“Os protestos radicalizaram-se e vão continuar”

Três perguntas a: Hasni Abidi, director do Centro de Estudos e Investigação sobre o Mundo Árabe e Mediterrânico (CERMAM) em Genebra.

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No final do dia de sexta-feira, "o comportamento brutal da polícia foi uma provocação inaceitável", diz Hasni Abidi MOHAMED MESSARA/EPA

Os protestos são neste momento o único contra-poder ao exército na Argélia e também por isso vão continuar, diz Hasni Abidi, director do Centro de Estudos e Investigação sobre o Mundo Árabe e Mediterrânico (CERMAM) em Genebra, por e-mail, ao PÚBLICO. Abidi espera que o regime saiba responder de modo não-dogmático às reivindicações populares. 

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Os protestos são neste momento o único contra-poder ao exército na Argélia e também por isso vão continuar, diz Hasni Abidi, director do Centro de Estudos e Investigação sobre o Mundo Árabe e Mediterrânico (CERMAM) em Genebra, por e-mail, ao PÚBLICO. Abidi espera que o regime saiba responder de modo não-dogmático às reivindicações populares. 

Os manifestantes querem o regime fora, e o regime não dá sinais de ceder. O que pensa que pode acontecer depois de sexta-feira?
Os protestos vão continuar. Com a nomeação de Abdelkader Bensalah, o antigo presidente do Senado, o regime só deu argumentos aos argelinos para se mobilizarem ainda mais. Os erros estenderam-se à polícia, cujo comportamento brutal no final do dia [de sexta-feira] foi uma provocação inaceitável.

Os manifestantes vão continuar a ocupar o espaço público para pedir o afastamento de todos os símbolos e das figuras do “sistema”. Mais, não vão poupar o chefe do Exército, Gaid Salah, o que quer dizer uma radicalização da reivindicação.

Qual é o cenário político, e o que se pode esperar das eleições?
Não é realista confiar a organização de eleições de transição importantes a um Governo cujo chefe é um antigo ministro do Interior e foi nomeado por Bouteflika antes de este se demitir. 

Há um enorme afastamento entre o povo e o regime. Agora, depois da saída da parte presidencial do sistema, o Exército é o mais importante actor político. Tem de encontrar uma saída mais aberta e não dogmática de responder ao povo. O respeito de uma Constituição datada sem garantias democráticas não é uma solução para uma profunda crise de legitimidade. 

Há alguma coisa a que ache a que não se está a dar atenção?
Sim. Ainda é cedo para haver novos líderes a emergir da mobilização. Precisamos de tempo e de uma dinâmica política e social para produzir líderes, porque o risco de partir o movimento ou de o dirigir ou de o dividir é maior quando são designados líderes. 

Mas a decisão do exército impor a solução baseada no artigo 102 [da Constituição, que prevê que em caso de doença incapacitante do Presidente, este seria substituído interinamente pelo presidente do Senado] vai convencer os argelinos a procurar apoios ou uma estrutura mais forte. Antes do fim dos protestos, estes são o único contra poder contra o Exército.