Oposição acusa Maduro de ter feito um “golpe de Estado “na Venezuela

Supremo destitui Parlamento, mas deputados consideram decisão inconstitucional. Apela-se a que a população saia à rua. E a que as Forças Armadas "sejam o primeiro garante da democracia e se tornem parte da solução”.

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Julio Borges, em frente ao parlamento esta quinta-feira Carlos Garcia Rawlins/Reuters

A Venezuela acordou esta quinta-feira sem órgão legislativo. Na quarta-feira à noite (madrugada em Portugal), o Supremo Tribunal, controlado pelo Governo socialista bolivariano chefiado por Nicolás Maduro, anunciou a destituição da Assembleia Nacional e assumiu as funções desta. Para a oposição, que detém a maioria dos deputados, trata-se de “um golpe de Estado”.

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A Venezuela acordou esta quinta-feira sem órgão legislativo. Na quarta-feira à noite (madrugada em Portugal), o Supremo Tribunal, controlado pelo Governo socialista bolivariano chefiado por Nicolás Maduro, anunciou a destituição da Assembleia Nacional e assumiu as funções desta. Para a oposição, que detém a maioria dos deputados, trata-se de “um golpe de Estado”.

“Maduro deu um golpe de Estado. Esta sentença [do Supremo] dá-lhe competências para fazer o que lhe der na gana”, acusou o presidente do parlamento, Julio Borges, citado pelo jornal venezuelano El Universal. “Este é o ponto de não retorno no caminho da ditadura”, disse o vice-presidente, Freddy Guevara.

Num discurso feito na escadaria do Parlamento, Borges pediu aos militares para agirem: "Não podemos deixar de fazer uma chamada às Forças Armadas. Não podem continuar em silêncio, não podem ficar caladas perante a ruptura constitucional. Pedimos que sejam o primeiro garante da democracia e que se tornem parte da solução".

A sentença do Supremo a destituir o Parlamento justifica a decisão. O documento diz que a Assembleia Nacional está em constante “incumprimento”, ao não acatar decisões do Supremo Tribunal e do Governo, e diz assumir o papel legislativo para garantir o “Estado de Direito”.

O braço de ferro entre o Governo e o Parlamento começou em 2016, depois de a oposição se ter unido e conseguido a maioria dos deputados, depois de 16 anos de domínio absoluto do “chavismo” (o socialismo bolivariano aplicado pelo anterior Presidente, Hugo Chávez, que morreu em 2013). O Supremo declarou o Parlamento "em desrespeito" e o Governo deixou de reconhecer as suas decisões, adensando um conflito aberto logo em Janeiro de 2016, quando o Supremo quis impedir a tomada de posse de três deputados da oposição, eleitos pela Amazónia,  com o argumento de que tinha havido fraude eleitoral. Os três deputados dão a maioria absoluta à oposição, que foi a votos unida na plataforma Mesa de Unidade Democrática.

Mês após mês, o Supremo foi anulando as iniciativas legislativas do Parlamento, que responsabiliza o Governo (e Maduro) pela grave crise económica e social em que o país está mergulhado — há falta de tudo, de farinha a medicamentos, a indústria está parada por não haver matéria-prima. A Venezuela, um dos países com maiores reservas de petróleo, perdeu poder de compra com a brusca baixa do preço do crude.

Porém, o Supremo ficara sempre a um passo de declarar a Assembleia Nacional destituída — o passo que deu agora.

“Avisamos que, enquanto a situação de desrespeito na Assembleia Nacional se mantiver, a câmara constitucional garanterá que as funções [legislativas] serão exercidas  por si ou por outro órgão designado”, diz a sentença número 156 do Supremo. Um “golpe de Estado” feito pelo Estado, respondeu Julio Borges, do Partido Primeiro Justiça, que é o maior dentro da coligação da MUD.

E agora?

Freddy Guevara, do Partido Vontade Popular — cujo líder, Leopoldo López, foi condenado a 19 anos de prisão em 2015 por ter promovido uma manifestação em que morreram 43 pessoas, após confrontos com as forças governamentais —, pediu à população para voltar a sair à rua e “manifestar-se em resistência democrática”, defendendo o país e as suas instituições.

Quanto ao funcionamento da Assembleia Nacional, Borges disse que este vai continuar a trabalhar: “O Parlamento não reconhece a sentença porque toda a decisão judicial que seja contra a Constituição é nula”, cita o El Universal. No início da semana, e depois de a oposição ter aprovado uma declaração em defesa da aplicação da Carta Democrática Interamericana, o Supremo declarou que a votação desrespeitava a independência do país e suspendeu a imunidade dos deputados, o que significa que pode levar a que os 90 representantes dos partidos da oposição possam ser acusados de traição. 

A partir da Colômbia, onde se encontrava para pedir ajuda alimentar e medicamentos, Henrique Capriles — que faz dia 12 quatro anos perdeu as presidenciais para Maduro — disse que os deputados devem defender o seu mandato e “a vigência da Constituição”. “Com esta sentença vergonhosa o Tribunal ignora a decisão de milhões de venezuelanos”, disse este dirigente do Partido Primeiro Justiça e governador do estado de Miranda.

O deputado da oposição Henry Ramos Allup (da Acção Democrática), frisou que “o melhor que os deputados têm a fazer é continuar a ir à Assembleia fazer o seu trabalho”. Apelou à intervenção internacional.

Ainda na segunda-feira a Organização de Estados Americanos (OEA) reuniu para discutir o estado de paralisia política e a crise na Venezuela, tendo pedido a Nicolás Maduro para respeitar os princípios democráticos. Os países optaram por não suspender o país da organização, mas por pouco: dos 34 membros, 20 votaram contra Maduro, o que significa que o Presidente venezuelano já não tem o apoio incondicional dos 18 membros da Aliança Bolivariana que até agora bloqueou as iniciativas contra Maduro da OEA.