“Todos têm a possibilidade de ter uma fortuna como a minha”

O fundador da Geox diz que não conhece mais nenhuma solução para desenvolver a economia na Europa sem ser através da inovação e do registo da propriedade intelectual.

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Mario Moretti Polegato diz que “as patentes ainda são um tabu para muitas pessoas” DR

A Geox, com origem na Itália, é hoje um gigante internacional, cotada em bolsa, com 30 mil trabalhadores e 1200 lojas, 20 em Portugal em regime de franchising (terá 23 em 2016). Numa conversa com o PÚBLICO, à margem da entrega do Prémio do Inventor Europeu, em Paris, o empresário defendeu que um negócio nasce e cresce quando se combina uma ideia, uma patente e uma relação de colaboração com as universidades.

PÚBLICO: É gestor e dono de uma empresa mas já recebeu o prémio de inventor europeu. Foi importante?
Mario Moretti: Sim. E este ano fiz parte do júri. Apoio o Instituto Europeu de Patentes todos os anos porque quero dar o meu contributo para relançar a propriedade industrial na Europa. Há um problema com a economia em toda a Europa e as empresas locais têm dificuldade em sobreviver. Do meu ponto de vista, a solução é inovar mas é preciso explicar às pessoas o que é a inovação. São muitos os políticos que repetem “é preciso inovar”, mas não explicam o que isso significa.

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A Geox, com origem na Itália, é hoje um gigante internacional, cotada em bolsa, com 30 mil trabalhadores e 1200 lojas, 20 em Portugal em regime de franchising (terá 23 em 2016). Numa conversa com o PÚBLICO, à margem da entrega do Prémio do Inventor Europeu, em Paris, o empresário defendeu que um negócio nasce e cresce quando se combina uma ideia, uma patente e uma relação de colaboração com as universidades.

PÚBLICO: É gestor e dono de uma empresa mas já recebeu o prémio de inventor europeu. Foi importante?
Mario Moretti: Sim. E este ano fiz parte do júri. Apoio o Instituto Europeu de Patentes todos os anos porque quero dar o meu contributo para relançar a propriedade industrial na Europa. Há um problema com a economia em toda a Europa e as empresas locais têm dificuldade em sobreviver. Do meu ponto de vista, a solução é inovar mas é preciso explicar às pessoas o que é a inovação. São muitos os políticos que repetem “é preciso inovar”, mas não explicam o que isso significa.

E o que significa?
Defino a inovação em três aspectos. O primeiro é a criação, o nascimento da ideia. A minha foi criar sapatos que respiram, por exemplo. O segundo é o registo da patente. Quando criamos algo precisamos de o proteger, caso contrário qualquer pessoa nos pode copiar. Na Europa, muitas das pequenas e médias empresas não conhecem exactamente a lei das patentes, acreditam que não há necessidade e que estão a salvo de cópias. Antes de vendermos sapatos na China, por exemplo, garantimos que tínhamos protecção e agora temos uma rede de lojas e não somos copiados. É ainda preciso espaço para experimentar e testar a ideia. Os pequenos empreendedores por vezes não são engenheiros ou químicos. E se vão directamente para o mercado acabam por destruir a ideia. Em todos os países, incluindo Portugal, temos a oportunidade de trabalhar com universidades locais. Se combinarmos a ideia, a patente e colaboração com as universidades, criamos uma nova empresa. Pode valer zero euros no início, mas depois vale mil milhões de euros, como aconteceu com a Geox. Esta é a minha visão. Mas é preciso difundir esta fórmula. A começar pelas escolas. É preciso explicar o que significa inovação.

Não há uma ideia generalizada de que é necessário proteger as invenções?
A verdade é que as patentes ainda são um tabu para muitas pessoas. Pessoalmente, não conheço mais nenhuma solução para desenvolver a economia na Europa sem ser a inovação.

No seu caso, inventou uma tecnologia específica. Mas isso não basta. É preciso continuar a desenvolvê-la.
Sim, mas isso sucedeu muito mais tarde. Quando temos uma ideia, a dada altura temos de decidir se a queremos vender a alguém que a explore ou se queremos ser nós a desenvolvê-la. Hoje há muitas empresas à procura de inovar, mas não estão interessadas nas ideias em si. Ou seja, geralmente as pessoas que inventam não são empreendedoras. Voltando à sua questão: quando introduzimos este conceito de três aspectos da inovação no negócio é preciso investir todos os dias. Na Geox, 2% das nossas receitas são aplicadas em investigação e desenvolvimento e o nosso laboratório investigamos todos os dias o movimento humano. Inventámos agora um casaco respirável, sapatos completamente impermeáveis, entre outros. Trabalhamos constantemente com universidades para estudar a anatomia humana. Há um melhoramento constante da patente inicial.

Isso é determinante para manter a Geox no mercado?
Absolutamente. No início, tentei vender a minha ideia a uma grande empresa de calçado mas ninguém acreditou. Decidi então seguir sozinho, com uma equipa de cinco pessoas, cada uma com uma responsabilidade diferente. Agora em todo o mundo há 30 mil trabalhadores e 1200 lojas em todo o mundo e 65% da população do mundo reconhece a marca.

De que forma a crise afectou o negócio?
Quando se tem um único tipo produto não é fácil. Olhámos para fora da Europa, mas a verdade é que oferecemos um produto de qualidade e apostámos no design, aliado à tecnologia. Estamos muito bem em Portugal. Na verdade, aumentámos as vendas e é um dos países onde estamos a vender bem, como em Itália, onde as receitas aumentaram 10%.

Qual foi o aumento?
Não divulgamos esses dados, mas o consumo está mais racional. Os consumidores estão dispostos a gastar mais dinheiro num produto de grande qualidade e que dure.

O que pensa da indústria do calçado em Portugal? Já atingiu um nível de qualidade que lhe permite fazer a diferença no mercado internacional?
Produzimos a nossa marca Diadora (de calçado para desporto) numa unidade perto do Porto que está muito bem desenvolvida em termos de produção e é eficiente. Isso faz a diferença. Produz cerca de 30 mil pares de sapatos por ano.

Em Portugal houve um aumento no registo de patentes num contexto de crise. Nestas alturas há mais propensão para a criatividade?
Sem dúvida. Quando estive em Lisboa, encontrei muitos jovens talentos. O problema é que não têm muita noção do que é a propriedade intelectual e alguns decidem ir para os Estados Unidos, por exemplo. Perdemo-los. E a verdade é que todos têm a possibilidade de ter uma fortuna como a minha, basta usar a cabeça.

A jornalista viajou a convite do Instituto Europeu de Patentes e do European Journalism Centre