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Podemos ser pelintras ou estarmos podres, mas não têm outra alternativa senão deixar-nos entrar no único país que é incontestavelmente nosso.

Cheguei a Lisboa doente e exausto sem vontade de fazer nada, dizer nada, nem sequer amaldiçoar a ostra que me ia cortando o pio.

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Cheguei a Lisboa doente e exausto sem vontade de fazer nada, dizer nada, nem sequer amaldiçoar a ostra que me ia cortando o pio.

Quando cheguei à imigração, empurrei o meu cartão de cidadão para a agente. Ela fez que sim com a cabeça e achei graça: tínhamos chegado a Portugal, ao único país que é obrigado a aceitar-nos.

Podemos ser pelintras ou estarmos podres, mas não têm outra alternativa senão deixar-nos entrar no único país que é incontestavelmente nosso.

“São obrigados a aceitar-nos, não é?”, disse eu, pedindo desculpa por me estar a aproveitar desse direito. E ela respondeu com afectuosa ironia: “O sistema não é perfeito...”

No Reino Unido receberam-nos com rapidez e simpatia, dir-se-ia com a consciência pesada por causa do “Brexit”. “Já estão a praticar como é que nos vão dizer que já não somos tão bem-vindos como antes?” “Ah”, disse a agente, “não vai notar diferença.”

O que nos pode valer é o facto de não haver “enough Portuguese to go around”. Estamos tão na moda que não vão chegar portugueses para as encomendas. Os turistas já se queixam da falta de portugueses quando chegam cá. Só somos dez milhões. Cada um de nós é um espécime raríssimo. Temos de ser compreensivos quando nos param na rua e pedem-nos para falar um bocadinho de português para os miúdos poderem dizer na escola que falaram com um português verdadeiro.

“Não percebi uma única palavra. O que é que estava a dizer?” “Estava a dizer: não estás a perceber nada do que eu digo, pois não?” “Ah, ah — funny guy. Very good.”