Dez anos depois, Estado é julgado por queda de arriba que matou cinco pessoas

A defesa apela ao Presidente da República e primeiro-ministro para que se “cheguem à frente” e ajudem as vítimas, pagando uma indemnização de quase um milhão de euros.

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Virgilio Rodrigues

O julgamento do caso das cinco mortes ocorridas há dez anos na praia Maria Luísa, em Albufeira, na sequência da derrocada de uma arriba, começa esta sexta-feira no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé. Os familiares das vítimas pedem ao Estado uma indemnização de 911 mil euros, pela “omissão de deveres” de zelar pela segurança e vigilância dos banhistas, que se encontravam a apanhar banhos de sol à sombra do rochedo que ruiu. Após o acidente, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) multiplicou o número de placas a assinalarem risco de “queda de blocos”, mas o perigo continua.

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O julgamento do caso das cinco mortes ocorridas há dez anos na praia Maria Luísa, em Albufeira, na sequência da derrocada de uma arriba, começa esta sexta-feira no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé. Os familiares das vítimas pedem ao Estado uma indemnização de 911 mil euros, pela “omissão de deveres” de zelar pela segurança e vigilância dos banhistas, que se encontravam a apanhar banhos de sol à sombra do rochedo que ruiu. Após o acidente, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) multiplicou o número de placas a assinalarem risco de “queda de blocos”, mas o perigo continua.

O advogado Pedro Proença representa a família de Manuel Marques Pereira, que perdeu quatro pessoas: filha, genro e as duas únicas netas. Para evitar o arrastar processo com acções judiciais, sugere: “O Estado devia chegar-se frente e indemnizar as famílias à semelhança da negociação feita pela provedora de Justiça, em relação às vítimas do incêndio de Pedrogão Grande e à derrocada da pedreira de Borba. O Estado não disse que era culpado pelo que tinha acontecido, mas indemnizou as vítimas.” Por isso, o advogado lança um “forte apelo” ao Presidente da República e primeiro-ministro, para que se empenhem numa rápida solução. “Vamos esquecer este incidente infeliz, e indemnizar as vítimas.”

O acidente resultou da derrocada “instantânea” de uma escarpa, quando as pessoas se encontravam junto à arriba, ao final de uma manhã de Agosto, com a praia apinhada de gente. À entrada do areal, encontrava-se afixada uma placa em que se lia “arribas instáveis”. A advertência, como sucede com frequência, foi ignorada. A arriba, que protegia os utentes do sol, desmoronou-se como um baralho de cartas. Uma parte do rochedo, com dez metros de altura e seis de diâmetro, colapsou. Os banhistas que estavam mais próximos da arriba ficaram soterrados: cinco morreram, três sofreram ferimentos graves. Manuel Marques, viúvo, perdeu todos os membros do agregado. “Caiu [após o acidente] numa depressão e tristeza profundas, por ter perdido toda a família. E morreu de cancro há cerca de três anos, sem ver feita justiça”, refere o advogado, lembrando que este é um caso “absolutamente dramático”, onde vê um paralelismo com o que se passou em Pedrogão e na derrocada da pedreira de Borba. Por isso, reafirma que “se o Estado é pessoa de bem, devia ter igual procedimento, chegar-se à frente e indemnizar as vítimas”.

A quinta vítima mortal, Maria Emília, de 37 anos, refere o processo, “encontrava-se deitada numa toalha, sobre a areia, a cerca de cinco metros da linha de água e a cerca de 20 metros de distância” da escarpa que ruiu. As filhas, Glayds e Jennifer, adolescentes, encontravam-se perto, a jogar raquetes. A mãe terá gritado “fujam”, levantou-se e correu. “Subitamente, pedras de grandes dimensões começaram a cair”, lê-se no processo no qual o Estado é o único réu.

As pedras rolaram pelo areal e entraram pelo mar adentro. Maria Emília ficou soterrada, as filhas sofreram ferimentos graves. O marido, ajudado por outras pessoas, retirou algumas pedras, perguntando-lhe se “estava bem”, mas a resposta foi apenas um” balbuciar de palavras imperceptíveis”. No local, a mulher recebeu os primeiros socorros do INEM, mas acabaria por não resistir. Morreu ao final desse dia, 21 de Agosto de 2009, no Hospital de Faro.

Sentiu-se esmagado

Vítor Sousa, na altura advogado estagiário, também se encontrava deitado numa toalha, a apanhar banhos de sol, a cerca de cinco metros do rochedo. De repente, ficou soterrado e assim permaneceu cerca de quatro horas, altura em que foi resgatado. “Conseguiu respirar através de uma bolsa de ar por si formada, quando tapou a cabeça com as mãos e os braços”. Temeu pela vida. “As pessoas circulavam por cima de si e, por isso, em vários momentos, sentiu-se esmagado”, lê-se nos autos. Sofreu hematomas e lesões em várias partes do corpo. Os primeiros cuidados médicos foram prestados no Hospital de Faro, onde foi operado a uma fractura exposta no pé direito, tendo sido depois transferido para o Hospital de S. João, no Porto, onde esteve internado durante 23 dias. Só conseguiu andar normalmente ao fim de oito meses.

O Ministério Público (MP), em representação do Estado, alega que o colapso da arriba da praia Maria Luísa deu-se de “modo espontâneo e imprevisível”. Por seu lado, a defesa alega “negligência grosseira” por parte das autoridades, que não levaram em atenção os “sinais de perigo” que existiam na arriba.