O populismo pode ser bom ou mau?

Em Portugal, temos a nossa realidade alternativa: uma espécie de populismo bom (existe?).

O Presidente da República tão depressa tira selfies com o povo em romarias populares, eventos desportivos ou no final do seu mergulho matinal, como se senta à mesa de trabalho com líderes europeus e mundiais. Numa semana esteve com dois homólogos, da Rússia e dos EUA: Vladimir Putin e Donald Trump – ambos frequentemente descritos como políticos populistas e até inimigos da democracia.

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O Presidente da República tão depressa tira selfies com o povo em romarias populares, eventos desportivos ou no final do seu mergulho matinal, como se senta à mesa de trabalho com líderes europeus e mundiais. Numa semana esteve com dois homólogos, da Rússia e dos EUA: Vladimir Putin e Donald Trump – ambos frequentemente descritos como políticos populistas e até inimigos da democracia.

O politólogo João Tiago Gaspar escreveu em Março do ano passado que “os agentes populistas consideram que a sociedade está dividida em dois grupos homogéneos e antagónicos: a ‘elite corrupta’ e o ‘povo puro’”. Os bons e os maus. “Os líderes populistas assumem diferentes estilos. Mas todos projectam uma imagem cuidadosamente elaborada da vox populi”, acrescentou o cientista político que colabora com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, numa outra forma de dizer que estão perto do povo.

Esta proximidade com as pessoas reais, uma expressão que faz parte da narrativa populista, nota-se nos temas mais difíceis, mas também agremiadores: terrorismo, imigração, desemprego. Tudo o que pode preocupar o comum dos mortais.

Por causa disso (ou apesar disso), a avaliação que se faz dos populismos não é positiva. Teme-se o seu avanço pela Europa, quase tanto como o fim dos partidos tradicionais, subitamente passados para segundo plano por personagens que gostam de dizer que não nasceram na política e não vivem para ela.

A actual “era do populismo” é uma espécie de apocalipse. Mas como sempre, em Portugal, temos a nossa realidade alternativa: uma espécie de populismo bom (existirá?). Um chefe de Estado que é, sem dúvida, o político mais popular do momento, que passou anos a fio e entrar pela casa dos portugueses através da televisão antes de se transformar no Presidente dos afectos e que lê, melhor do que ninguém, a mente dos eleitores.

Marcelo é popular, mais do que populista, é certo, mas não receia pegar nos temas que desagradam aos políticos e que agradam ao povo, como se escolhesse apoiar um lado no conflito ou na polémica: foi assim nos incêndios e em Tancos (faz agora um ano), por exemplo. Não foi assim em inúmeros outros temas, como o dos professores ou os aumentos na função pública.

A verdade é que Marcelo Rebelo de Sousa escolhe quase sempre um lado e faz política. Não renega que nasceu nos partidos, mas passa o Natal nas zonas ardidas. Tão depressa frequenta os salões do Kremlin ou da Casa Branca como serve comida a sem-abrigo. É popular? É. E pode ser populista. A clarividência que muitas vezes demonstra distingue-o dos líderes populistas, a omnipresença aproxima-o. Já dizia o politólogo holandês Cas Mudde que o populismo, por si só, não é bom nem mau para o sistema democrático. Não é a embalagem, é o conteúdo. E nunca se sabe o que pode vir lá de dentro.

Se os populistas fossem todos iguais, a conversa que ontem passou nas televisões em directo, entre Donald Trump e Marcelo Rebelo de Sousa, provavelmente não teria acontecido da mesma maneira. Não teriam falado sobre imigrantes da forma que o Presidente português falou com o americano que ainda há dias estava a separar pais e crianças na fronteira. Mas falariam de clichés, como também aconteceu, quando Trump perguntou se Cristiano Ronaldo poderia candidatar-se contra ele. “Portugal não é os Estados Unidos", respondeu Marcelo, entre o desassombrado e o desafiador. 

Nota: Aproveito o espaço de hoje para lamentar um texto falhado que aqui escrevi há duas semanas. Falhado porque se preciso de o explicar agora – e provaram-me que sim – é porque a versão original não resultou. A tese defendida era a de que os emigrantes podem funcionar, no futuro, como uma nova "geringonça" para António Costa.

Ao escrever que os cadernos eleitorais relativos à emigração subiriam de 300 mil para 1,3 milhões de eleitores, não referi que o número de deputados a eleger serão os mesmos: quatro (o que fica muito aquém dos 36 que têm PCP, PEV e BE juntos, obviamente). O que eu queria dizer não era que os emigrantes vão eleger 36 deputados que podem ser a nova "geringonça", mas sim que com o PS a descer nas sondagens, mas ainda à beira da maioria absoluta (115+1), quatro deputados podem fazer a diferença.