Lá de cima é que se vê bem

Depois do sucesso das "visões gerais" de Daily Overview, Benjamin Grant aventura-se em livro (Overview: A New Perspective of Earth). São mais de duzentas imagens construídas com fotografias tiradas a partir de satélite que dão novas panorâmicas da superfície terrestre.

Fotogaleria

Faz parte da natureza humana procurar constantemente novas perspectivas, diferentes abordagens do que nos rodeia. Quando nos foi permitido ver o globo terrestre do espaço nasceu não apenas uma ponto de vista radicalmente diferente do que até aí tínhamos experimentado, mas também uma alteração filosófica sobre a nossa representação e sobre a nossa posição no cosmos (ainda que de forma infimamente parcial). Não é por acaso que a fotografia do globo terrestre (e um bocado da Lua) que o astronauta William Anders tirou na véspera do dia de Natal de 1968 é considerada uma das mais icónicas de sempre. Porque, de certa forma, foi ela que inaugurou "um olhar distanciado" do lugar onde estamos, com tudo o que cognitivamente essa percepção pode originar. E originou muito, das artes à astrofísica, das ciências do espaço às ciências sociais e humanas. Logo no ano a seguir (quando o Homem pisou a Lua) David Bowie cantava em Space Oddity:

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Faz parte da natureza humana procurar constantemente novas perspectivas, diferentes abordagens do que nos rodeia. Quando nos foi permitido ver o globo terrestre do espaço nasceu não apenas uma ponto de vista radicalmente diferente do que até aí tínhamos experimentado, mas também uma alteração filosófica sobre a nossa representação e sobre a nossa posição no cosmos (ainda que de forma infimamente parcial). Não é por acaso que a fotografia do globo terrestre (e um bocado da Lua) que o astronauta William Anders tirou na véspera do dia de Natal de 1968 é considerada uma das mais icónicas de sempre. Porque, de certa forma, foi ela que inaugurou "um olhar distanciado" do lugar onde estamos, com tudo o que cognitivamente essa percepção pode originar. E originou muito, das artes à astrofísica, das ciências do espaço às ciências sociais e humanas. Logo no ano a seguir (quando o Homem pisou a Lua) David Bowie cantava em Space Oddity:

(...)

I'm stepping through the door

And I'm floating in a most peculiar way

And the stars look very different today

For here

Am I sitting in a tin can

Far above the world

Planet Earth is blue

And there's nothing I can do

(...)

Daí até hoje, o que aconteceu visualmente foi uma espécie de zoom in à superfície que habitamos, uma aproximação lenta, que foi sendo feita à medida das possibilidades técnicas, das modas e das políticas (de segurança e outras).

The partial view '~/Views/Layouts/Amp2020/IMAGEM_368_245.cshtml' was not found. The following locations were searched: ~/Views/Layouts/Amp2020/IMAGEM_368_245.cshtml
IMAGEM_368_245

Inspirado nesse momento fundador da visualidade e no "efeito de visão geral" experimentado por Bill Anders no dia 24 de Dezembro de 1968 (que lhe deu a visão da Terra como "um todo"), o norte-americano Benjamin Grant (um consultor de estratégia de marca de Nova Iorque) começou a publicar nas redes sociais imagens tiradas a partir de satélites que nos dão panorâmicas muito peculiares (e cativantes) da superfície terrestre.

Depois do enorme sucesso do projecto Daily Overview nos ecrãs, Grant decidiu aventurar-se no suporte livro ("Overview: A New Perspective of Earth", já disponível em alguns países, como o Reino Unido e Alemanha). "Da nossa linha de visão a partir da superfície na Terra, é impossível apreciar em pleno a beleza e a confusão das coisas que já construímos, a complexidade dos sistemas que já desenvolvemos ou o impacto devastador que já tivemos no nosso planeta", afirma Grant no texto introdutório. Para este consultor, a divulgação e a contemplação destas "visões gerais" que mostram como a Terra foi sendo moldada "são necessárias para avançar na compreensão sobre o que somos como espécie” e para “conseguirmos um planeta mais seguro e sustentável".

Com uma nítida mensagem ecológica, as imagens do livro focam-se “nos lugares e nos momentos em que a actividade humana – para o melhor e para o pior – moldou a paisagem. “Cada ‘visão geral’ começa com um pensamento. Escolhemos lugares onde o Homem deixou a sua marca no planeta e depois fazemos a investigação necessária para identificar o território (e as coordenadas geográficas correspondentes) e para transmitir melhor essa ideia de alteração.”

Grant, que conseguiu uma autorização da empresa DigitalGoble para usar as imagens captadas pelos seus satélites (cujo principal cliente é o Governo dos EUA), tem esperança de que o “nivelamento hipnotizante”, o “conforto surpreendente da organização sistemática a uma escala gigante” ou as “cores vibrantes” das fotografias nos deslumbrem. E que, uma vez captada a nossa atenção, “possamos ir para além da estética, contemplando o que estamos a ver exactamente” de maneira a colocar em causa o que é que estas imagens significam para o planeta.

Foto
O Central Park, em Nova Iorque, EUA, espalha-se por 341 hectares, o que representa 6% da área total da ilha de Manhattan. Uma das inovações do parque consiste na separação da circulação de pessoas, bicicletas, cavalos e carros Imagens (c) 2016 by DigitalGlobe, Inc.

Estas imagens de efeito “visão geral” não sendo novas (hoje temos drones a fazê-las por todo lado e antes deles já tínhamos a Apple Maps ou o Google Earth, que também usam os serviços da DigitalGlobe) têm um distanciamento e uma correcção de cor que as tornam mais apelativas e, de certo modo, “viciantes” (dão-nos a ilusão de um poder controlador e de uma visão privilegiada).

No livro, Grant revela como tudo começou com “um acidente”, quando estava “a brincar” na Net com um programa de mapeamento com o intuito de se preparar para um encontro de um clube que discute questões relacionadas com o espaço. Para esse encontro, a conversa incidiria sobre a forma como os satélites têm um efeito na nossa vida quotidiana. Quando escreveu a palavra “earth” no motor de pesquisa para conseguir fazer um zoom out, que desse uma visão geral da Terra, o que lhe surgiu no ecrã foi a localidade de Earth, no Texas. “Quando carreguei no enter, o que aconteceu foi o contrário do que estava à espera, [o programa] fez um zoom in”. Grant diz ter ficado “estupefacto” com o que viu. E o que viu - para além de um pionés de cabeça vermelha com um balão a dizer “Earth, TX” - foi “uma miscelânea impressionante de círculos verdes e castanhos”. “Salvei a imagem e mostrei-a aos meus amigos; também ficaram espantados.” O que Grant viu nesse dia, a partir de uma perspectiva muito particular, foi uma miríade de campos com sistemas de irrigação de pivot, que ficaram com um padrão circular criado pelos borrifadores usados em culturas de água.

The partial view '~/Views/Layouts/Amp2020/IMAGEM_1140_760.cshtml' was not found. The following locations were searched: ~/Views/Layouts/Amp2020/IMAGEM_1140_760.cshtml
IMAGEM_1140_760

O consultor, a quem muitos já chamam artista, confessa que foi esta “visão” que o ajudou a perceber que são necessárias “mudanças dramáticas na maneira como vemos o planeta”, antes de “compreendermos verdadeiramente a extensão do impacto que nele temos”. “Para mim, mudou tudo depois de ver aqueles círculos de colheita.” Uns dias depois dessa “epifania”, criou nas redes sociais o Daily Overview, onde desde então publica novas “visões gerais” cada dia.

O livro contém mais de 200 imagens, cada uma concebida através da colagem de várias fotografias de satélite. A fonte é a biblioteca de imagens da DigitalGlobe, a empresa que guarda as fotografias de mais alta qualidade do género e que, ao longo dos últimos 15 anos, tem sido enriquecida com sequências de imagens que permitem fazer exercícios do tipo antes e depois.

Foto
Praia de Ipanema, zona Sul do Rio de Janeiro, Brasil. Reconhecida como uma das praias mais bonitas do mundo, o areal é dividido em segmentos por torres de vigia, conhecidas por "postos" Imagens (c) 2016 by DigitalGlobe, Inc.

Para além do poder do efeito “visão geral”, Grant confia no poder das palavras e das legendas aprofundadas sobre cada um dos locais para que a fruição das imagens não seja “apenas” lúdica. E deixa o desejo de que o livro possa “despertar a mesma curiosidade acerca do planeta” que nele desperta a cada parcela da Terra vista de cima que, diariamente, nos dá a ver.

Nota: Todas as imagens reproduzidas com a autorização de Overview, Benjamin Grant, copyright (c) 2016, publicado por Amphoto Books, uma divisão da Penguin Random House, Inc.