Facebook admite ter contratado empresa de relações públicas para criticar George Soros

A informação vem no seguimento de uma investigação do New York Times sobre as estratégias utilizadas pela rede social para lutar contra os seus críticos.

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Mark Zuckerberg diz que não tinha conhecimento do caso até ler a história do New York Times LUSA/STEPHANIE LECOCQ

O Facebook admitiu ter contratado uma empresa de relações públicas em 2017 para ajudar a limpar a sua imagem. O processo incluía enviar dicas a jornalistas sobre as relações financeiras entre os opositores do Facebook e George Soros, o multimilionário norte-americano que descreveu o Facebook como um “perigo para a sociedade” no Fórum Económico Mundial de Davos.

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O Facebook admitiu ter contratado uma empresa de relações públicas em 2017 para ajudar a limpar a sua imagem. O processo incluía enviar dicas a jornalistas sobre as relações financeiras entre os opositores do Facebook e George Soros, o multimilionário norte-americano que descreveu o Facebook como um “perigo para a sociedade” no Fórum Económico Mundial de Davos.

A informação – confirmada pelo próprio Facebook num comunicado publicado esta quarta-feira – vem no seguimento de uma investigação do jornal The New York Times sobre as estratégias utilizadas pela rede social para lutar contra os seus críticos. 

Enquanto activista político e filantropo judeu, Soros está frequentemente no centro de várias teorias da conspiração da extrema-direita (em parte, porque já doou somas avultadas a causas próximas do Partido Democrata). As teorias acusam-no de orquestrar ataques por grupos antifascistas, de manipular a economia mundial, e de querer financiar um projecto de genocídio da raça branca. Em Outubro, Soros uma foi uma das figuras publicas norte-americanas ligadas ao Partido Democrata, a receber no correio pacotes com bombas artesanais prontas para serem detonadas. O grupo incluía também o ex-Presidente Barack Obama e a antiga secretária de Estado Hillary Clinton. 

“[Em 2017] estávamos a enfrentar uma pressão crescente dos nossos concorrentes em tecnologia, e empresas de media que querem que o governo nos regule”, explicou Elliot Schrage, o responsável pela política e comunicação do Facebook, em comunicado. “A pressão tornou-se particularmente aguda em Setembro, depois de publicarmos detalhes sobre a interferência russa nos nossos serviços. Decidimos contratar empresas [de comunicação] associadas tanto aos republicanos como aos democratas – a Definers era uma das empresas associadas ao Partido Democrata.”

O trabalho da empresa passava por recolher notícias da imprensa sobre o Facebook, contactar jornalistas, e fazer trabalho de investigação. Depois de Soros “atacar o Facebook” durante o seu discurso em Davos, Schrage diz que a Definers ficou encarregue de perceber o motivo. “Nunca tínhamos ouvido tais críticas da parte dele antes. Por isso, queríamos determinar se existia uma motivação financeira”, disse Schrage.

No processo, o Facebook descobriu que Soros estava a financiar vários grupos a participar na campanha “Freedom from Facebook” (uma campanha criada em 2018 para criticar o comportamento da rede social). “[A Definers] preparou então documentos para distribuir à imprensa e mostrar que isto não era um movimento popular independente.”

Zuckerberg diz que não sabia

Tanto Mark Zuckerberg como a directora de operações do Facebook, Sheryl Sandberg – que são ambos judeus –, alegam que não tinham conhecimento concreto do caso. Numa conferência por telefone com a imprensa internacional, Zuckerberg disse que só soube da história depois de ler a peça do New York Times. Sandberg admite que “não se lembrava de uma empresa chamada Definers” quando leu a notícia do jornal, mas diz que, quando foi confirmar a situação, encontrou um pequeno número de emails onde a equipa era mencionada.

O desconhecimento dos líderes não os impede de ser criticados pelo comportamento do Facebook. “Tem sido uma desilusão ver-vos a falhar em monitorizar o ódio e a desinformação na plataforma do Facebook. Descobrir que têm um papel activo em promover estas distorções é chocante”, criticou Patrick Gaspard, presidente da Open Society Foundation, a organização de direitos humanos financiada por George Soros.

O número de teorias da conspiração a mencionar Soros tem aumentado no último ano, em parte devido às acusações do presidente norte-americano Donald Trump, feitas no Twitter, de que os seus críticos são actores pagos pelo filantropo. “Olhem, todos os actores fizeram cartazes iguais. Pagos pelo Soros e por outros”, escreveu em Outubro.

Nas redes sociais, surgem também criticas que comparam o trabalho do Facebook contra Soros a campanhas anti-semitas.

É algo que Sandberg nega. “A ideia de que o nosso trabalho foi interpretado como anti-semita é repugnante – e profundamente pessoal”, escreveu sobre o trabalho da Definers. “Nunca foi a intenção de ninguém entrar numa narrativa anti-semita contra o senhor Soros ou qualquer outra pessoa. Ser judia é uma parte central de quem eu sou e a nossa empresa é firmemente contra a difusão do ódio.”

Apesar de admitir a colaboração com a Definers e o trabalho feito sobre Soros, o Facebook não pediu desculpas pelo método. “Seria irresponsável e pouco profissional de nós não querer perceber o passado e a história dos potenciais conflitos de interesse dos nossos críticos”, lê-se no comunicado da empresa.

Além da controvérsia com a Definers, a investigação do New York Times revela que o Facebook recebeu indícios de que existia interferência russa nas eleições americanas a ocorrer na rede social em 2016, e que a empresa contratou novos profissionais de comunicação depois do escândalo com a Cambridge Analytica.