Proibição de notícias sobre relação entre Sócrates e jornalista será reavaliada

Relação de Lisboa revoga decisão impugnada por Fernanda Câncio, que pediu que vários media fossem proibidos de noticiarem factos relativos ao seu relacionamento pessoal com o ex-primeiro-ministro.

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Estão em causa elementos, como escutas telefónicas, que integram o processo Operação Marquês Foto: Manuel Roberto

O Tribunal da Relação de Lisboa anulou há dias a decisão da juíza Tânia Carrusca que, em Dezembro passado, indeferiu uma acção intentada pela jornalista Fernanda Câncio, a pedir que vários órgãos de comunicação social, como o Correio da Manhã e o semanário Sol, fossem proibidos de noticiar factos relativos ao relacionamento pessoal da repórter com o ex-primeiro-ministro José Sócrates.

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O Tribunal da Relação de Lisboa anulou há dias a decisão da juíza Tânia Carrusca que, em Dezembro passado, indeferiu uma acção intentada pela jornalista Fernanda Câncio, a pedir que vários órgãos de comunicação social, como o Correio da Manhã e o semanário Sol, fossem proibidos de noticiar factos relativos ao relacionamento pessoal da repórter com o ex-primeiro-ministro José Sócrates.

A jornalista intentara uma acção para tutela da personalidade por entender que o seu direito à imagem e à intimidade da vida privada tinham sido violados com a divulgação de elementos, sem relevância criminal, que constavam do processo Operação Marquês, onde Sócrates é arguido. Fernanda Câncio pedia, por isso, que alguns media fossem impedidos de revelar conversas privadas mantidas entre ela e Sócrates e que foram alvo de escutas, assim como cartas, e-mails e mensagens de telemóvel trocadas com o antigo primeiro-ministro. Pedia ainda que por cada infracção, o Sol, o Correio da Manhã, a Sábado, a Flash e a CMTV fossem condenados a pagar uma sanção pecuniária compulsória de pelo menos 200 mil euros.

A juíza Tânia Carrusca, da Instância Local Cível da Comarca de Lisboa, decidiu, após uma primeira sessão de julgamento e sem nada que o fizesse prever, julgar o caso “liminarmente improcedente”, considerando que o tipo de acção utilizado pela jornalista não era o adequado para o que Câncio pretendia. Esta decisão aconteceu sem que o advogado da jornalista se pronunciasse a esse propósito.

Num acórdão datado de 21 de Abril, três juízes da Relação de Lisboa anulam a decisão da juíza da primeira instância, não por causa do conteúdo do seu despacho, mas pela forma como a decisão foi tomada de “surpresa”, sem respeito pelos princípios do contraditório e da cooperação.

Os juízes desembargadores recordam que a colega deu oportunidade ao advogado de Fernanda Câncio para se pronunciar acerca do erro na forma do processo, mas no despacho da primeira sessão de julgamento — a única que se realizou — a audiência foi suspensa para continuar noutro dia. “Significa que a autora [Fernanda Câncio] tinha a expectativa de, após a produção de prova, tomar posição quanto à nulidade invocada. Aliás, tal como expressa no seu requerimento”, consideram os juízes. E completam: “Porém, o que sucedeu é que a srª. juíza dá sem efeito a designação da audiência e profere o despacho impugnado”.

A Relação de Lisboa defende, por isso, que a jornalista tinha uma expectativa “legítima e em total consonância com a tramitação processual” de que iria ser ouvida mais tarde quanto a este aspecto. “O que seria mais curial, face ao princípio da cooperação e do contraditório, era ter sido proferido despacho a dar sem efeito a designação da data para continuação da audiência de julgamento e notificar a autora de que deveria pronunciar sobre as questões enunciadas. E após, seria, então, proferido despacho sobre a nulidade”, lê-se no acórdão.

Com a decisão da Relação, o caso volta para as mãos da juíza Tânia Carrusca, que terá que ouvir Fernanda Câncio sobre a "nulidade/erro na forma do processo". Só depois poderá proferir a decisão final do caso, podendo manter-se ou alterar-se o sentido do despacho de Dezembro passado. 

Contactada pelo PÚBLICO, Fernanda Câncio afirma que desde que a decisão da juíza Tânia Carrusca foi tomada “tudo aquilo que invocara como fundamento para a acção sucedeu: os meus direitos foram redobradamente violados; conversas privadas foram publicadas, não apenas só em texto mas também em áudio; as imputações caluniosas continuaram e agravaram-se”. E acrescenta: “Chegou-se mesmo ao ponto de, em Dezembro, o Correio da Manhã pedir a minha constituição como arguida. Fê-lo com base naquilo que foi publicando e republicando e que, na contestação da minha acção, afiançara não implicar qualquer suspeita sobre mim.”

“Ou seja, os acontecimentos demonstraram que a minha acção antecipava correctamente o que ia suceder e que o perigo que procurava evitar era real”, sustenta a jornalista, que realça que mesmo que desta vez o tribunal decida a seu favor não evitará grande parte dos danos.