Morreu o poeta Marcos Ana, o homem que passou mais tempo na cadeia de Franco

O espanhol esteve detido nas cadeias do franquismo espanhol 23 anos, desenvolvendo aí a sua obra poética.

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José Saramago: "Marcos Ana não parecia satisfeito quando se via ao espelho" Ana Banha/PÚBLICO

O poeta e activista espanhol Marcos Ana, o preso político que mais tempo permaneceu nas cadeias do franquismo espanhol, morreu esta quinta-feira em Madrid. Foi entre os 19 e os 41 anos, durante 23 anos, que Fernando Macarro Castillo, mais conhecido por Marcos Ana, esteve detido, tendo sido na cadeia que desenvolveu parte da sua obra poética. Morreu aos 96 anos.

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O poeta e activista espanhol Marcos Ana, o preso político que mais tempo permaneceu nas cadeias do franquismo espanhol, morreu esta quinta-feira em Madrid. Foi entre os 19 e os 41 anos, durante 23 anos, que Fernando Macarro Castillo, mais conhecido por Marcos Ana, esteve detido, tendo sido na cadeia que desenvolveu parte da sua obra poética. Morreu aos 96 anos.

"Marcos Ana não parecia satisfeito quando se via ao espelho. Ele partiu-o em pedaços de modo a ver em cada pedaço os rostos de seus companheiros", escreveu José Saramago sobre o poeta espanhol. Entrou na prisão acusado de ter assassinado três pessoas, crimes pelos quais já haviam sido fuzilados outros suspeitos, e foi libertado, segundo o próprio, “por causa de um decreto que obrigava a soltar os presos que estavam há mais de 20 anos na prisão. Eu era o único”, disse, citado pelo "El Mundo".

Foi durante a permanência na prisão de Burgos, em 1954, que escreveu os primeiros poemas, que assinou com o pseudónimo Marcos Ana, que viria a manter até à sua morte. Tinha então 33 anos. Quando recuperou a liberdade, em Novembro de 1961, exilou-se em França e empreendeu uma campanha internacional contra a repressão política em Espanha e no mundo e tornou-se num firme defensor dos direitos humanos e da democracia.

O activismo levou-o a viajar pelo mundo, em especial pela Europa e América, onde conheceu Pablo Neruda ou Salvador Allande, dois dos seus grandes amigos. Em França fundou o Centro de Informação e Solidariedade com Espanha, presidido pelo pintor Pablo Picasso. Desde 1973, em conjunto com o artista espanhol e outros intelectuais, participou activamente em actos de solidariedade com o Chile, na altura submetido à ditadura de Pinochet. Três anos depois viria a regressar a Espanha.

Entre as suas obras destacam-se Autobiografia, Mi mundo es un pátio e Te llamo desde un muro, escritas na prisão, mas talvez o seu livro mais conhecido seja Decime Cómo es un Árbol, de 2007, uma emotiva memória da prisão, do exílio e da luta pela liberdade na qual transformou a sua vida, com prefácio de José Saramago, onde a escrita ganhava contornos de autobiografia.

Na altura, o poeta, comunista tolerante e moderado, como se definia, assumiu que não tinha o direito de “ocultar a sua vida”, porque havia sido a “vida de muitos, a geração dos vencidos.” Na sua última obra, Vale la pena luchar, do ano passado, incentivava os mais jovens a lutar por um mundo mais justo, no contexto do activismo do 15M. “Na rua está a força”, dizia.