Yannis Behrakis (1960-2019), o fotógrafo que mostrou com beleza o horror das guerras

Nas últimas três décadas, usou a sua câmara para contar o que se passava na Tchetchénia, na Síria, na ex-Jugoslávia. Correu perigo de vida. “A minha missão é garantir que ninguém possa dizer: ‘não sabia’”, afirmou.

Fotogaleria

Yannis Behrakis esteve com a sua câmara fotográfica nos locais de maior tumulto do mundo dos últimos 30 anos, incluindo nas guerras do Afeganistão e da Tchetchénia, na revolta popular no Egipto em 2011 e num enorme sismo na Caxemira. Ganhou o respeito de colegas e rivais pelo seu talento e coragem. E liderou a equipa da Reuters que ganhou o Prémio Pulitzer de 2016, pela cobertura da crise dos refugiados na Europa. Morreu aos 58 anos, após uma longa batalha contra o cancro.

A imagens que captou com a sua objectiva nas guerras da ex-Jugoslávia, na Líbia, na Serra Leoa, na Síria ajudaram a construir a narrativa que hoje temos destes acontecimentos. “Para ele, era importante contar a história da forma mais artística possível”, diz sobre o estilo do grego Behrakis o também fotógrafo da Reuters Goran Tomasevic.

“Dificilmente se encontrará alguém tão dedicado e tão focado, que sacrificava tudo para conseguir a fotografia mais importante”, afirmou Tomasevic. Essa dedicação era impressionante. O seu amigo e colega ao longo de três décadas, Vassilis Triandafyllou, descreveu-o como “um furacão”, que trabalhava todas as horas do dia e da noite, às vezes correndo consideráveis riscos pessoais, para conseguir a imagem que queria.

Fotogaleria

“Foi um dos melhores fotógrafos da sua geração. Yannis era apaixonado, vital e intenso, tanto no trabalho como na sua vida pessoal”, disse Dina Kyriakidou Contini, edtora da Reuters nos EUA. “As suas fotografias são icónicas, algumas são obras de arte por direito. Mas era a empatia que o tornava um grande fotojornalista.”

Behrakis reconhecia o poder de uma imagem forte para captar a atenção e até mudar o comportamento das pessoas. Essa crença levou-o a produzir uma obra que será recordada muito para além da sua morte. “A minha missão é contar-vos a história e depois vocês decidem o que querem fazer”, disse num debate em que se discutia a série de fotos sobre a crise de migração na Europa que ganhou o Pulitzer em 2015. “A minha missão é garantir que ninguém possa dizer: ‘não sabia’”.

Nascido em Atenas, em 1960, foi um filme de 1983, chamado Under Fire, sobre um grupo de repórteres na Nicarágua, nos dias anteriores à revolução sandinista de 1979, que o inspirou a seguir jornalismo.

Começou na Reuters como freelancer, em 1987, e dois anos depois teve o seu primeiro trabalho no estrangeiro – na Líbia de Muammar Kadhafi. Ali demonstrou um jeito especial para estar no sítio certo na altura certa. Conseguiu aproximar-se do coronel, no meio de uma confusão de outros fotógrafos, e no dia seguinte a sua fotografia estava na primeira página de muitos jornais em todo o mundo.

Foto
A foto que tirou de si próprio, quando escapou por pouco à morte, na Sierra Leoa Yannis Behrakis/REUTERS

Nas três décadas seguintes, tornou-se um repórter de guerra que conseguia encontrar beleza entre o caos, destacando-se pela coragem de estar no centro da acção. Uma foto de 1998, na ex-Jugoslávia, mostra um albanês que deposita num caixão pequenino o corpo de um rapaz de dois anos, morto em combate. Behrakis tirou a fotografia a partir do alto, e usou uma técnica de baixa velocidade e zoom para criar uma sensação de movimento estonteante.

“Era uma sensação muito forte, parecia que o corpo do menino estava a flutuar no ar”, explicou o fotógrafo. “Parecia que o espírito estava a deixar o seu corpo e a ir para o céu.”

Em 2000, quando cobria a guerra na Serra Leoa, a coluna de veículos em que Behrakis viajava foi atacada por homens armados. Kurt Schork, um dos repórteres da Reuters com que viajava, e um dos seus amigos próximos, foi atingido e morreu instantaneamente. Um repórter da Associated Press também morreu.

Ele e outro jornalista escaparam com vida, escondendo-se no mato junto à estrada, primeiro, e na selva, depois, durante horas, até os atiradores desaparecerem. Behrakis tirou uma foto sua, logo a seguir, que o mostra a olhar para o céu, os olhos vidrados.

Nos últimos anos, passou mais tempo na Grécia. Encontrou um fotógrafo mais jovem e com menos experiência, Alkis Konstantinidis, do qual se tornou uma espécie de professor. Konstantinidis fazia parte da equipa que ganhou o Pulitzer.

A crise dos refugiados teve um efeito profundo em Behrakis. Teve sentimentos de culpa, insónia e pesadelos. Mas também trouxe ao de cima o melhor num fotógrafo que se concentrava na dignidade dos seres humanos em situações limite, em vez de os tornar objectos de piedade.