Os riscos do exercício físico

Não existe um fármaco cujos benefícios sejam comparáveis ao simples ato de nos exercitarmos regularmente. Contudo, tal como um medicamento apresenta efeitos secundários e interações, o exercício físico tem também alguns riscos, que se discutem neste artigo. Poderá ficar surpreendido...?

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Todos conhecemos casos de atletas vítimas de morte súbita, destacando-se em Portugal o caso do jogador de futebol Miklos Fehér. Contudo, a ampla divulgação destes casos raros pode ter um efeito negativo na motivação e na simplificação das recomendações para a prática de exercício se o balanço entre os riscos e benefícios não for bem informado. Para ajudar a esclarecer, vamos analisar os dois tipos de riscos mais frequentemente citados: cardiovasculares e músculoesqueléticos.

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Todos conhecemos casos de atletas vítimas de morte súbita, destacando-se em Portugal o caso do jogador de futebol Miklos Fehér. Contudo, a ampla divulgação destes casos raros pode ter um efeito negativo na motivação e na simplificação das recomendações para a prática de exercício se o balanço entre os riscos e benefícios não for bem informado. Para ajudar a esclarecer, vamos analisar os dois tipos de riscos mais frequentemente citados: cardiovasculares e músculoesqueléticos.

O exercício físico de intensidade vigorosa aumenta transitoriamente o risco de um evento cardiovascular, entre 2 a 54 vezes, de acordo com os estudos realizados. As atividades com maior risco são as que envolvem intensidade vigorosa, desporto de competição e ambientes frios. Além disso, o risco é inversamente proporcional ao nível de atividade física habitual e encontra-se aumentado nos indivíduos com doenças cardíacas, metabólicas (como a diabetes e a obesidade) e renais. Este conhecimento levou ao desenvolvimento de um algoritmo de avaliação de risco pré-exercício por parte do American College of Sports Medicine, de forma a tornar a prática de exercício mais segura (ver infografia). Esta avaliação pode ser realizada facilmente pelo médico de família ou pelo fisiologista do exercício num ginásio ou programa de exercício comunitário.

Para ajudar a colocar o risco do exercício em perspetiva, consideremos um estudo retrospetivo americano que comparou o número de mortes durante várias maratonas com o número de mortes prevenidas em acidentes de viação pelo mero encerramento das ruas para as mesmas maratonas. Esta simples análise determinou um número de 26 mortes por 14 milhões de horas de exposição de corredores; e a prevenção de 46 mortes em acidentes de viação. Esta comparação dá uma ideia, em termos práticos, do quão rara é a morte súbita associada ao exercício e quão baixo é o seu risco comparativamente a outras atividades do dia-a-dia. Além de reduzidos, os riscos são ainda minimizáveis se forem evitadas transições abruptas de inatividade física para atividade vigorosa; do cumprimento de períodos de “aquecimento” e “arrefecimento”; do conhecimento de sinais de alarme; do uso de escalas subjetivas de esforço ou cardiofrequencímetros; e se for evitado o exercício em situações extremas de temperatura.

É ainda fundamental salientar que a própria inatividade física é um dos principais fatores de risco para a morbilidade e mortalidade global. De facto, um individuo que faça atividade física de intensidade vigorosa durante 1 hora apresenta o dobro do risco de síndrome coronário agudo durante essa mesma hora mas uma diminuição para metade desse risco nas restantes 23 horas! Existe também evidência de que o exercício é uma terapêutica eficaz em 26 doenças crónicas que abrangem um largo espectro de condições psiquiátricas, metabólicas, cardiovasculares, pulmonares, musculoesqueléticas e neoplásicas.

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Embora desprovidas do mesmo sensacionalismo, as preocupações de natureza osteoarticular – por exemplo, o risco de osteoartrose –  são comuns na população. É verdade que as lesões articulares, como as entorses, que levam a lesões ligamentares e consequente instabilidade e lesões condrais, meniscais e fraturas podem acelerar o processo degenerativo. Contudo, a prática de atividade física regular não degenera as articulações na esmagadora maioria dos casos. Bem pelo contrário, existe hoje evidência sólida de que o exercício tem um importante papel anti-inflamatório sistémico e que o fortalecimento muscular é protetor das articulações sendo até recomendado para pessoas com osteoartrose estabelecida. Encontra-se ainda associado a uma melhoria acentuada da dor e da qualidade de vida nestas pessoas.

A probabilidade de entorses e outras lesões de natureza traumática ligeira está naturalmente aumentada com a prática de certos desportos e atividades, sobretudo as que envolvem corrida e/ou a passagem por terrenos irregulares. No entanto, existem atualmente protocolos para prevenir a sua ocorrência e também uma rede de profissionais especializados, como médicos e fisioterapeutas, que podem, na maioria dos casos, contribuir para uma rápida e completa recuperação no caso de uma lesão. De qualquer forma, estas são situações com uma evolução maioritariamente benigna e sem repercussões significativas a longo prazo.

Estar vivo, agir e interagir com o meio-ambiente envolve um constante equilíbrio entre riscos e vantagens. Na verdade, não existem atividades de risco zero, nem mesmo passar muito tempo sentado! Pelo contrário, parece claro que os riscos de uma vida sedentária são de magnitude muito superior aos de iniciar e manter a prática de atividade física. Assim, cabe a cada um escolher... aquela que gosta mais!

Miguel Reis e Silva, médico de Medicina Física e de Reabilitação
Pedro Teixeira, professor da Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa

Os autores seguem o Acordo Ortográfico

A rubrica Atividade Física é da responsabilidade do Programa Nacional de Promoção da Atividade Física da Direcção-?Geral de Saúde e enconta-se publicada no P2, caderno de Domingo do PÚBLICO