A Orquestra Juvenil Gustav Mahler num concerto empolgante

Os concertos de Lisboa foram dirigidos por Vladimir Jurowski, maestro com uma carreira internacional em plena ascensão, e contaram com a participação da violinista Lisa Batiashvili (no sábado) e com os pianistas Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich (no domingo).

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Vladimir Jurowski Roman Gontcharov

O regresso à Gulbenkian da Gustav Mahler Jugendorchester (Orquestra Juvenil Gustav Mahler) constituiu mais uma vez um acontecimento de relevo, quer pela escolha das obras em programa quer pelo alto nível artístico destes jovens músicos oriundos de 20 países europeus, entre os quais Portugal, representado por 12 instrumentistas.

Justamente considerada uma das melhores orquestras juvenis do mundo, esta formação criada por Claudio Abbado em 1987 é composta anualmente por mais de uma centena de músicos seleccionados entre mais de 2000 candidatos. Apesar de a sua constituição variar e de as distintas personalidades dos maestros e solistas de topo com os quais colabora imprimirem fortes marcas na interpretação, pode dizer-se que existe uma identidade própria deste agrupamento, caracterizada pela forma como combina o rigor e a profundidade do trabalho musical com um entusiasmo contagiante que se transmite ao público como uma corrente eléctrica.

Os concertos de Lisboa foram dirigidos por Vladimir Jurowski, maestro com uma carreira internacional em plena ascensão, e contaram com a participação da violinista Lisa Batiashvili (no sábado) e com os pianistas Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich (no domingo). A estes dois últimos coube a interpretação do Concerto para dois Pianos, Percussão e Orquestra Sz. 115, de Bartók, no âmbito de um programa que incluía na segunda parte a Sinfonia n.º 8, op. 65, de Chostakovich. Concebida como Sonata para Dois Pianos e Percussão (1937), esta composição foi depois retrabalhada em forma de concerto por sugestão do editor Ralph Hawkes e estreada em 1940. Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich (que se tinham apresentado no último Festival Internacional de Música de Espinho e têm grandes créditos firmados na música dos séculos XX e XXI) gravaram a versão concerto sob a batuta de Pierre Boulez para a Deutsche Grammophon em 2009, afirmando-se como os intérpretes de referência da obra.

Combinando a tradição virtuosística do concerto romântico com os novos rumos do modernismo musical e tirando partido das potencialidades percussivas dos pianos em diálogo com instrumentos de percussão, a partitura de Bartók inclui também secções de inspirado lirismo e misteriosas sonoridades como a melodia inicial no registo grave do piano e a “música nocturna” do 2.º andamento. A criação da atmosfera etérea deste andamento, bem típico de Bartók, requeria um pouco mais de subtileza nas dinâmicas e na plasticidade de efeitos tímbricos, mas tal não chegou a ensombrar uma leitura empolgante desta obra repleta de desafios técnicos ao nível da coordenação rítmica e dinâmica e na qual a destreza e o brilhantismo dos pianistas encontrou parceiros à altura nos jovens percussionistas solistas e no desempenho da orquestra sob a liderança de Jurowski.

A beleza da sonoridade dos diferentes naipes da Gustav Mahler Jugendorchester, o exigente jogo de equilíbrios e tensões entre secções contrastantes e entre os diferentes planos sonoros, a gestão de uma ampla paleta dinâmica (que oscilou entre delicados pianíssimos e explosões sonoras exuberantes), bem como a qualidade individual de vários instrumentistas ilustrada pela profusão de solos da partitura de Chostakovich, estiveram em evidência na segunda parte, preenchida com a Sinfonia n.º 8 do compositor soviético. Escrita em 1943, é uma composição menos conhecida do que a sua antecessora (Sinfonia n.º 7, Leninengrado, obra emblemática da propaganda soviética), apesar de a superar como criação artística. Elementos peculiares da linguagem, estilo e personalidade musical de Chostakovich (dramatismo trágico, intenso colorido instrumental, ousadas dissonâncias, marchas e fanfarras impetuosas, ironia e sarcasmo, lirismo introspectivo) combinam-se numa arquitectura grandiosa que Jurowsky e os talentosos instrumentistas da orquestra souberam edificar de forma admirável.

 

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O regresso à Gulbenkian da Gustav Mahler Jugendorchester (Orquestra Juvenil Gustav Mahler) constituiu mais uma vez um acontecimento de relevo, quer pela escolha das obras em programa quer pelo alto nível artístico destes jovens músicos oriundos de 20 países europeus, entre os quais Portugal, representado por 12 instrumentistas.

Justamente considerada uma das melhores orquestras juvenis do mundo, esta formação criada por Claudio Abbado em 1987 é composta anualmente por mais de uma centena de músicos seleccionados entre mais de 2000 candidatos. Apesar de a sua constituição variar e de as distintas personalidades dos maestros e solistas de topo com os quais colabora imprimirem fortes marcas na interpretação, pode dizer-se que existe uma identidade própria deste agrupamento, caracterizada pela forma como combina o rigor e a profundidade do trabalho musical com um entusiasmo contagiante que se transmite ao público como uma corrente eléctrica.

Os concertos de Lisboa foram dirigidos por Vladimir Jurowski, maestro com uma carreira internacional em plena ascensão, e contaram com a participação da violinista Lisa Batiashvili (no sábado) e com os pianistas Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich (no domingo). A estes dois últimos coube a interpretação do Concerto para dois Pianos, Percussão e Orquestra Sz. 115, de Bartók, no âmbito de um programa que incluía na segunda parte a Sinfonia n.º 8, op. 65, de Chostakovich. Concebida como Sonata para Dois Pianos e Percussão (1937), esta composição foi depois retrabalhada em forma de concerto por sugestão do editor Ralph Hawkes e estreada em 1940. Pierre-Laurent Aimard e Tamara Stefanovich (que se tinham apresentado no último Festival Internacional de Música de Espinho e têm grandes créditos firmados na música dos séculos XX e XXI) gravaram a versão concerto sob a batuta de Pierre Boulez para a Deutsche Grammophon em 2009, afirmando-se como os intérpretes de referência da obra.

Combinando a tradição virtuosística do concerto romântico com os novos rumos do modernismo musical e tirando partido das potencialidades percussivas dos pianos em diálogo com instrumentos de percussão, a partitura de Bartók inclui também secções de inspirado lirismo e misteriosas sonoridades como a melodia inicial no registo grave do piano e a “música nocturna” do 2.º andamento. A criação da atmosfera etérea deste andamento, bem típico de Bartók, requeria um pouco mais de subtileza nas dinâmicas e na plasticidade de efeitos tímbricos, mas tal não chegou a ensombrar uma leitura empolgante desta obra repleta de desafios técnicos ao nível da coordenação rítmica e dinâmica e na qual a destreza e o brilhantismo dos pianistas encontrou parceiros à altura nos jovens percussionistas solistas e no desempenho da orquestra sob a liderança de Jurowski.

A beleza da sonoridade dos diferentes naipes da Gustav Mahler Jugendorchester, o exigente jogo de equilíbrios e tensões entre secções contrastantes e entre os diferentes planos sonoros, a gestão de uma ampla paleta dinâmica (que oscilou entre delicados pianíssimos e explosões sonoras exuberantes), bem como a qualidade individual de vários instrumentistas ilustrada pela profusão de solos da partitura de Chostakovich, estiveram em evidência na segunda parte, preenchida com a Sinfonia n.º 8 do compositor soviético. Escrita em 1943, é uma composição menos conhecida do que a sua antecessora (Sinfonia n.º 7, Leninengrado, obra emblemática da propaganda soviética), apesar de a superar como criação artística. Elementos peculiares da linguagem, estilo e personalidade musical de Chostakovich (dramatismo trágico, intenso colorido instrumental, ousadas dissonâncias, marchas e fanfarras impetuosas, ironia e sarcasmo, lirismo introspectivo) combinam-se numa arquitectura grandiosa que Jurowsky e os talentosos instrumentistas da orquestra souberam edificar de forma admirável.