Dois miúdos e uma carripana

Em dias “sim”, Gondry pode ser um realizador com alguma coisa de singular: Micróbio e Gasolina.

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“Actualização”, em chave realista, de alguns clássicos do escapismo adolescente: Micróbio e Gasolina

De vez em quando Michel Gondry consegue domar a sua tendência para a feérie e deixar na gaveta a reputação de “mago dos efeitos visuais” granjeada durante o tempo em que foi, essencialmente, um realizador de telediscos. Micróbio e Gasolina, e por relação com os últimos filmes dele que por cá vimos, tem muito mais a ver com A Malta e Eu (a história realista de um grupo de adolescentes na viagem de autocarro de regresso da escola, no subúrbio de uma grande cidade americana) do que com A Espuma dos Dias (uma infeliz adaptação de Boris Vian, cheia de “magia” e poluição visual delicodoce).

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De vez em quando Michel Gondry consegue domar a sua tendência para a feérie e deixar na gaveta a reputação de “mago dos efeitos visuais” granjeada durante o tempo em que foi, essencialmente, um realizador de telediscos. Micróbio e Gasolina, e por relação com os últimos filmes dele que por cá vimos, tem muito mais a ver com A Malta e Eu (a história realista de um grupo de adolescentes na viagem de autocarro de regresso da escola, no subúrbio de uma grande cidade americana) do que com A Espuma dos Dias (uma infeliz adaptação de Boris Vian, cheia de “magia” e poluição visual delicodoce).

Micróbio e Gasolina recupera o universo adolescente (agora em França), seguindo as aventuras, muito road movie, de dois garotos (Micróbio e Gasolina são as alcunhas deles), e com uma modéstia cuja principal virtude é a sobriedade equilibra os pólos entre os quais (desde O Despertar da Mente, talvez o seu filme mais high profile) tem girado o cinema de Gondry, a dobra entre a realidade e a evasão para mundos imaginários.

Na estranha carripana com que os miúdos se fazem às estradas francesas fica-se perto de uma “actualização”, em chave realista, de alguns clássicos do escapismo adolescente (pensamos em coisas como Se a Minha Cama Voasse), sem exclusão do pensamento mágico — mas aplicado com parcimónia, de forma a maximizar o seu efeito (como acontece especialmente na sequência do avião).

Em todo o caso, o retrato que Gondry faz das suas personagens é mais interessante pelo que fica de fora. Não há, ou quase não há, nem telemóveis nem écrans de computador, o acesso ao “virtual” faz-se a partir de coisas mais rugosas e mais objectivas: os desenhos e rabiscos com que Micróbio preenche os seus cadernos, as engenhocas motorizadas de Gasolina, a música (o grupo de “punks”), o futebol, mesmo a irrupção de uma espécie de exotismo circense (vê-se até um camelo, espécie pouco comum nas ruas francesas).

Esta manifestação do imaginário através dum realismo corriqueiro ressalta como o aspecto mais curioso de um filme que, sem chegar verdadeiramente a entusiasmar, reforça a ideia de que, em dias “sim”, Gondry pode ser um realizador com alguma coisa de singular.

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