CGD: Há um "antagonismo que tem tornado muito difícil a gestão da comissão"

José Matos Correia, 53 anos, é vice-presidente do PSD e deputado. Nessas qualidades, preside ao conselho estratégico do partido e a comissão parlamentar de inquérito à Caixa Geral de Depósitos, a mais tensa dos últimos anos.

i-video

José Matos Correia, escolhido para presidir à comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD e à gestão do banco deixa um apelo aos deputados para que se deixem de acrimónias de forma de ainda permitirem que os trabalhos da comissão atinjam os seus objectivos de apuramento da verdade. No PSD, diz que está tudo bem. E recomenda-se. "Espero que o dr. Pedro Passos Coelho seja líder do PSD durante muitos anos", assume.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

José Matos Correia, escolhido para presidir à comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD e à gestão do banco deixa um apelo aos deputados para que se deixem de acrimónias de forma de ainda permitirem que os trabalhos da comissão atinjam os seus objectivos de apuramento da verdade. No PSD, diz que está tudo bem. E recomenda-se. "Espero que o dr. Pedro Passos Coelho seja líder do PSD durante muitos anos", assume.

É presidente da Comissão de Inquérito à gestão da CGD...
A comissão chama-se comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD e à gestão do banco.

As pessoas habituaram-se, tendo em conta o historial das comissões de inquérito, a elogiar as que têm a ver com questões bancárias. Foi assim com o BES e com o BPN. Porque é que não está a ser assim com a CGD?
Deixa-me numa posição difícil porque enquanto dirigente partidário tenho as posições que devo ter, mas enquanto presidente da comissão parlamentar de inquérito (CPI) tenho a obrigação de absoluta isenção e independência na condução dos trabalhos. Não lhe vou esconder que tenho uma elevada preocupação com a percepção pública do trabalho da CPI, por um lado, mas também dos seus resultados. Tem sido muito visível uma significativa oposição ou antagonismo entre os grupos parlamentares que requereram a comissão, visto que ela foi criada por imposição do PSD e do CSD, e que essa oposição ou antagonismo tem tornado muito difícil, até para mim enquanto presidente, a gestão da CPI. Estamos num momento também delicado por força da atitude das entidades a quem requeremos documentação. Julgo que conseguimos fazer uma coisa importante que foi obter ganho de causa no Tribunal da Relação de Lisboa por duas vezes. O acesso a documentação, salvo excepções, foi autorizado. É um momento importante porque tem de ficar claro que as comissões poderes equiparados às autoridades judiciárias e o Parlamento tem de ter condições para fazer o escrutínio neste caso até de entidades públicas.

Nesse sentido, este acórdão ajuda?
Claramente. É a primeira vez que um tribunal diz de forma tão clara, por duas vezes e com juízes diferentes, que o interesse público no conhecimento da verdade se sobrepõe ao segredo bancário e a segredo de supervisão. Está aberto o caminho para se poder prestigiar o Parlamento e para se poder ter acesso a documentação que é importante para a realização do nosso objecto e para se ficar a saber a verdade do que se passou na CGD, porque é que se chegou a um nível de imparidades tão elevado.

As conclusões desta comissão podem vir a ser prejudiciais para o caminho que a CGD tem de fazer?
Não me passaria pela cabeça  que o que quer que fosse que o Parlamento fizesse nesta matéria fosse para prejudicar a CGD. O que não podemos é negar aos deputados, e através deles aos portugueses, o direito que têm de saber porque é que o banco público chegou a apresentar os resultados que apresentou e que são preocupantes porque significam que são os portugueses que vão ter de pagar essas imparidades, esses resultados negativos que foram atingidos.

Mas houve dúvidas, porque os partidos não se entenderam quanto a isso.
Há pouco ia falar nisso e depois divergi para outros argumentos. Estava a manifestar a minha preocupação pela forma como os trabalhos da CPI, nalgumas circunstâncias, têm decorrido. Não me compete a mim dizer que o partido A ou o B tem mais razão, mas vínhamos assistindo, nas outras comissões de inquérito, aos grupos parlamentares a remar um pouco para o mesmo lado, como aconteceu no caso do BES, e aqui tem havido desde o início quase uma acrimónia grande relativamente a vários assuntos. Este estado de espírito, essa tal oposição grande entre a maioria parlamentar e os partidos requerentes, está, de alguma forma, a menorizar o papel da comissão parlamentar ou a pô-lo em causa aos olhos dos portugueses.

Ainda há tempo para contrariar essa tendência?
Nas minhas funções de presidente da CPI tenho tentado de alguma forma ajudar a criar condições que permitam o normal funcionamento da comissão. Espero que a partir de agora ainda seja possível, sobretudo à medida que os documentos chegarem, valorizar o trabalho da CPI.

É também vice-presidente do PSD, acha mudança de estratégia do partido abanou as estruturas da geringonça?
Não houve, que eu saiba, nenhuma mudança estratégica do PSD. Suponho que se esteja a referir a algumas questões recentes, nomeadamente o que se passou com a TSU. O PSD tem, nessa matéria, uma posição, clara. Quando éramos governo entendemos que no momento em que se actualizava o Salário Mínimo Nacional (SMN), ao fim de alguns anos em que isso não aconteceu, se justificava uma medida absolutamente extraordinária de compensação das entidades patronais por força do aumento dos encargos que ocorreriam. E num segundo momento entendemos que o Governo estava no início de funções e que deveríamos, entre aspas, dar o benefício da dúvida. Mas não podemos aceitar que uma medida que é necessariamente extraordinária se torne regra, desde logo porque ela é, se continuada no tempo, um prémio à manutenção de salários baixos.

Esta nova estratégia tem também a ver com o novoPassos Coelho mais aguerrido. Não concorda?
Não vejo, no líder do PSD, nenhuma alteração significativa. O que porventura terá acontecido é que certos sectores político-partidários acharam que poderiam domesticar o PSD. Isso não existe. 

Se o PSD fosse governo, não teria havido este aumento?
Teria havido um aumento do SMN nas condições que tinham sido acordadas em concertação social, que implicavam a avaliação de um conjunto de variáveis que levariam seguramente, aliás, essas contas foram feitas, ao aumento do SMN, mas não àquele aumento.

Neste contexto, como é que PS e PSD vão chegar a um acordo em matéria de descentralização?
Nós já anunciámos as nossas propostas em matéria de descentralização. Aqui, como noutros domínios, a nossa posição é sempre responsável. Temos as nossas propostas, estamos disponíveis para analisar as dos outros, o que não estamos é disponíveis para aceitar propostas em qualquer domínio que não sejam adequadas àquilo que são as nossas convicções. Vale a pena discutir a sério reformas que são estruturantes e que são necessárias para que o país funcione. Sobre a descentralização, já o dissemos, estamos disponíveis para conversar com todas as forças políticas a começar pelo PS e pelo Governo e isso em nada afecta a nossa postura. 

Com aquilo que se prevê que aí venha - PPP e precários - acha que esta solução de Governo tem condições para levar até ao fim esta legislatura?
Foi prometido solenemente ao Presidente da República e ao país que havia entendimentos adequados e suficientes para que o país fosse governado por esta maioria que foi gerada no Parlamento. Se esta maioria funciona ou não é um problema da maioria. Ao PSD a única coisa que podem pedir é que seja coerente. E o PSD será sempre coerente com as suas atitudes. Olharemos sempre para as coisas de acordo com a interpretação que fazemos do interesse nacional e decidiremos em função disso.