Tribunal de Contas está a recusar vistos a hospitais até para comprar fármacos

Em causa está a lei dos compromissos que obriga a que existam fundos disponíveis quando os contratos são assumidos. Vários vistos têm sido recusados, incluindo para a compra de medicamentos. Administradores hospitalares pedem reunião urgente com ministérios da Saúde e Finanças.

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Paulo Pimenta

O Tribunal de Contas está a recusar vistos para compras de bens e serviços, incluindo medicamentos, aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) por causa da falta de fundos disponíveis. Situação – a par da redução do horário de trabalho para as 35 horas e da aplicação do estatuto do gestor público – que levou a Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APH) a pedir reuniões urgentes aos ministérios das Finanças e da Saúde e aos presidentes dos grupos parlamentares.

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O Tribunal de Contas está a recusar vistos para compras de bens e serviços, incluindo medicamentos, aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) por causa da falta de fundos disponíveis. Situação – a par da redução do horário de trabalho para as 35 horas e da aplicação do estatuto do gestor público – que levou a Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APH) a pedir reuniões urgentes aos ministérios das Finanças e da Saúde e aos presidentes dos grupos parlamentares.

No ofício enviado na segunda-feira, a que o PÚBLICO teve acesso, a associação lembra que o Orçamento do Estado prevê que o SNS apresente um défice de 252 milhões de euros, o que “invalida que a esmagadora maioria dos hospitais cumpra a lei dos compromissos e pagamentos em atraso”. Esta lei dita que os hospitais só podem fazer aquisições se tiverem fundos disponíveis e é essa falta de fundos que tem levado o Tribunal de Contas (TdC) a recusar vários vistos.

Todas as aquisições superiores a 350 mil euros são obrigatoriamente remetidas para fiscalização prévia do TdC. “Recentemente, este tribunal tem vindo a recusar visto, inclusive a aquisição de medicamentos, tendo como fundamento que nenhum compromisso pode ser assumido sem que existam fundos disponíveis, sob pena de nulidade”, exigindo que “se demonstre inequivocamente” a existência de saldo positivo no momento em que foram assumidos os compromissos.

Questionado sobre esta situação, o presidente da APAH diz ser a primeira vez que há um chumbo à compra de medicamentos, que no caso seriam para o tratamento do VIH. Mas garante que não estão a faltar medicamentos aos doentes. “Os hospitais para manter a distribuição de medicamentos aos doentes estão a assumir ajustes directos com carácter de urgência. Conseguem comprá-los a um preço mais caro e os conselhos de administração arriscam-se a serem sujeitos a penas pesadas por parte do Tribunal de Contas, porque no limite não estão a cumprir a lei”, diz.

Alexandre Lourenço explica que até aqui o Tribunal de Contas tinha um entendimento alargado para o cumprimento da lei permitindo as aquisições desde que o mapa da Direcção-Geral do Orçamento apresentasse fundos disponíveis. “O novo colectivo de juízes tem um entendimento mais estrito da lei. O que se temia em relação à lei dos compromissos é o que está a suceder agora: estão a aplicar efectivamente a lei.”

“Temos estas duas combinações, que é o subfinanciamento do sector assumido logo em Orçamento do Estado que impede que grande parte das instituições cumpra a lei dos compromissos, e este entendimento actual do Tribunal de Contas que na prática vai causar uma grande paralisia nos hospitais. Qualquer matéria superior a 350 mil euros vai estar paralisada ou vai demorar mais tempo e isto vai encarecer as aquisições de bens e serviços e vai ter também consequências na qualidade da prestação”, acrescenta, dando o exemplo de obras, reparações ou aquisição de equipamentos.

Alexandre Lourenço refere que não têm informação por parte das Finanças, mas sabe que o Ministério da Saúde está a par da situação dos hospitais e estará a tentar encontrar uma solução de natureza jurídica. O PÚBLICO questionou os dois ministérios sobre se iriam reunir com a APAH e que medidas podem ser implementadas para resolver os vários problemas comunicados pelos gestores, mas não obteve resposta em tempo útil.

Impacto das 35 horas

Há ainda mais duas questões que a associação afirma serem “prementes”. Uma delas é a passagem dos profissionais com contrato individual de trabalho para as 35 horas semanais, o que irá já acontecer a 1 de Julho. “Os hospitais ainda não recuperaram em termos efectivos a perda de recursos que tiveram no início da legislatura com a passagem para as 35 horas”, refere Alexandre Lourenço, salientando que não estão contra a mudança de horário. “O que deve ser permitido é que sejam contratados os profissionais associados a esta redução e que haja um faseamento da implementação da medida.” Se isso não acontecer, os hospitais poderão ver-se obrigados a cancelar actividades programadas e a encerrar serviços.

O PÚBLICO sabe que a Administração Central do Sistema de Saúde enviou na terça-feira uma circular aos hospitais a pedir que indicassem, até ao final desse mesmo dia, os impactos estimados com a redução do horário de trabalho, em especial no que diz respeito a cirurgias e exames de diagnóstico.

Preocupante, acrescenta Alexandre Lourenço, é também a não aplicação do estatuto do gestor. “Pela legislação, todos os conselhos de administração deviam ter assinado um contrato de gestão em que existisse uma avaliação permanente anual por uma comissão de avaliação independente. Se esse requisito não for cumprido até 90 dias depois do acto de nomeação existe nulidade da nomeação. O que quer dizer que muitos conselhos de administração podem estar a praticar actos administrativos nulos”, diz.