passou a interessar-se pela dimensão da extinção animal provocada por humanos.

Depois deste novo estudo, a ideia agora é estimar o tempo de recuperação do número de espécies noutras ilhas, para “guiar os esforços de conservação”, como se lê no artigo científico. Luís Valente diz que está a considerar aplicar o mesmo método em Madagáscar e nas Caraíbas – ilhas que contam com várias espécies extintas de mamíferos – e ainda nas Filipinas, para onde o investigador estava de partida um pouco antes desta conversa.

Texto editado por Teresa Firmino