Argentina enterra o último Presidente da sua brutal ditadura militar

Cinco vezes condenado por crimes contra a humanidade, Reynaldo Bignone cumpria uma pena de prisão perpétua. Morreu aos 90 anos.

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Reynaldo Bignone (à direita) foi julgado pelos crimes cometidos durante a ditadura militar MARCOS BRINDICCI / Reuters/

O último ditador argentino morreu na quarta-feira, aos 90 anos, no Hospital Militar Central de Buenos Aires. Presidente entre 1982 e 1983, os últimos dois anos da ditadura militar, Reynaldo Bignone cumpria uma pena prisão perpétua por crimes contra a humanidade. Condenado em cinco ocasiões, o ex-general era o derradeiro representante de um dos períodos mais negros da História argentina – dele resultaram cerca de 30 mil mortos ou desaparecidos, que suprimiram quase uma geração inteira.

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O último ditador argentino morreu na quarta-feira, aos 90 anos, no Hospital Militar Central de Buenos Aires. Presidente entre 1982 e 1983, os últimos dois anos da ditadura militar, Reynaldo Bignone cumpria uma pena prisão perpétua por crimes contra a humanidade. Condenado em cinco ocasiões, o ex-general era o derradeiro representante de um dos períodos mais negros da História argentina – dele resultaram cerca de 30 mil mortos ou desaparecidos, que suprimiram quase uma geração inteira.

Bignone foi o quarto e último Presidente da ditadura militar, iniciada com Rafael Videla em 1976, e teve um papel crucial na implementação do “terrorismo de Estado” ou da “guerra suja”, as denominações mais conhecidas da campanha repressiva contra a oposição argentina, postas em prática através de assassínios, torturas, desaparecimentos forçados ou retirada de crianças e recém-nascidos às famílias opositoras, que depois era entregues a apoiantes do regime.

O general comandou, logo em 1976, a instalação de um centro de detenção e tortura no Hospital Posadas, na capital argentina, por onde passaram centenas de opositores políticos. Foi mais tarde transferido para a liderança de uma outra prisão do regime, em Campo de Mayo, nos arredores de Buenos Aires, onde foram cometidos crimes semelhantes.

A fracassada campanha militar nas Ilhas Malvinas, contra o Reino Unido, deixou o regime muito debilitado e, em Julho de 1982, Bignone foi o escolhido para substituir o homem que levou a Argentina para a guerra, Leopoldo Galtieri.

A braços com uma crise institucional, social e económica, o novo Presidente tomou cedo consciência de que o prazo de validade da ditadura estava próximo e fez de tudo para conseguir uma saída limpa. A começar pela convocação de eleições, que permitissem uma transição suave para a democracia, e a acabar numa tentativa de se proteger legalmente de qualquer condenação judicial. 

Pouco antes de entregar o poder a Raúl Afonsín, o vencedor das eleições de 1983, Bignone aprovou dois decretos: um para autorizar a destruição de praticamente toda a documentação relativa a assassínios, torturas e detenções levadas a cabo nos oito anos anteriores, acompanhado por um documento que negava a existência de desaparecidos; e outro para garantir amnistia para si e para os seus camaradas, em nome da “pacificação nacional”.

O esquema não resultou. Em 1984 o Congresso argentino revogou o segundo decreto, permitindo o julgamento e condenação dos principais rostos do regime. Bignone e outros militares ainda foram indultados pelo Presidente Carlos Menem, em 1990, mas os julgamentos foram retomados durante a presidência de Néstor Kirchner (2003-2007).

Reynaldo Bignone argumentou em tribunal que todos os crimes que cometeu – ou que autorizou – tiveram como fim “lutar contra o terrorismo” e negou repetidamente que aqueles pudessem ser “minimamente comparados ao conceito internacional de genocídio”. Ainda assim, foi condenado por crimes contra a humanidade em cinco ocasiões, entre 2010 e 2013.

Com a sua morte, a Argentina enterra uma das personagens políticas mais tenebrosas da sua História, cuja passagem pelo poder deixou marcas profundas e duradouras na sua população e sociedade.